Jesus é superior a todos os profetas, anjos e sacerdotes. É Deus conosco

Os primeiros três versículos da epístola escrita aos hebreus constituem uma parte magnífica da introdução de um livro centralizado em Cristo. As sete afirmações do terceiro versículo serão mencionadas rapidamente neste artigo. Os comentários estarão centralizados no conteúdo do primeiro verso e na metade do segundo, cuja mensagem básica é: Deus tem falado através dos tempos; não guarda silêncio. Além de Se revelar nas Escrituras Sagradas, revela o que o homem não pode chegar a conhecer por si mesmo.

Existem duas idéias mais no texto, que são a maneira antiga e a nova maneira da revelação. “Muitas vezes” é a tradução mais comum para o termo grego polímerós utilizado pelo escritor, que acreditamos ser Paulo. Esse termo apresenta a revelação como sendo fragmentária, dada em partes.

A expressão “falou Deus”, ou similares, é utilizada 179 vezes por Moisés no Pentateuco. Por sua vez, Jeremias fez uso de outra expressão: “Assim diz o Senhor”, que aparece 419 vezes em seu livro. Além de “muitas vezes”, o Senhor também falou “de muitas maneiras”. Fala quando acha conveniente; expressa o que deseja comunicar, faz isso através dos Seus escolhidos e do modo como Lhe apraz.

Deus não utiliza apenas uma forma de comunicação, fixa, estereotipada. Algumas vezes apareceu pessoalmente a alguém. Noutras ocasiões, comunicou mensagens através de anjos, de sonhos e visões. Também deu a conhecer Sua vontade por intermédio de Urim e Tumim. Utilizou métodos objetivos, como no caso de Jeremias, e até por meio de músicos e cantores, como ocorreu com os filhos de Asafe, Hemã e Jedutum (I Crôn. 25:1-7). Porém o modo mais comum de revelação acontecia através dos profetas, instrumentos do Espírito, embora em algumas ocasiões tenha revelado Sua vontade a outros indivíduos que não eram necessariamente profetas ou profetizas. E o que essas pessoas comunicavam como porta-vozes do Senhor era considerado “não como palavra de homens e sim como, em verdade é, a palavra de Deus” (I Tess. 2:13).

Abraão foi um homem privilegiado. Ele é o primeiro personagem das Escrituras a respeito de quem se diz: “veio a palavra do Senhor… numa visão” (Gên. 15:1) e é referido como “profeta” (Gên. 20:7). Houve um tempo na história do povo de Deus quando foram mencionados cem profetas contemporâneos. Em II Crônicas, são mencionados nominalmente 20 deles, em 26 referências ao ministério profético autêntico. No Novo Testamento e no livro aos hebreus existem referências a mais de uma dezena de indivíduos capacitados com o dom de profecia.

“Nestes últimos dias” é uma expressão utilizada por Judas, Paulo e Pedro. Poderia referir-se ao tempo anterior à vinda de Cristo, evento que eles esperavam fosse ocorrer em breve. Também poderia significar a época seguinte à da presença do Messias, que inaugurou um novo tempo de revelação e comunicação divinas; a era do reino messiânico, o começo do fim que assinalava a consumação da história do pecado.

Paulo contrasta a maneira fragmentária, parcializada, progressiva e limitada da revelação anterior com a inerrante, dotada de autoridade plena, vista na pessoa do Filho. Como afirmou Lutero, Jesus é essencialmente a Palavra de Deus, única e inerrante.

O profeta

Os escribas da lei, os fariseus legalistas conhecedores das Escrituras, os teólogos da época não O reconheceram como o enviado do Pai. “Veio para o que era Seu e os Seus não O receberam”; “o mundo não O conheceu”, afirma o evangelista (João 1:11 e 10). No entanto, o povo comum, pescadores indoutos, uma mulher de conduta duvidosa, um cego inculto, dois seguidores do Senhor que caminharam com Ele no dia da ressurreição reconheceram a Jesus como um profeta. Houve quem O identificasse como “um grande profeta”. Herodes chegou a pensar que Jesus Cristo era João Batista redivivo, e o povo comentava: “É Elias”; “um profeta”; ou “algum dos profetas”.

