Sucesso não é um direito que podemos reclamar e perseguir de qualquer maneira, nem por quaisquer meios

A ideia de sucesso ocupa lugar central na sociedade moderna. Quem o alcança tem prestígio e reconhecimento. Para ter sucesso, milhões de pessoas experimentam métodos e caminhos distintos, transformando o mundo globalizado em um verdadeiro campo de batalha. Desde seus primeiros anos de educação formal, a criança aprende que a vida é uma competição, onde quem vence é valorizado e quem perde é descartado.

Para o cristão, esse é um terreno perigoso, cheio de tentações e armadilhas. A ênfase desmedida que a sociedade coloca no material e a necessidade de êxito pessoal não podem ser passadas por alto com facilidade. Muitos há que definem a própria identidade a partir de um conceito de êxito relacionado com a capacidade de conseguir dinheiro, posses, poder e prestígio.

Diante dessa realidade, surgem algumas questões importantes que devem ser analisadas. São realmente essas coisas que determinam o valor das pessoas? Como a sociedade concebe o êxito? De que maneira os padrões seculares estão afetando o pensamento, a vida e o desenvolvimento da igreja? O que diz a Bíblia, e como podemos assimilar seu pensamento sobre o êxito?

Alguns podem pensar que as coisas estão bastante claras e que as respostas afloram com facilidade. Mas a realidade parece mostrar que, no final das contas, as opções do crente se reduzem a duas: ou enfrenta de maneira reflexiva e consciente esses desafios, ou assimila inconscientemente o modelo predominante no meio em que vive.

Qualquer análise bíblica desse tema deve considerar o propósito de Deus para a humanidade, ou seja, sua redenção: “Por infinito amor e misericórdia foi concebido o plano da salvação, concedendo-se um tempo de graça. Restaurar no homem a imagem de seu Autor, levá-lo de novo à perfeição em que fora criado, promover o desenvolvimento do corpo, mente e espírito para que se pudesse realizar o propósito divino da sua criação…”1

Deus e o sucesso

Tendo como pano de fundo o paradigma divino, precisamos responder: Como é possível alcançar êxito segundo os planos e propósitos de Deus? Qual a medida do êxito no reino de Deus? Que é êxito, segundo Deus?

Primeiramente, consideremos a importância fundamental dos motivos. Para Deus, a razão pela qual as coisas são feitas pode ser mais importante do que a própria ação. Isso é evidente no Sermão da Montanha (Mat. 5-7), no qual Jesus desafia Seus ouvintes a buscar uma justiça superior à dos fariseus, ou seja, uma bondade que brote do coração. Posteriormente, Ele disse: “O homem bom tira do tesouro bom coisas boas; mas o homem mau do mau tesouro tira coisas más” (Mat. 12:35).

“Não é a soma do trabalho que executamos, nem seus resultados visíveis, mas o espírito com que o fazemos é que o toma valioso para Deus… Quando são tolerados o orgulho e a complacência própria, a obra é arruinada… Somente quando o egoísmo estiver morto, banida a contenda pela supremacia, o coração repleto de gratidão e o amor houver tomado fragrante a vida – somente então, Cristo nos está habitando na alma e somos reconhecidos como coobreiros de Deus.”2

Deveriamos nos perguntar honestamente: Estou preocupado em edificar meu próprio reino ou o de Deus? Aqui não se trata de ignorar a própria necessidade de bem-estar, mas de não permitir que ela se converta no objetivo final da vida.

Junto com a motivação estão os métodos utilizados para conseguir os objetivos. A qualidade do ser demonstra o fazer. “Pelos seus frutos os conhecereis. Colhem-se, porventura, uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? Assim toda árvore boa produz bons frutos, porém a árvore má produz frutos maus. Não pode a árvore boa produzir frutos maus, nem a árvore má produzir frutos bons. Toda árvore que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo. Assim, pois, pelos seus frutos os conhecereis. Nem todo o que Me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos Céus, mas aquele que faz a vontade de Meu Pai que está nos Céus” (Mat. 7:16-21).

