ZINALDO A. SANTOS

Abrangendo a parte mais baixa do Rio Amazonas, justamente onde ele se encontra com o Oceano Atlântico, a Associação Baixo-Amazonas, ABA, é um território rico de belezas naturais, desafios e inspiração missionária. Contando com uma aguerrida equipe de obreiros voluntários e pastores comprometidos com a Missão Global, o Campo tem quase todos os seus municípios marcados com a presença adventista. Até o final do ano, tudo indica que os últimos dois que faltam serão alcançados. No ano passado, a ABA esteve à frente de todos os outros Campos da Divisão Sul-Americana em número de batismos.

Para fazer conhecidos os desafios, métodos e metas da Associação Baixo- Amazonas, Ministério entrevistou o presidente do Campo, Pastor Moisés Batista de Souza, um paulista de Populina que fez o curso colegial no Instituto Adventista Agro-lndustrial do Amazonas, lAAI. Desejava ser engenheiro agrônomo, mas sentiu-se tocado pelo chamado divino durante um sermão apresentado pelo Pastor Emanuel Saraiva sobre a vocação ministerial. “O título daquele sermão foi ‘O romance do ministério’, e quando foi feito o apelo, fui o primeiro a ir à frente”, ele diz, acrescentando que “o chamado foi irresistível”. Dirigiu-se então ao Educandário Nordestino Adventista, Belém de Maria, PE, onde formou-se em Teologia, em 1983. No ano seguinte casou-se com Elma Matos de Souza, de cuja união nasceram os filhos Elói Miguel, Élio Izael e Élvio Gabriel.

Antes de presidir a ABA, a partir de agosto de 1995, o Pastor Moisés atuou como pastor distrital, evangelista e secretário ministerial do Campo, e também ocupou os mesmos departamentos na União Norte-Brasileira.

Ministério: Poderia dar-nos uma visão da Associação Baixo-Amazonas?

Pastor Moisés Batista de Souza: Associação Baixo-Amazonas, ABA, é constituída pelos Estados do Pará e Amapá, um território de 1.396.618,2 quilômetros quadrados, representando 16,33% do território nacional brasileiro, e uma população de 5.890.308 habitantes nos dois Estados. Temos 655 igrejas organizadas e grupos, e operamos uma rede educacional de 30 escolas, entre as quais o Instituto Adventista Grão-Pará, um dos mais conceituados colégios da capital paraense, e um internato, o

Instituto Adventista Transamazônico Agro-lndustrial, lATAI. Ao todo somam-se sete mil alunos. Também devemos frisar que somos privilegiados por termos em nosso território o Hospital Adventista de Belém, além da sede da União Norte. É bom lembrar também que nosso Campo possui uma diversidade etnográfica das mais interessantes. O Pará e o Amapá têm uma vocação migratória muito grande. São pessoas oriundas de muitas partes do Brasil, especialmente Maranhão, Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, Tocantins, Paraná e Rio Grande do Sul. Nas regiões Sul e Oeste do Pará, concentra-se o maior índice dessa imigração.

Ministério: Com uma geografia peculiar, que dificuldades existem para o atendimento ao Campo, e como são superadas?

Pastor Moisés: Atendemos a nossas congregações através de quatro vias de acesso. Primeiramente, existem rodovias bem pavimentadas em boa parte do Pará. Noutra parte, viajamos em estradas sem asfalto, no meio da selva com tudo o que isso significa de aventura e encontro com animais silvestres. O Pará tem a maior extensão de estradas sem asfalto do país, segundo o próprio Departamento Nacional de Estradas e Rodagens. Há também a via fluvial, um capítulo interessante da nossa experiência, pois vivemos na parte mais aquinhoada daquela que é a maior bacia fluvial do mundo. É uma malha impressionante. Só nas proximidades de Belém, são cerca de duas mil ilhas. As cidades mais antigas foram fundadas às margens dos rios. Em 1928, quando aqui chegou o nosso pioneiro, Pastor Léo Haliwell, logo percebeu que os rios seriam as únicas “estradas” para alcançar a região, e construiu a lancha Luzeiro VI. Continuando esta saga missionária, ainda hoje atendemos algumas igrejas por via fluvial, através de navios, barcos e da Luzeiro VI. Outra parte do território é atendida via aérea. Há lugares que são alcançados após três horas de vôo, e não há outra alternativa. Você pode imaginar os custos elevados.