Após um dos milagres de multiplicação de alimentos, algumas pessoas afirmaram: “este é verdadeiramente o profeta que havia de vir”. E essa não foi a única vez que Cristo foi identificado como “o profeta” (João 4:19; 6:14; 7:40; 9:17; Luc. 24:19; 7:16; Mar. 6:14 e 15). Um tremendo paradoxo. Aqueles dos quais se esperava uma interpretação correta sobre o enviado de Deus erraram. E o povo comum, de quem se esperava erros de interpretação, estava certo. Jesus era o profeta que haveria de vir, anunciado pelo próprio Deus através de Moisés. É lamentável que não O reconheceram como profeta anunciado pelo Pai.

O tema do livro aos hebreus é Cristo, Sua magnífica pessoa, Seu sacerdócio e mediação. Dessa maneira, Jesus aparece superior a todos os profetas, superior aos anjos. Como sacerdote, supera a todos os que O antecederam, exercendo um sacerdócio mais eficaz e eterno. O santuário no qual ministra, aplicando os méritos de Sua vida e morte, já não é uma sombra, mas a própria realidade. É o templo original e o modelo das miniaturas terrestres.

George McCready Price lembra que o historiador judeu do primeiro século, Flávio Josefo, referiu-se a Daniel como “o maior dos profetas”. Price utilizou essa frase como título de seu livro sobre Daniel (The Greatest of the Prophets). E embora Daniel tenha sido um grande profeta, um “profeta internacional”, não foi o maior. Essa qualificação pertence a Cristo, posto que Ele é a suprema revelação da divindade.

O testemunho do Pai

Moisés fala de uma profecia formulada pelo próprio Deus, na qual é vislumbrada a incomparável originalidade da encarnação da segunda pessoa da divindade, bem como Sua mediação. O povo nos dias de Cristo interpretou corretamente essa profecia. No Sinai houve trovões, relâmpagos, sons estridentes de trombeta, chamas de fogo, fumaça na montanha, nuvens espessas, tremores na terra. Tudo isso causou pânico e espanto entre o povo que tremeu tanto quanto o próprio Sinai. Conseqüentemente, o povo reagiu: “Disseram a Moisés: Fala-nos tu, e te ouviremos; porém não fale Deus conosco, para que não morramos” (Êxo. 20:19). O Senhor aprovou tal atitude: “Falaram bem aquilo que disseram”, e anunciou que levantaria “um profeta do meio de ti, de teus irmãos … a ele ouvirás” (Deut. 18:15-19).

Eruditos judeus referem-se a esse profeta como “o segundo Moisés”. Pedro e Estêvão identificam esse “segundo Moisés” com Jesus Cristo (Atos 3:23; 7:37). Há um contraste entre o Sinai e o monte de onde Jesus falou à multidão, enunciando os princípios do reino anunciado por João Batista, pelos discípulos e por Ele mesmo (Mat. 5-7). O povo aproximou-Se do Deus encarnado, sem barreiras, trovões, relâmpagos, fogo, fumaça, nuvens, e sem temores. Acesso sem restrição. Mais tarde haveriam de injuriá-Lo, açoitá-Lo, desprezá-Lo e crucificá-Lo.

William Graham Scroggie, reconhecido teólogo e pregador inglês, dizia que nascemos para aprender, confiar e obedecer. Para aprender, necessitamos de um mestre. O profeta era um mestre do qual Moisés é um modelo. Para confiar, necessitamos de um amigo. O amigo era o sacerdote mediador e intercessor. Arão cumpriu esse modelo. Para obedecer, necessitamos de um guia, e os reis cumpriam esse papel. Davi é um modelo de rei. O profeta, o sacerdote e o rei eram ungidos com óleo sagrado. Em Cristo, segundo Scroggie, estão conjugados esses três ofícios (Cristo en el Credo, págs. 40-43).

Jesus é o profeta, o sacerdote e o rei por excelência, ungido de Deus. O rei que pode guiar como nenhum outro pode fazê-lo. O sacerdote que pode mediar como ninguém, e o profeta-Mestre que pode ensinar e revelar como nenhum outro. Sobretudo é Deus, segundo o declaram João, Tomé, Paulo, e o próprio Deus, no início da epístola aos hebreus (João 1:1; 5:20; 20:28; Rom. 9:5; Tito 2:13; Col; 2:9; Heb. 1:8).

É maravilhoso que Deus tenha falado. Falou através dos profetas, mas tem-Se pronunciado e revelado muitíssimo melhor por intermédio do Filho, o Verbo divino, o maior dos profetas, a suprema revelação de Deus.

Élbio Pereyra, Pastor jubilado, reside em Bella Vista, Corrientes, Argentina