Uma forma de impor limites para equilibrar trabalho e vida familiar

Durante uma viagem na qual sobrevoávamos o Atlântico, meses atrás, fomos surpreendidos por uma violenta tempestade. Embora já tivéssemos passado por algumas experiências semelhantes anteriormente, aquela foi a pior. Permanecemos calmos e serenos, sentados lado a lado naquela sombria tormenta. De mãos dadas, individualmente oramos a Deus.

Naqueles momentos, enquanto o avião mergulhava e sacudia, e nosso futuro parecia incerto, nossos pensamentos não foram direcionados às responsabilidades do nosso trabalho. Em vez disso, conforme admitimos posteriormente, confessamos um ao outro o que verdadeiramente pesava em nossa mente: nosso relacionamento com Deus, nosso relacionamento mútuo e a salvação de nossos filhos.

Lições de uma viagem

Invariavelmente, nossa vida no ministério pode, às vezes, parecer-se com uma tempestade violenta. A intensidade do próprio trabalho adicionada às altas cobranças por expectativas irreais, dos membros da igreja e até mesmo dos líderes, nem sempre contribuem para que a viagem seja tranquila. Em vez disso, o pastor pode ser levado rapidamente ao esgotamento e a viver sob pesado fardo de culpa, frustração e desilusão.

Essas emoções não apenas são uma realidade para o pastor, mas têm efeito sobre a esposa e os filhos. Não raro, muito das mesmas expectativas colocadas sobre o pastor também afeta a família dele. Por exemplo, normalmente, as esposas são solicitadas a assumir responsabilidades pastorais. Espera-se que os filhos sejam modelos de perfeição e que demonstrem maturidade espiritual além do que é apropriado à idade deles.

De fato, o ministério pastoral tem alegrias e desafios, altos e baixos. Embora os altos do ministério sejam muitos – levar pessoas a Jesus, transmitir esperanças a pessoas desesperadas – os baixos podem ser realmente muito baixos. Podendo levar alguém a ficar estressado diante dos limites de tempo e recursos, e sem conseguir os resultados esperados na igreja e na família.

Em meados dos anos 1980, Paul Tsongas, senador norte-americano pelo estado de Massachusetts, descobriu que tinha câncer. Inicialmente, ele decidiu levar adiante sua campanha de reeleição ao cargo. Naquela ocasião, um amigo, Arnold Zack, escreveu para ele o seguinte: “Nenhuma pessoa no leito de morte dirá: ‘Eu gostaria de ter gasto mais tempo com meus negócios.’” Tsongas renunciou à campanha e investiu mais tempo com sua família durante aquele difícil período.1

Não estamos sugerindo que os pastores renunciem ao ministério. Ao contrário disso, sugerimos que eles desenvolvam uma visão nova e priorizem as coisas importantes, administrando seu tempo e buscando equilíbrio em sua vida espiritual, pessoal e vocacional. “Coisa alguma pode desculpar o pastor de negligenciar o círculo interior, pelo mais amplo círculo externo. O bem-estar espiritual de sua família, vem em primeiro lugar.”2

Limites necessários

Em uma entrevista publicada no Leadership Journal, Bill Hybels, pastor da Willow Creek Community Church, falou sobre as chaves da mais simples e mais efetiva liderança. Ele mencionou a necessidade que têm os pastores e líderes de entender a noção de “negligência estratégica”.3 Essa ideia realça a necessidade de limites saudáveis no ministério. Todo pastor necessita focalizar, simplificar e priorizar.

Tendo em mente esse compromisso, ele deve perguntar a si mesmo: “Quem eu desejo ser, com o passar do tempo? Que tipo de esposo? Que tipo de pai? Que tipo de pastor, amigo e líder?” Então, deve fazer a seguinte pergunta: “O que necessita ser feito em minha agenda, de modo que eu me torne esse tipo de pessoa?” Essencialmente, os pastores devem decidir estrategicamente que coisas deverão ser suprimidas de sua agenda, a fim de que tenham êxito espiritual, pessoal, na vida familiar e vocacional.

Recente pesquisa sobre estresse na família pastoral, realizada na Divisão Norte-Americana, mostrou que um percentual significativo de pastores relataram ter dificuldade com a prática da oração particular, lutas para manter ligação pessoal com Deus e problemas em estabelecer tempo para devoção pessoal. Como pessoas envolvidas no ministério, o que bem sabemos é que, sem oração e estudo da Bíblia, é impossível manter um relacionamento viável com Deus, necessário para todo ministério efetivo. Sem essa conexão diária, perdemos de vista a essência do chamado, passando a atuar como meros profissionais.

