Qual o significado de inspiração hoje? Qual o valor normativo das Escrituras?

Diretor do Instituto de Pesquisa Bíblica, Silver Spring, Maryland. A afirmação do filósofo do século dezessete, John Locke, segundo à qual em toda pessoa reside uma autonomia autodirigida, que não deve ser diminuída a não ser com permissão do seu possuidor, parece ter conquistado época. A princípio visível politicamente nas revoluções na América do Norte e na França, tornou-se funda-mental para cada segmento do pensamento ocidental. Agora os extremistas contemporâneos desafiam toda sorte de autoridade.

Uma ilustração interessante é o impacto dessa autonomia sobre a autoridade religiosa e a moralidade. A idéia de que ninguém tem o direito de limitar meus desejos pessoais e de que minha permissão deve ser solicitada antes que qualquer tipo de restrição seja imposto a minhas atividades, continua a espalhar-se em círculos nos quais se pensava outrora fossem da esfera da direção de Deus. Como resultado, a moral, o comportamento e mesmo as crenças doutrinárias são agora ditados pela vontade da comunidade, em pesquisa de opinião da maioria. A amoldagem dessa opinião se tornou uma grande atividade quando os programas de relações públicas lisonjeiros trabalhavam com o grupo num esforço por influenciar as opiniões ou produzir a disposição que induz as pessoas a um fim desejado.

Num clima tal, não é de surpreender que muitas pessoas considerem as normas objetivas que governam o certo e o errado como o resíduo antiquado de uma época menos iluminada.

Com estas condições a prevalecerem, a pretensão da Bíblia, de ser a expressa vontade de Deus, encontra-se sob fogo cerrado, mesmo nas questões entre os adventistas. Cumpre reconhecermos o fato de que o mais intenso esforço formador de opinião, incluindo-se a opinião teológica adventista, procede do ambiente social circunjacente, algo particularmente verdadeiro em países industrializados. Pode-mos negar isto, mas os pastores no campo conhecem muito bem esta verdade.

Observar isso não é de maneira alguma diminuir a gravidade do debate sério em torno da autoridade; antes é salientar a necessidade de dizer as coisas com clareza. As reafirmações de uma posição, não importa quão ardorosas sejam, nada poderão fazer. Os adventistas devem empreender uma reavaliação de onde estão, e explorar uma vez mais a autoridade da Bíblia. Isto inclui a questão de se a mensagem apresentada nas Escrituras voltará às mais profundas nascentes do espírito adventista e, em caso afirmativo, como pode vir a acontecer. Devido à insistência do adventismo histórico em fundamentar todas as coisas na Palavra de Deus, esta questão é de vital importância. O desgaste da autoridade bíblica, é de tão grande significado que anuvia muitas das questões em debate, e, na verdade, contribui para as discussões de alguns desses assuntos.

Fontes de autoridade

Quais são as fontes da autoridade religiosa? São dadas muitas sugestões: uma força mística interior (típica das várias crenças orientais); concepções

humanas (muitas vezes precedidas da análise racional); uma organização religiosa (cultos com um só líder): uma combinação das Escrituras com a tradição da igreja (várias ramificações católicas); experiência humana que se diz sob a direção do Espírito Santo (os grupos carismáticos); a Bíblia como a autorizada palavra de Deus (protestantes conservadores), e as várias combinações destes. Alguns, como os Mórmons, subordinam a autoridade das Escrituras canônicas a outros escritos. De todos estes, os adventistas têm até agora colocado a Bíblia — todos os 66 livros — em posição elevada. Como escreveu Ellen White: “Deus terá sobre a Terra um povo que mantenha a Bíblia, e a Bíblia só, como norma de todas as doutrinas e base de todas as reformas. As opiniões de homens ilustrados, as deduções da ciência, os credos ou decisões dos concílios eclesiásticos, tão numerosos e discordantes como o são as igrejas que representam, a voz da maioria — nenhuma destas coisas, nem todas em conjunto, deveriam considerar-se como prova, em favor ou contra qualquer ponto de fé religiosa. Antes de aceitar qualquer dou-trina ou preceito, devemos pedir em seu apoio um claro — ‘assim diz o Senhor’”.1

Ellen White não está diminuindo o valor de outros meios de aprendizado; ao contrário, está identificando as Escrituras como sendo a palavra final em assuntos de fé religiosa. Que ela não pretende limitar a opinião bíblica a assuntos religiosos apenas, é evidente de sua recomendação da Bíblia como fonte de informação histórica e co-mo um autêntico registro das origens.