A grandeza de servir

Na esfera do reino de Deus, os resultados pertencem ao Senhor. Essa é a lição que nos é ensinada pela experiência de muitos servos de Deus. Moisés aparentemente fracassou, ao não entrar em Canaã, e os profetas do Antigo Testamento experimentaram repetidas frustrações. Mesmo Cristo “veio para o que era Seu, e os Seus não O receberam” (João 1:11). Como sugere George R. Knight, se avaliarmos o trabalho de Cristo segundo os padrões prevalecentes de sucesso, Ele foi um líder que fracassou.3 Daí, a importância do conselho: “Quando, descansando em nosso Ajudador, houverdes feito tudo que está ao vosso alcance, aceitai alegremente os resultados.”4

Deus está mais interessado no que estamos chegando a ser, em lugar do que estamos fazendo para Ele. Está mais interessado na purificação e santificação dos nossos motivos. Embora o fazer seja importante, não é superior ao ser. Somente aqueles que desenvolvem as qualidades de caráter apresentadas nas bem-aventuranças estão em condições de ser a luz do mundo e o sal da Terra (Mat. 5:3-16).

No processo da santificação, o êxito pode ser entendido como um “bônus” que Deus, em Sua sabedoria, decide conceder-nos. Não é um direito que podemos reclamar ou perseguir de qualquer maneira e por quaisquer meios. A parábola dos trabalhadores na vinha (Mat. 20:1-16) é parte da resposta de Jesus à pergunta de Pedro sobre a recompensa que receberiam os que O seguissem (Mat. 19:23-30). E uma das principais lições da parábola é que Deus não dá ao ser humano o que este merece, mas o que necessita.

Ao captar essa perspectiva bíblica, compreendemos a razão pela qual o anjo anunciou a Zacarias que seu filho, João, seria “grande” (Luc. 1:15). “Valor moral, eis o que é estimado por Deus. Amor e pureza são os atributos que mais aprecia. João era grande aos olhos do Senhor quando, em presença dos emissários do Sinédrio, diante do povo e perante seus próprios discípulos, se absteve de buscar honra para si, mas encaminhou todos para Jesus como o Prometido.”5

O ponto focal da vida do cristão deve ser servir a Deus com o máximo de seus talentos e habilidades, sem considerar os benefícios que poderia granjear para sua reputação ou para suprir uma profunda, e às vezes inconsciente, necessidade de ganho. Deve encontrar deleite em fazer a vontade de Deus. Os resultados de seus esforços pertencem ao Senhor.

Na realidade, jamais veremos todo o sucesso do nosso labor até que Cristo volte (Heb. 11:13).

Princípios fundamentais

Todo líder cristão deve refletir cuidadosamente sobre a questão do sucesso, e, sob a direção divina, elaborar sua própria teologia de êxito. Somente assim estará livre do risco de assimilar o modelo de pensamento predominante em seu meio social, cultural e até eclesiástico. Em meio à crescente pressão social e cultural, o crente deve lembrar que foi chamado a desenvolver a mente de Cristo (I Cor. 2:16), e isso só é possível seguindo o conselho de Paulo: “E não vos conformei com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rom. 12:2).

Finalmente, uma teologia de êxito deveria considerar os seguintes aspectos:

Focalizar a fidelidade a Deus e Sua Palavra (Mat. 25:21). Quem é fiel, em quaisquer circunstâncias, está mais perto do verdadeiro êxito, segundo Deus, do que quem facilmente cede à pressão externa.

Evitar a competição. Mesmo que esta seja uma característica da sociedade contemporânea, Deus deseja que nos complementemos e apoiemos mutuamente.

Assim como é impossível desenvolver uma teologia de saúde sem considerar uma teologia de enfermidade, não é possível conceber uma teologia do êxito que desconsidere a teologia do fracasso. Em muitas ocasiões, os propósitos de Deus são melhor compreendidos pelo homem em meio ao fracasso. Aparentes perdas e momentâneos revezes também modelam o caráter.

Deus, mais do que êxito, espera fidelidade. “Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida” (Apoc. 2:10).”Muito bem, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei; entra no gozo do teu Senhor” (Mat. 25:23).

“Não é a soma do trabalho que executamos, nem seus resultados visíveis, mas o espírito com que o fazemos é que o torna valioso para Deus”

Referências:

1 Ellen G. White, Educação, págs. 15 e 16.

2 ______________, Parábolas de Jesus, págs. 397 e 402.

3 George R. Knight, Ministério, maio/junho de 1998, págs. 5-7.

4 Ellen G. White, Caminho a Cristo, pág. 122.

5 _____________, O Desejado de Todas as Nações, pág. 219.

Walter Alaña, Professor de Teologia Aplicada na Universidade Peruana União, Lima, Peru