Um modelo que incentiva a criatividade da igreja e ajuda a produzir mensagens relevantes

Está você em dúvida quanto à efetividade dos seus sermões semanais? Em caso afirmativo, gostaria de receber alguma ajuda? Experimente liberar as forças criativas de sua congregação, apresentando-lhe uma mensagem preparada com a utilização da técnica de grupo. Você divide os ouvintes em grupos, nos quais eles discutem o tema escolhido para o sermão. Então, na ocasião apropriada, você faz a exposição do assunto, acrescentando à sua pesquisa o material fornecido pela discussão. Pode parecer uma ideia curiosa, mas a primeira vez que eu tive contato com ela foi quando li o livro Between Two Worlds [Entre Dois Mundos], de John R. W. Stott.1

A certa altura de sua argumentação, Stott descreve o andamento de um diálogo pré-sermão conforme segue: “A discussão era invariavelmente vigorosa, e em muitas ocasiões surpreendi-me sentado e ouvindo o debate desenvolvido entre duas opiniões diferentes. A prática de procurar ouvir tudo discretamente provou ser extremamente estimulante e iluminadora.”2 “As vezes eu procurava fazer perguntas aos participantes, porque eu sabia em que direção queria conduzir o assunto. Então me sentava e ficava ouvindo enquanto eles debatiam as respostas.”3

A diversificada composição desse sermão em grupo enriqueceu a pregação de Stott, enquanto ele preparava sua série intitulada “Problemas da Inglaterra”. Quando abordou a questão do desemprego, Stott disse ter notado que os participantes do grupo que debateu o tema o ajudaram a “sentir o que eles sentiam – o choque, a rejeição, a mágoa, a humilhação e o senso de abandono que só um desempregado pode experimentar”.4 E conclui: “A experiência foi completamente criativa, embora houvesse alguma dificuldade para relacionar princípios bíblicos e o contexto contemporâneo.”5

Recentemente experimentei usar esta estratégia ao preparar uma série de sermões sobre o cristianismo no dia-a-dia.6 A série consistia de quatro sermões: “Como ser cristão na sala de aula”; “Como ser profissionais de saúde cristãos”; “Como ser cristão nos negócios” e “Como ser cristão no lar”. Na preparação de cada um desses sermões, eu promovia uma reunião com diversos grupos para discutir o assunto, sempre às terças-feiras à noite.

Cristianismo na aula

Havia cinco pessoas na primeira reunião de grupo que fiz, discutindo como ser cristão na sala de aulas: um professor universitário de ética, um professor de inglês, uma professora do Ensino Fundamental, um segundanista do Ensino Médio e uma estudante universitária, também segundanista. A reunião durou pouco mais de uma hora e os resultados foram magníficos. Eu havia aprendido com Stott que meu principal objetivo nesse encontro era ouvir. Fiel a esse aspecto, logo pude perceber que muitos componentes do grupo viveram experiências nas quais os professores não se demonstraram cristãos na sala de aula.

Nadine, a professora do Ensino Fundamental, partilhou uma embaraçosa história sobre um evento traumático que ela experimentou quando estava prestes a concluir seu curso. Certo professor costumava bater com força uma régua de madeira em sua mesa, supostamente para despertar os estudantes. Em uma ocasião, ele marchou pela sala de aula com um rolo de fita adesiva com a qual amarrou as mãos e o livro de uma estudante na carteira. Ninguém entendia o que estava acontecendo. Em seguida, ele enrolou a fita na cabeça da atônita moça, voltou ao seu lugar e caiu na gargalhada.

Enquanto Nadine relatava essa experiência aos componentes do grupo, notei a expressão de choque em seu rosto. Para ela, aquele era um exemplo dramático de como não agir como cristão em uma sala de aula. Incluí a mesma história no sermão que preguei sobre o assunto naquela semana, e pedi a Nadine para ela mesma fazer o relato. A congregação obviamente ficou surpresa e atenta enquanto eu caminhava em sua direção com um microfone, dando-lhe a oportunidade de partilhar sua experiência.

Outra poderosa ilustração veio do professor de inglês. Ele falou ao grupo sobre uma carta que recebeu de um estudante, o qual relatava o impacto positivo que os ensinos recebidos causaram em sua vida. Esse relato foi um exemplo poderoso e positivo da prática do cristianismo na sala de aula. Outro membro do grupo pediu-lhe para levar a carta à igreja no dia do sermão. Ele aceitou a sugestão e contou a experiência no final da mensagem. A congregação estava visivelmente emocionada, enquanto o Professor Monte lia a carta de um aluno cuja vida fora transformada por um professor que revelou cristianismo prático durante as aulas.