Quando, porém, levamos a autoridade escriturística além dos limites religiosos essencialmente, tornamo-la vulnerável à pesquisa histórica e à científica, e aí está o ponto de colisão que opõe as pessoas honestas umas contra as outras sobre a natureza da Palavra. Além disso, o processo comum dos estudos críticos tem apresentado substanciais números de dificuldades no texto bíblico. Essas questões dificultam qualquer com-preensão aceitável de inspiração. Lidar com esses denominados fenômenos, apresenta um desafio para os adventistas.

Teorias da inspiração

Os livros sobre revelação e inspiração, a partir de 1975, apresentam no mínimo seis teorias da inspiração, três das quais merecem um breve comentário.

Os três pontos de vista são (1) o liberal, (2) o neo-ortodoxo, e (3) o evangélico. Após considerarmos o caráter essencial de cada um desses pontos de vista, voltaremos a verificar onde se encontram os adventistas.

Liberal. O protestantismo liberal tem sua origem na idéia do filósofo alemão Schleiermacher, de que Deus é intimamente percebido e é variável quanto à forma. Este ponto de vista pode ser descrito como um senso de dependência de um poder mais elevado. Esse conceito foi logo associado ao exame crítico dos livros bíblicos.

“Quando levamos a autoridade escriturística além dos limites religiosos, nós a tornamos vulnerável à pesquisa histórica e científica.”

Em essência, o ponto de vista liberal começa com o “fenômeno” das Escrituras, os milhões de partes fragmentárias de informação, e avança no sentido da formulação de um ponto de vista total da inspiração, que pode servir para to-dos os elementos examinados. Ele exige fidelidade total ao texto em si, permitindo que as conclusões surjam do texto, em lugar de impô-las a partir de normas predeterminadas.

Com o prosseguimento da obra, emergem três temas repetidos: Primeiro, a ver-dade divina não deve situar-se em um livro antigo, mas é representada na obra do Espírito em andamento na comunidade. Essa obra é discernida por meio do julgamento crítico racional. Seu principal alvo não é identificar a verdade objetiva, mas buscar um autêntico conhecimento de Deus. Em segundo lugar, Jesus aparece como o arquétipo da compreensão e excelência religiosa. A salvação se torna um assunto do ensino e pioneirismo de Jesus, uma maneira melhor de se entender a Deus. O realce é sobre a humanidade de Jesus, acima de outras qualidades. Por último, a essência de Cristo deve ser encontrada em sua grandeza humana.

Olhando por esse lado, as discrepâncias que existem no texto bíblico não possuem nenhum problema especial, pois a tônica repousa sobre a humanidade de Cristo. Não importa se Mateus cita uma passagem como sendo de Jeremias, quando tal passagem não se encontra em nosso texto atual de Jeremias (Mat. 27:9 e 10). Todos esses relatos são de origem humana, mas o que importa é que eles conduziram o leitor a Jesus. É neste transporte contínuo para a fé em Jesus que os teólogos liberais encontram inspiração.

Como diz Paul Achtemeier, ocorre a inspiração, como uma atividade do Espírito Santo, onde a tradição, a situação correta e um reagente se combinam. Para ele, respondente não é apenas a pessoa que escreveu, mas toda pessoa que se tornou ativa em reunir, pastorear, preservar, modificar e reinterpretar a tradição no decorrer dos anos, incluindo o escritor final. Por essa razão, a inspiração é uma dinâmica contínua, presente em todas as épocas, sempre que as Escrituras são lidas. Poder-se-ia dizer muito mais sobre o assunto, mas obviamente muita coisa desta maneira de ver não é compatível com o pensamento adventista.