Diante disso, o que deve o pastor estrategicamente negligenciar, para que possa desenvolver mais fortemente as disciplinas espirituais? Deve estabelecer tempo específico para responder e-mails? Gastar menos tempo com mídias sociais? Menos tempo vendo televisão? Dormir cedo para acordar cedo? Você é a única pessoa que pode determinar o que fazer nesse sentido, a fim de que possa dedicar tempo necessário à oração e ao estudo da Bíblia, hábitos que o habilitarão a ser um líder espiritual efetivo.

Na Palavra

Em Esdras 7:10, está escrito: “Porque Esdras tinha disposto o coração para buscar a lei do Senhor, e para a cumprir, e para ensinar em Israel os seus estatutos e os seus juízos.” Note o compromisso feito por Esdras com o estudo das Escrituras, viver as Escrituras e ensiná-las. Estudar a Palavra de Deus é pré-requisito para conhecê-Lo. Muitos eruditos estudam e ensinam a Bíblia, sem que isso faça qualquer diferença na vida deles. Não foi assim com Esdras. Ele colocou o coração nessa prática. Estudou, observou e ensinou as Escrituras.

Sem dúvida, a negligência estratégica foi eficaz na vida daquele fiel escriba; caso contrário, ele não seria capaz de estudar, viver e ensinar a Palavra de Deus. Como pastores, devemos aprender e operacionalizar em nossa vida o modelo estabelecido por Esdras, para que sejamos líderes efetivos do rebanho do Senhor. Esse tempo investido em devoção pessoal e estudo da Palavra de Deus não é tempo dedicado à preparação de sermões. É tempo no qual nutrimos e alimentamos nossa vida espiritual, ligando-nos à Videira.

Em Atos 1:8, Jesus aconselhou Seus discípulos com estas palavras: “Mas recebereis poder, e sereis Minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judeia e Samaria e até aos confins da Terra.” Pouco mais adiante, lemos: “Todos esses perseveravam unânimes em oração” (v. 14).

O Espírito Santo nos habilitará quando investirmos tempo em oração, pedindo clareza de mente e propósito para efetivamente representar Jesus diante do mundo. O poder do Espírito virá sobre nós com a força do Pentecostes, quando priorizarmos o tempo de comunhão com Deus por meio da oração. Sem esse foco e prioridade, nossa vida fluirá de maneira completamente desordenada. Ellen G. White aconselhou: “Consagrem-se a Deus pela manhã; façam disto sua primeira tarefa.”4 É imperioso que estrategicamente incluamos em nossa agenda diária tempo para oração e estudo da Bíblia, pois à medida que negligenciarmos essas atividades, enfrentaremos barreiras entre nós e Jesus.

Na pesquisa anteriormente mencionada, muitos pastores se queixaram de não ter suficientes horas semanais para administrar todas as suas responsabilidades e ainda dispor de tempo livre para a família. Assim sendo, os pastores devem negligenciar estrategicamente muitas coisas boas no ministério, mas que são periféricas à sua missão principal, de modo que possam ter tempo para estar com a família e nutri-la.

Se aceitarmos todos os convites que recebemos anualmente para falar ou escrever, podemos prejudicar os principais objetivos de nossas responsabilidades ministeriais. Embora sejamos frequentemente tentados a trabalhar durante as férias, devemos propositadamente rejeitar certas tarefas e funções, a fim de que desfrutemos o descanso necessário, com o propósito de que estejamos suficientemente saudáveis física, emocional e espiritualmente para continuar nosso trabalho.

Os sete compromissos do casamento feliz

1. Ouvir o cônjuge sem ser defensivo.

2. Partilhar sentimentos com o cônjuge, sem culpá-lo(a) por esses sentimentos.

3. Dar ao cônjuge o benefício da dúvida e não precipitar conclusões.

4. Reconhecer minha contribuição para nossas eventuais divergências.

5. Pedir perdão ao cônjuge quando disser alguma coisa que o(a) magoe.

6. Perdoar o cônjuge mesmo que ele(a) não tenha pedido perdão.

7. Fazer todo o possível a fim de partilhar bondade, paciência, compreensão
e perdão.

Trabalho em equipe

Há pouco mais de um ano, nós comemoramos trinta anos de casamento. Para marcar a ocasião, criar lembranças e manter viável nossa união, gastamos cinco dias na praia. Muito nos alegramos durante aquele período, desfrutando a beleza do mar azul e da areia clara da praia. Foram dias maravilhosos! Descontraímos, lemos bons livros, comemos comida feita por outras pessoas, nadamos, praticamos alguns esportes radicais e, mais importante de tudo, aprendemos a velejar.