Sessenta e um professores vieram à frente, quando fiz um apelo para reafirmação da entrega de sua vida e seus talentos ao Senhor, no final do sermão. Responderam ao desafio de serem cristãos na sala de aula, ensinar com paixão e tratar seus alunos compassivamente. Ao terminar a programação daquela dia, muitas pessoas se ofereciam para fazer parte dos próximos grupos da série.

Uma professora, cuja vida fora profundamente tocada pelo sermão me enviou uma mensagem pelo correio eletrônico, sugerindo que seu esposo fosse incluído no grupo que estudaria o tema “como ser cristão nos negócios”. Compreendi então que a estratégia estava despertando as energias criativas da congregação.

Cristianismo na saúde

O segundo grupo de estudos para o sermão reuniu-se na terça-feira seguinte. A discussão programada era sobre “como ser profissionais de saúde cristãos”. Pude sentir a força, o interesse e o entusiasmo do grupo, composto por um médico, três enfermeiras, um orientador pedagógico e o capelão da enfermaria de um hospital cristão.

Novamente, minha tarefa primária era ouvir. O tempo passou rapidamente enquanto eu ouvia relatos daqueles profissionais, alguns dos quais disseram ter voltado para casa chorando no automóvel, algumas vezes, esmagados pela maré das necessidades humanas, que parecia querer afogá-los.

Alguém no grupo se referiu ao texto de Marcos 6, segundo o qual Jesus e os discípulos foram movidos pelas necessidades do povo. Naquele relato, nós encontramos uma vivida descrição do problema e a solução divinamente inspirada: os profissionais de saúde cristãos devem permitir que Jesus cuide deles, a fim de que sempre tenham algo a oferecer a um mundo necessitado. Devem abrir-se a Cristo, permitindo que Ele os dirija em relação a quando e como devem cuidar de outras pessoas. Somente assim, poderão seguir o modo de Cristo e cuidar incondicionalmente. Durante a apresentação do sermão, os profissionais de saúde da igreja foram desafiados a exercer seu trabalho da mesma forma como Jesus faz com eles.

Por volta da terceira semana, professores e profissionais de saúde que estiveram fora da cidade, durante as duas apresentações, estavam solicitando cópias das mensagens. Realmente aconteceu algo maravilhoso.

Cristianismo nos negócios

O terceiro sermão preparado em grupo abordou o desafio de ser cristão no mundo dos negócios. O grupo de estudos foi composto por um empresário que operava uma pequena concessionária de automóveis, um especialista em treinamento de pessoal que trabalhava para quatro empresas, um experiente e muito solicitado consultor de informática, a esposa de um dentista que gerenciava a clínica do esposo, e o proprietário de uma agência de viagens.

O grupo gastou um pouco mais de tempo que o normal, quase uma hora e meia, discutindo como podemos revelar cristianismo no dia-a-dia dos negócios. Pela experiência vivida nessa ocasião, devo lembrá-lo de que o grupo não é reunido com o objetivo de escrever ou esboçar o seu sermão. Ele serve apenas como catalisador, levantando questões, analisando desafios e oportunidades do ambiente em que as pessoas vivem.

Depois de um período de oração e reflexão com esse grupo, nos reportamos à narrativa de Lucas 19, que fala do encontro de Jesus com um indivíduo de mentalidade altamente secular e capitalista, chamado Zaqueu. Descobri duas significativas mudanças ocorridas na vida desse homem como resultado do seu encontro com Cristo. Zaqueu experimentou mudança de atitude e de ética em seus negócios. Depois do encontro com Jesus, já não era um indivíduo obcecado por dinheiro, mas pela oportunidade de servir. Ao invés de procurar levar vantagem sobre os clientes, buscava tratá-los como gostaria de ser tratado.

Mais uma vez, depois de ter pregado o sermão, foi maravilhoso observar irmãos envolvidos em vários ramos de negócios respondendo ao apelo para honrar a Cristo em suas atividades.

Cristianismo no lar

O último sermão da série tratou da vida cristã no lar. Sete pessoas, entre pais e filhos, participaram do grupo que me ajudou a preparar a mensagem. A faixa etária delas variava de uma jovem mãe no início dos seus 30 anos a uma vovó com pouco mais de 60 anos. Enquanto eu ouvia a interação do grupo, alimentei a impressão de que viver o cristianismo dentro de casa era o maior de todos os desafios.