Neo-ortodoxo. Mesmo os defensores do ponto de vista liberal da inspiração, admitem que o seu produto final é amorfo e fortemente subjetivo. Na ausência de absolutos, em que firmará o crente a sua fé? A resposta em geral é: Naquilo que a razão diz ser bom, extraído da experiência total da vida.

Essa incerteza levou a uma reação do século vinte, chamada neo-ortodoxia ou teologia do encontro, que procura retomar a uma autoridade ampliada da Escritura. Aí encontramos Barth, Brunner e Bultmann. A tarefa: reconciliar um texto sujeito a erro com a idéia da verdadeira autoridade. Os meios: Conceber a Bíblia em dois níveis. No nível inferior está o texto como o encontramos, passível de erro, em linguagem humana, absurdo no contexto da cultura. Quando examinado de maneira crítica, achamos que o texto foi o registro do encontro do humano com Deus.

Em um nível mais elevado, porém, Deus age acima das limitações da linguagem humana. Aqui, Ele Se move numa linha experiencial, dinamicamente envolvida no relaciona-mento com o texto bíblico mas, paradoxalmente, pairando livre dele. O encontro com Deus é um evento do Espírito Santo no ‘coração do crente, embora sob a influência do testemunho da confirmação bíblica.

O produto final: Porque o valor desse ponto de vista repousa no nível superior do encontro flutuante, podemos ocupar-nos do registro do nível inferior com análise crítica, sem lhe perturbar a função. Assim a revelação se torna, não a transmissão do objetivo, da verdade propositora, mas um encontro subjetivo com Deus, intimamente recebido. Não é difícil perceber a influência de Schleiermacher nesse sistema e como sua ambigüidade tem levado muitos à insatisfação.

Evangélico: Os evangélicos começam com o conceito de que a Escritura é a Pa-lavra escrita de Deus. A importância repousa fortemente em seu aspecto Palavra de Deus, muitas vezes com a minimização do elemento humano. Embora raramente a própria Bíblia apresente uma ordem sistemática de inspiração, tem ela muito o que dizer sobre a maneira como Deus determinou que Sua Palavra fosse falada e escrita. Bernard Ramm desenvolve essa tese em sua obra Special Revelation and the Word of God (A Revelação Especial e a Palavra de Deus), 1961.

Temos as conhecidas declarações de II Timóteo 3:15-17 (“Toda escritura é inspirada por Deus”, literalmente, soprada por Deus [verso 16, RSV]), e de II Pedro 1:20 e 21 (“Nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação, mas homens movidos pelo Espírito Santo falaram de Deus” [verso 21, RSV]).

Os evangélicos aceitam o modelo profético das Escrituras. Ao assim fazerem, seu forte realce sobre as qualidades outorgadas por Deus à Bíblia tem-se feito acompanhar da afirmação de que os manuscritos originais devem ter sido isentos de erro. A perplexidade presente es-tá ao se lidar com cópias cuja perfeição original se perdeu, por causa de erros dos copistas, interpretações erradas, e uma série de outros problemas surgidos com o processo de transmissão. Entre os evangélicos eruditos, a preocupação tem sido conciliar as divergências da melhor maneira possível. Algumas propostas apresentam considerável ingenuidade, e falta de credibilidade. A palavra-chave é “infalível”. De novo, entre os mais bem informados esta não requer a teoria mecânica do ditado, mas os evangélicos têm encontrado dificuldade em concordar exatamente sobre o que entendem por “infalível”.

A maioria dos evangélicos apela para o princípio estabelecido pela Reforma de sola Scriptura. De acordo com este princípio, os reformadores estavam apelando para a Bíblia como a corte de apelação final. Esta posição difere dos ensinos evangélicos de hoje, de um texto isento de erro nos manuscritos originais, idéia efetivamente desenvolvida na era pós-Reforma.

