Pouco mais de um ano atrás, publicamos um artigo escrito por Tim Poirier, o qual prestou valiosa ajuda na compreensão do muito discutido assunto do ponto de vista de Ellen White sobre a natureza humana de Cristo. Poirier expressou a questão nestes termos: “Assumiu Cristo a humanidade sem pecado de Adão antes da Queda, ou a natureza idêntica à nossa depois da Queda?’

Em resposta, um de nossos leitores escreveu: “Parece que a Sra. White respondeu à pergunta de maneira bastante clara e me admiro de que sua própria resposta não tenha sido usada na discussão.” Esse leitor incluiu uma cópia fotostática de algumas páginas de Mensagens Escolhidas. Ele havia sublinhado uma sentença na qual Ellen White disse que a natureza humana de Cristo foi “idêntica à nossa”.2

Todavia, em outra ocasião a mesma Ellen White escreveu: “Guarde-se todo ser humano da posição de tornar a Cristo totalmente humano, alguém como nós mesmos; pois não pode ser.”3

Um exame superficial destas duas declarações pode sugerir que elas se contradizem. O problema, contudo, não está nas declarações. Antes, está em as considerarmos como respostas diretas à pergunta que fizemos: A que foi semelhante a natureza humana de Cristo?

Nesse ponto reside um importante princípio: Compreenderemos mal as Escrituras, os escritos de Ellen White ou os de qualquer outro autor, se os considerarmos acidentalmente como respostas a nossas perguntas. Naturalmente, o aspecto menos responsável desse princípio é que, para entendermos o que um autor, seja qual for o autor, está dizendo, devemos primeiramente descobrir a preocupação desse autor — a respeito de que está ele escrevendo, a que perguntas está respondendo. Se nossa pergunta corresponde à do autor, então podemos aceitar a resposta dada como diretamente útil a nós. Se não, teremos que procurar o princípio que sustenta a mensagem dada e extrapolar desta para nossa preocupação — ou, conforme o caso, podemos simplesmente ter que admitir que o autor nada tem a dizer sobre o assunto a respeito do qual estamos inquirindo.

Aplicando o princípio

Para ilustrar: No caso da primeira citação acima, a Sra. White declarou diretamente a questão que ela estava respondendo. A pessoa a quem ela estava escrevendo havia perguntado se à luz do fato de que Cristo era um com Deus, podia Sua natureza humana submeter-se à tentação? Ellen White respondeu que embora a divindade de Cristo não pudesse ser tentada, Ele foi tão verdadeiramente humano quanto o somos, e assim podia ser tentado tão fortemente como nós, e podia tão certamente ter cedido à tentação.

A questão girava em torno de Sua natureza humana ter sido sujeita à tentação, não se ela foi semelhante à nossa em todos os sentidos. Só quando distinguimos isto, podemos entender corretamente a resposta de Ellen White.

A outra declaração de Ellen White, que mencionamos, veio em resposta a uma questão diferente. No primeiro exemplo, a Sra. White estava lidando com alguém que realçou tanto a divindade de Cristo que havia perdido a visão da realidade de Sua humanidade. No segundo caso, o recipiente de seu conselho se centralizou quase que exclusivamente na humanidade de Cristo. Aqui Ellen White preveniu contra dois perigos. Primeiro, este indivíduo estava fechado para a sugestão de que, como os outros descendentes de Adão, Cristo tinha inclinação para o mal. E segundo, ele estava perdendo o conceito do fato de que Cristo era mais do que meramente humano. Ela aconselhou: “Precisais guardar tenazmente cada asserção, para que não… percais ou obscureçais as claras percepções de Sua humanidade quando combinadas com a divindade.4

Assim, quando ela disse que Cristo não foi “tão completamente humano como nós” ela não estava querendo dizer que Sua humanidade era de alguma espécie diferente da nossa. Antes estava simplesmente estabelecendo limites entre nossas tendências para o pecado e a inocência de Cristo, e entre nossa completa humanidade e Sua condição ímpar como plenamente divino ao mesmo tempo que plenamente humano.5

É imprescindível a cuidadosa consideração do contexto — tanto literário como histórico — para se entender a comunicação de alguém. Saber de que assunto está tratando o autor é parte essencial do entendimento desse contexto. — David C. James

Referências:

1. Tim Poirier, “As Fontes Esclarecem a Cronologia de Ellen White”, Ministry (dezembro de 1989), págs. 7-9.

2. Ellen G. White, Mensagens Escolhidas (Casa Publicadora Brasileira), Livro 3, pág. 129.

3. SDAB Commentary, vol. 5, pág. 1129.

4. Idem, pág. 1128.

5. Num manuscrito que ela escrevera antes deste, ela harmonizou os conceitos que aparecem nessas duas declarações. Ela escreveu que a humanidade de Cristo foi “inteiramente idêntica à nossa própria natureza, mas sem a mancha do pecado” (Manuscrito 57, 1890 — Manuscrito liberado 1211 [itálicos supridos]. Poirier inclui esta declaração no boxe que acompanha o seu artigo.

Interessante! Esta declaração assemelha-se a uma que se encontra em Mensagens Escolhidas a ponto de contrastar a natureza humana de Cristo e a natureza dos anjos. Ela difere principalmente na inclusão da distinção realçada entre Sua natureza e a nossa — em que Ele era sem pecado.