Ministério: Como vai a ABA na Missão Global?

Pastor Moisés: Gostamos de falar desse assunto. Há três anos, existiam mais de 60 municípios para serem alcançados com a mensagem adventista. Com a graça de Deus, iniciamos este ano faltando alcançar apenas dois municípios. Estamos seguros de que até o final do ano as duas fileiras de mastros com bandeiras representativas dos municípios penetrados, que temos aqui em nossa sede, estarão completas. Daqui para frente, já estamos nos mobilizando para a última etapa da Missão Global, que será, dentro de dois ou três anos, alcançarmos todas as vilas e povoados não evangelizados.

Ministério: Seu Campo foi um dos que mais batizaram, em todo o mundo, no ano passado. Quantos novos membros foram acrescentados à Igreja nesse período?

Pastor Moisés: Por algum tempo, fomos informados de que havíamos sido os campeões mundiais em número de batismos. Depois, a informação foi corrigida, quando todos os relatórios do campo mundial foram completados. Mas as posições da ABA foram a sexta, no mundo, e a primeira na Divisão Sul-Americana. Em 1998, batizamos 9.502 pessoas.

Ministério: Consta que, no início deste ano. uma campanha de Mordomia culminou com a realização de 520 batismos. Como isso funcionou?

Pastor Moisés: Setenta e um pastores do Campo e suas instituições, e da União Norte, foram reunidos em Belém, para a realização de uma campanha metropolitana de Mordomia, liderada pelo Pastor Arnaldo Enríquez, da DSA. Igualmente 71 igrejas receberam o impacto de mensagens sobre o Espírito Santo, durante uma semana. No início da programação, cada pastor foi desafiado a fazer apelos a interessados e visitantes. O sonho era conquistar 500 pessoas. Ao longo da semana, trabalhamos e oramos por isso. Finalmente, o Senhor nos abençoou com os 520 batismos, provando que Mordomia também é evangelismo externo, porque alcança pessoas de fora, e interno, porque leva a igreja a uma experiência mais sólida de reconsagração e fidelidade. Um programa de Mordomia bem feito tem atmosfera de campanha evangelística, e aí não podem faltar conversões.

Ministério: Qual é a estratégia de trabalho do seu Campo?

Pastor Moisés: Não temos uma fórmula estática, algo unilateral de que possamos dizer: este é o método e pronto. Na verdade, temos um conjunto de fatores, que podemos enumerar, até com o risco de deixar algum fora. Procuramos inspirar os pastores, com base no que o Senhor já nos deu e o muito que Ele ainda pode e quer dar. Tentamos criar um clima de confiança, fraternidade, companheirismo e simplicidade no trato com os pastores, levando em conta que todos eles são importantes e possuem talentos específicos, têm grandes contribuições a oferecer e podem melhorar as ideias sugeridas pela administração e pelos departamentais. Também procuramos inspirar a igreja com o sonho de terminar a tarefa, baseado nas promessas de Deus, no momento escatológico em que vivemos, e nas conquistas que o Senhor nos permitiu obter nos últimos anos. Equipamos o exército voluntário com material missionário gratuito – só no primeiro trimestre deste ano, foram distribuídos mais de 40 mil blocos de estudos bíblicos e mais de dez mil Bíblias além de outros materiais. Investimos ainda no treinamento constante de pastores e membros, buscando melhorar o que está dando certo. Realizamos um concilio geral e três regionais por ano. O concilio geral é sempre com os familiares. Nos regionais, acompanhamos e avaliamos o que está sendo feito. Há também os encontros campais, em ilhas, fazendas ou no meio da selva mesmo. Esses encontros são sinônimos de alegria, espiritualidade, confraternização e inspiração para nossos membros e pastores.

Ministério: Os departamentais fazem evangelismo público?

Pastor Moisés: Sim, todos eles. Normalmente cada um realiza uma série de conferências por ano, com duração de até 30 dias. Trabalhamos segundo a mística dos suíços: “um por todos e todos por um.” Isso vale para evangelismo, recrutamento de colportores, congressos de Escola Sabatina, J.A., etc.