Ao distinguirem os seus pontos de vista dos defendidos pelos neo-ortodoxos, os evangélicos insistem em que embora a Bíblia defenda o encontro com Deus, ela vai além. Transmite-lhes contentamento no significado das palavras. A Bíblia apresenta verdades factuais, proposicionais e objetivas que fornecem normas para a fé e prática quanto à revelada vontade de Deus, normas válidas, quer aceitas ou não, e normas permanentes, porque Lhe revelam o caráter tan-to nas mensagens escritas como nos relatos do ministério de Seu Filho. Assim como o Espírito Santo esteve operando ao transmitir ao escritor, também está ativo em levar o leitor a responder ao apelo de Deus.

Assim, a perspectiva evangélica vê a inspiração, não só como o Espírito atuando no meio da comunidade de crentes, mas também como um fenômeno objetivo. Ainda que expresso na linguagem, cultura e épocas da humanidade, o texto bíblico encerra valores transcendentes acima e além, valores destinados a apresentar o Filho de Deus como o centro unificador de uma coleção de documentos escritos em ocasiões e lugares diversos. E junto com a revelação do Filho há a expressão da vontade de Deus e do caminho da salvação.

“As verdades reveladas são todas ‘dadas por inspiração de Deus’; embora sejam expressas em palavras de homens e adaptadas às necessidades humanas.”

A resposta adventista

Como os Adventistas do Sétimo Dia consideram estas teorias da inspiração? Distantes da posição liberal e quase tão distantes da perspectiva neo-ortodoxa, os adventistas também se sentem inconformados com a infalibilidade evangélica. A idéia de defender a posição isenta de erro dos manuscritos perdidos se afigura sem valor. Ela se parece uma forma preventiva de combate ao adversário hipotético. Mas o desafio é tão sério para os adventistas como o é para os evangélicos: como manter um ponto de vista elevado da autoridade escriturística, enquanto, ao mesmo tempo, se reconhecem as limitações das Escrituras? Pode a posição “a Bíblia e a Bíblia só” ser defendida?

Os adventistas já começaram a lidar com estes problemas. Vários artigos cuidadosamente elaborados e uma quantidade de ensaios e coleções de ensaios na for-ma de extensos livros já apareceram. Te-mos a Biblical Interpretation Today, de Gerhard Hasel (que de modo especial aplica os métodos); Was Luke a Plagiarist? (Foi Lucas um Plagiador?), de George Rice; Who’s Afraid of the Old Testament God? (Quem Tem medo do Deus do An-tigo Testamento?), que contém simplificações para os hermeneutas; e outras publicações do Instituto de Pesquisas Bíblicas, tais como Biblical Hermeneutics (Hermenêuticas Bíblicas). Devemos considerar também a valiosa publicação de vários escritos de Ellen White sobre a natureza da Bíblia e da influência da inspiração. Na verdade, eles nos colocam numa posição que no mínimo oferece a solução parcial das tensões.

Uma preocupação contínua da história da inspiração, adventista, é a tentativa de aliviar o firme compromisso de manter um elevado conceito das Escrituras. Sem nos dobrarmos a tal espécie de tentativa, podemos considerar três opções.

Os pioneiros adventistas estavam bem cientes das dificuldades, sobre a credibilidade da Bíblia, que os cercavam no século passado. Ellen White e outros ficaram alarmados com o rápido crescimento do cepticismo e da alta crítica, melhor conhecida hoje como crítica histórica.

A tendência se manifestou até no jovem Colégio de Battle Creek e na série de artigos de George I. Butler, publicada na Review and Herald de 1884, na qual ele indicou graus de inspiração, um dos suportes do ponto de vista liberal de hoje. Com esta rubrica, os eruditos liberais classificaram os elementos bíblicos segundo a sua própria maneira de julgar. Ellen White respondeu: ‘‘Foi-me mostrado que o Senhor não inspirou os artigos acerca da inspiração, publicados na Review, nem aprovou o endosso deles perante nossa mocidade no colégio. Quando os homens se atrevem a criticar a Palavra de Deus, atrevem-se a pisar em terreno santo, sagrado, e melhor lhes seria temer e tremer e esconder sua sabedoria como loucura. Deus não designou homem algum para proferir juízos sobre Sua Palavra, escolhendo umas coisas como inspiradas e desacreditando outras como não inspiradas.”2

Embora Butler abandonasse seus pontos de vista, a ameaça continuou, obrigando Ellen White a prosseguir publicando artigos sobre a autoridade da Bíblia.