Assim que nossas aulas de navegação começaram, compreendemos que isso é muito mais complexo do que parecia superficialmente. Embora cause um pouco de estresse, essa prática também descontrai, desafia e recompensa. Era necessário que estivéssemos juntos, trabalhando como equipe, e estivéssemos do mesmo lado do catamarã, para desfrutar a experiência de deslizar suavemente pelas belíssimas águas caribenhas.

Deus criou o casamento e a família para dar aos seres humanos um senso de comunidade, fazê-los sentir-se conectados e ter senso de responsabilidade mútua. Embora o processo tenha momentos desafiadores, as recompensas são imensas.

A Bíblia está repleta de conselhos para nos ajudar a direcionar nosso relacionamento familiar para a alegria máxima! Quanto mais lermos a Palavra de Deus, mais estaremos em sintonia com a vontade dEle para nossa família. A verdade é que, dentro do domínio da capacidade humana, é impossível conservar o amor abrigado longe de avarias e feridas. Entretanto, à medida que aplicamos a Palavra de Deus ao nosso relacionamento familiar, podemos encontrar capacidade para honrá-Lo nesse relacionamento. Porém, isso somente poderá acontecer se tomarmos tempo para estar juntos e crescer juntos por meio do poder de Deus.

Principais estressores do pastor

Preocupações financeiras: gastos mensais e aposentadoria 70%

Separar tempo para devoção pessoal 67%

Tempo livre com a família 67%

Tensões com transferências 58%

Falta de amizades verdadeiras – ligações emocionais 57%

Pobres mecanismos para enfrentar problemas como, por exemplo,
compulsão alimentar, dependência da mídia, pornografia 40%

Questões de família

Nós apreciamos passar tempo juntos. Tendo o privilégio de trabalhar juntos, temos experimentado juntos lugares, coisas e atividades favoritos. Temos restaurantes, museus, flores, comida e muitas outras coisas de nossa predileção. Somos agradecidos pelo fato de Deus nos haver conduzido juntos, e tentamos aplicar as Escrituras à nossa interação familiar, visando a extrair o máximo benefício. Um dos nossos versos bíblicos favoritos, que nos ajuda a estar atentos enquanto nos comunicamos um com o outro, é este: “Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar” (Tg 1:19).

Trabalhar tão próximos como acontece conosco é gratificante, mas também desafiador. Assim, nós escolhemos estabelecer tempo de lazer juntos, e frequentemente encontrar razões para comemorar, para manter o casamento e a família num ambiente agradável. Depois de passar uma semana falando em retiros de casais ou treinamento de pastores, normalmente procuramos um bom restaurante indiano. Embora sejamos cuidadosos quanto aos princípios de temperança, desfrutamos o alimento e encontramos uma boa razão para celebrar Deus e a vida.

Como colocar primeiro as coisas mais importantes

 Agende!

 Devoção pessoal.

 Dia livre semanal com o cônjuge (não tratar de nenhum problema).

 Reservar tempo para os filhos.

 Obedeça à agenda!

 Honrar primeiramente os compromissos com Deus, a família e a igreja.

 Negligenciar estrategicamente as “pedrinhas” (coisas no caminho para o mais importante).

 Use a agenda para se manter na rota

Nossos filhos já não estão conosco. Entretanto, transformamos todas as oportunidades que temos de estar juntos numa ocasião de festa. Isso nos lembra de que nos pertencemos mutuamente, e agradecemos a Deus por Sua bondade para conosco. Quando nos separamos, procuramos meios de nos mantermos ligados, empregando a negligência estratégica.

O ministério pastoral tem suas dificuldades; às vezes você se sente como se estivesse solto no ar em meio a uma terrível tempestade. Porém, uma vez que admitimos essas dificuldades, isso não importa muito desde que nos lembremos disto: “Posso todas as coisas nAquele que me fortalece” (Fp 4:13).

Referências:

  • 1 Paul Tsongas, Heading Home (Nova York: Knopf, 1984), p. 160.
  • 2 Ellen G. White, Obreiros Evangélicos, p. 204.
  • 3 “The Secret of Strategic: Bill Hybels on the Keys to Simpler and More Effective Leadership”, Leadership Journal 37, nº 1, 2015.
  • 4 Ellen G. White, Caminho a Cristo, p. 70.