Muitos membros do grupo partilhavam histórias dolorosas de hipocrisia no lar, onde o comportamento privado contradizia a profissão pública. Havia lágrimas deslizando pela face de uma jovem que se declarava vítima de muitos abusos por parte do pai, um professo cristão e membro da igreja. Olhei ao redor e vi que outros irmãos também choravam. E compreendi que necessitava fazer referência a esse caso durante o sermão.

Como você sabe, a palavra “hipócrita” origina-se de um termo usado em antigos divertimentos gregos. O ator que escondia sua verdadeira identidade atrás de uma máscara era chamado um hupocrate. Um dos membros do grupo conseguiu uma máscara utilizada em bailes e, durante o sermão, sempre que eu fazia referência à hipocrisia, cobria meu rosto com ela.

Partilhei três maneiras de se evitar a hipocrisia e, desse modo, manifestar um espírito cristão no lar: admitir que você é um pecador em constante necessidade da graça de Deus; perdoar os outros assim como Deus o perdoa; e reconhecer a necessidade de crescer na graça.

O sermão foi concluído com o testemunho de um outro membro do grupo. Nancy partilhou sua história de convivência com um casal que lhe foi um maravilhoso exemplo de cristianismo no lar. Quando esse casal tinha filhos pequenos, ela trabalhou como babá em sua casa. Um dia, ela falou a um dos membros da família: “Este pessoal é tão sincero, tão agradável, que se Len [o esposo] tivesse um irmão mais jovem, eu me casaria com ele.” O resultado é que agora Nancy está casada com Larry, o irmão mais novo de Len.

Os irmãos riram muito enquanto Nancy contava sua história. E a lição é clara. Embora a hipocrisia produza sérios prejuízos à vida familiar, o verdadeiro cristianismo vivido no lar resulta em grandes bênçãos.

Experiência compensadora

Achei a tentativa de elaborar sermões com base na técnica de grupo uma experiência animadora. O grupo pode ser utilizado de muitas formas. A minha série foi composta por sermões de tópico. Mas podemos utilizar o grupo também quando planejamos pregar uma série de sermões expositivos. Nesse caso, a composição do grupo pode até nem mudar a cada semana, mas um só grupo serve para toda a série.

Os membros da equipe poderiam receber o texto do sermão e estudá-lo em grupo. Aí poderiam discutir as questões que normalmente surgem do estudo de uma passagem bíblica. O que este texto significa? Como ele se aplica à minha vida hoje? Experiências pessoais e histórias podem surgir daí, iluminando o conceito bíblico em discussão.

O uso da técnica de grupo como uma estratégia na preparação de sermões relevantes não está limitado a grandes congregações. Diz Stott: “Sou muito relutante em aceitar a idéia de que a pequena igreja do interior e seu pastor muito atarefado não podem fazer nada. Se uma série de sermões cuidadosamente preparada não pode ser feita durante um trimestre, não é impossível durante um ano. Se uma congregação não possui entre seus membros cristãos suficientemente maduros, especialistas em sua área, deve haver alguém que pertença a outra igreja e que terá boa vontade para colaborar dentro de sua especialidade, numa discussão de grupo para a qual seja convidado. E certamente ficará agradecido.”

A técnica de grupo no sermão não é muleta para preguiça ou descuido por parte do pregador. O grupo não escreve nem esboça o sermão, nem dispensa cuidadosa exegese. Entretanto, estou convencido de que o uso dessa técnica despertará a força criativa da congregação e ajudará muito na Contextualização das mensagens.

Ainda de acordo com Stott, “não é justo que os irmãos façam questões e nós as respondamos, desde que também temos questões que eles podem responder. Apresentando uns aos outros suas questões, nós, de uma perspectiva bíblica, e eles, da perspectiva contemporânea, podemos juntos discernir que respostas podem ser encontradas, já que a Palavra deve ser contextualizada no mundo”.

Referências:

1 John R. W. Stott, Between Two Worlds: The Art of Preaching in the Twentieth Century (Grand Rapids, Ml: William B. Eerdmans, 1982).

2 Ibidem, pág. 199.

3 Entrevista de Derek J. Morris com John R. W. Stott, 12/08/96. Citado em Listening to the Listener: Audience Feedback as a Resource for Relevant Biblical Preaching. Tese doutorai, Gordon-Conwell Theological Seminary, 1998, pág. 111.

4 John R. W. Stott, Op. Cit., pág. 199.

5 Ibidem.

6 Cópias e áudio dos sermões estão disponíveis no site da igreja adventista de Calimesa, Califórnia, Estados Unidos: www.calimesasda.com

7 John Stott, Op. Cit., págs. 200 e 201.

Derek J. Morris, Pastor em Calimesa, Califórnia, Estados Unidos