Uma segunda proposta foi a idéia de limitar a autoridade da Bíblia a assuntos religiosos apenas. Isto livraria as declarações históricas e científicas das limitações da inspiração. Em um dos seus mais impressivos e antigos escritos, que apareceu em 1876 com o disfarçado título de ‘‘Biografias Bíblicas”, Ellen White renovou sua defesa da historicidade dos relatos bíblicos, naquela época desafiados por Wellhausen e outros. Escreveu ela: ‘‘As vidas relatadas na Bíblia são histórias autênticas de indivíduos reais. Desde que Adão caiu, através das gerações sucessivas até aos tempos dos apóstolos, temos um claro e sincero computo daquilo que realmente ocorreu e da verdadeira experiência de pessoas reais…. Os escribas de Deus escreveram como lhes foi ditado pelo Espírito Santo, não tendo eles próprios nenhum controle sobre a obra.”3 A última sentença é uma asserção notável que preocupa alguns. Em outro lugar, ela também defende os relatos do Gênesis dos sete dias da Criação e do Dilúvio como literalmente verdadeiros.

Mais recentemente, certos adventistas têm declarado que, sem alguns de seus elementos racionalísticos, a crítica histórica pode ser um instrumento válido no estudo da Bíblia. Este ponto de vista trata a crítica histórica não como um método integrado, mas como uma combinação de elementos dos quais se pode escolher. Por exemplo, considerar o método gramatical histórico, usado pelos adventistas. Esse método funciona também em áreas examinadas pela crítica histórica. Contudo, um exame acurado mostra que os objetivos dos dois sistemas não se coadunam. Reconhecendo os problemas envolvidos, a reunião do Concilio Anual da igreja, celebrada em 1986 no Rio de Janeiro, aprovou uma declaração considerando o método da crítica histórica, como é classicamente defendido, como impróprio para uso pelos adventistas.

Ellen White sobre inspiração e autoridade

á vimos o vibrante endosso de Ellen White à veracidade e autoridade das Escrituras, não só em assuntos religiosos mas também no relato de seus acontecimentos. Contudo, Ellen White não se encontra onde os evangélicos estão. Conquanto afirme a autoridade da Bíblia, reconhece ela nos mais elevados perfis o elemento humano nas Escrituras. Eis o que ela escreveu:

‘“Não acha que deve ter havido algum erro nos copistas ou da parte dos tradutores?’ Tudo isto é provável…. Mesmo todos os erros não causarão dificuldade a uma alma, nem farão tropeçar os pés de alguém.’’4

“Os escritores da Bíblia tiveram de exprimir suas idéias em linguagem humana.”5

“Nem sempre há perfeita ordem ou aparente unidade nas Escrituras.”6

“A Bíblia precisa ser dada na linguagem dos homens. Tudo quanto é humano é imperfeito.”7

“A Bíblia foi escrita por homens inspirados, mas não é a maneira de pensar e exprimir-se de Deus. Esta é da humanidade. Deus, como escritor, não Se acha representado…. Os escritores da Bíblia foram os instrumentos de Deus, não Sua pena.”8

“Não são as palavras da Bíblia que são inspiradas, mas os homens é que o foram. A inspiração não atua nas palavras do homem ou em suas expressões, mas no próprio homem que, sob a influência do Espírito Santo, é possuído de pensamentos.”9

Como podemos conciliar todas estas declarações com a declaração anteriormente citada das “Biografias Bíblicas”? Pela referência ao contexto. Aqui a Sra. White está dando a idéia de que os escritores da Bíblia foram impelidos a dizer toda a verdade sobre os personagens da Bíblia, em lugar de cederem à tentação normal de lisonjear, omitindo os fatos menos louváveis. É neste aspecto que os escritores foram rigorosamente guiados pelo Espírito Santo, não na escolha de palavras específicas.

E o que dizer da confiança de Ellen White nas Escrituras finitas? Continua intocável pelo cepticismo. Enquanto assistia à Conferência Geral de Mineápolis em 1888, escreveu ela: “O Senhor, porém, tem guardado este Santo Livro em sua forma atual mediante o miraculoso poder dEle — uma carta ou guia para a família humana a fim de mostrar-lhe o caminho do Céu.”10

Ellen White aceitava a humanidade da linguagem e os meios de expressão e, contudo, mantinha sua clara, sonora e inabalável confiança na autoridade dessas mesmas Escrituras. Poucos parágrafos depois, ela continua dizendo: “Tomo a Bíblia tal como ela é, como a Palavra Inspirada. Creio nas declarações de uma Bíblia inteira…. Nenhuma mente ou mão se empenhe em criticar a Bíblia.” E de novo: “Irmãos, apegai-vos à Bíblia, tal como ela reza, parai com vossas críticas relativamente a sua validade, e obedecei à Palavra, e nenhum de vós se perderá”.11

Conciliando as tensões

Devido a sua insistência sobre o lado humano das Escrituras inspiradas, como podia ela conciliar sua inabalável confiança na autoridade da Bíblia? Ela emprega dois princípios básicos.

Primeiro, a acomodação. Ela não esperava descobrir o estilo ou a majestade de Deus de uma maneira que exigisse uma Bíblia sem erro. Escreveu ela: “As verdades reveladas são todos “dadas por inspiração de Deus’; embora se-jam expressas em palavras de homens e adaptadas às necessidades humanas. As-sim, é possível dizer do Livro de Deus, o que foi dito de Cristo, que ‘a Palavra Se fez carne”’.29

E de novo: “O Senhor fala aos seres humanos em linguagem imperfeita, a fim de os sentidos degenerados, a percepção pesada, terrena, dos seres da Terra poderem compreender-Lhe as palavras…. Ele vai ao encontro dos caídos seres humanos onde eles se acham.”30 29 31

“As verdades reveladas são todas ‘dadas por inspiração de Deus’; embora sejam expressas em palavras de homens e adaptadas às necessidades humanas”.

Segundo, interrupção do julgamento. “A entrada do pecado no mundo, a encarnação de Cristo, a regeneração, [e] a ressurreição… são mistérios profundos demais para a mente humana…. Mas Deus nos deu nas Escrituras suficiente evidência de seu divino caráter, e não devemos duvidar de Sua Palavra por não sermos capazes de entender todos os mistérios de Sua providência.”32

Devido às nossas limitações de dados e compreensão, Ellen White nos anima a manter nosso conceito até que tenhamos informação suficiente, a agir a partir de uma premissa de fé, certeza e confiança, e a deixar que no devido tempo, e por Seus próprios meios, Deus abra as portas do entendimento. No reino dos Céus, provavelmente nos perguntemos: Por que me preocupei tanto com isto? À explicação do próprio Cristo, tudo se ajustará ao modelo de Sua ordem, plano e Palavra.

  • 1. Ellen White, O Grande Conflito, pág. 601.
  • 2. Ellen White, Mensagens Escolhidas, Livro I,pág.23.
  • 3. Ellen White,Testimonies for the Church,vol.4,pág.9.
  • 4. Ellen White, Mensagens Escolhidas,LivroI,pág.16.
  • 5. Idem, pág. 19.
  • 6. Idem, pág. 20.
  • 7. Ibidem
  • 8. Idem, pág. 21.
  • 9. Ibidem10. Idem, pág. 15.
  • 11. Idem, págs. 17 e 18.
  • 12. Ellen White Testimonies, vol. 5, pág. 747.
  • 13. Ellen White Mensgens Escolhidas, Livro I, pág. 22. 14. Ellen White Testimonies, vol. 5, pág. 699.