Ministério: O presidente faz evangelismo público?

Pastor Moisés: Com imenso prazer. Aliás, realmente, eu não saberia viver neste ministério se não experimentasse, pelo menos uma vez por ano, as emoções de lançar a rede e trazer muitos peixes através do evangelismo público. Isso parece um contágio. Depois de atingir o pastor geral, vira epidemia e alcança pastores e obreiros voluntários. Só lamento dispor de apenas 30 a 35 dias no ano para esse trabalho.

Ministério: Como é possível conciliar as atividades departamentais e administrativas com o evangelismo público?

Pastor Moisés: Posso dizer que, realmente, não é fácil. Mas todos sabemos que as boas coisas nunca chegam de maneira fácil. Sabemos também que tempo e dinheiro são difíceis, mas sempre existem para o que é realmente importante. No meu caso, procuro facilitar, evangelizando lugares que não fiquem mais de 150 quilômetros distantes da Associação. Assim, posso atender no escritório, pela manhã, e dedicar-me ao evangelismo durante a tarde e a noite. Na última cidade em que fiz isso, a 160 quilômetros de Belém, após 32 dias, 72 pessoas foram batizadas, congregadas num templo, num lugar onde até então não havia adventistas. É fascinante, um refrigério para as preocupações burocráticas.

Ministério: Qual o envolvimento das instituições no programa evangelístico do Campo?

Pastor Moisés: Todas as instituições da Baixo-Amazonas, inclusive o Hospital Adventista de Belém, respiram a atmosfera evangelística. O hospital é arrojado nos projetos evangelísticos que realiza, o que pode ser visto nos recursos que destina e nas cidades que alcança, construindo igrejas e ganhando conversos. Salinópolis, Mosqueiro, Santo Antônio e outras, onde não existiam adventistas, são exemplos maravilhosos. No mesmo ritmo evangelístico trabalham as instituições educacionais, cujos líderes e capelães estão sempre presentes aos nossos concílios ministeriais.

Ministério: Em que margem percentual situa-se o problema de apostasias na Associação Baixo-Amazonas?

Pastor Moisés: Sabemos que esse é um problema preocupante. Embora no Céu tenha havido 1/3 de apostasia, com a queda de Lúcifer, e na Terra, 100%, com Adão e Eva, precisamos lutar para diminuir o percentual em nossos dias. Não temos um estudo que nos permita uma exatidão nos dígitos. Por observação, sabemos que as pessoas ganhas através do trabalho pessoal, apostatam menos. Já em conferências públicas, o índice aproxima-se de 50%, o que nos preocupa. Mas quando observamos, após um ano, que uma campanha feita numa cidade sem adventistas deixou ali uma igreja organizada, temos motivos para agradecer.

Ministério: Que planos específicos a ABA coloca em prática para conservação dos milhares que se convertem a cada ano?

Pastor Moisés: Dentro do programa de Missão Global, em todos os lugares recém-penetrados são colocados obreiros bíblicos. Também procuramos envolver os novos conversos em atividades missionárias, em consonância com o pensamento de Ellen White, segundo o qual “é trabalhando pelos outros que manterão vivas suas próprias almas”. O êxito em envolver esses novos adventistas varia de um lugar para outro; estando, possivelmente, ligado a quem lidera o programa em cada lugar.

Ministério: O que está sendo feito para evangelizar as classes tidas como mais sofisticadas da sociedade, em seu território, e com que resultados?

Pastor Moisés: O Hospital Adventista de Belém nos ajuda muito nessa tarefa. Tenho conversado com pessoas da alta esfera política e social em nosso território, especialmente no Pará, que conhecem nossa mensagem por influência dessa instituição de saúde. E tem havido batismos. Além disso, a Rádio Novo Tempo de Belém alcança essa classe de pessoas, notadamente no meio evangélico. Aliás, das emissoras evangélicas de Belém, a Novo Tempo é a considerada mais clássica, com músicas de qualidade finais refinada e mensagens bem apresentadas. Isso segundo o testemunho dessas pessoas. Professores e alunos do Seminário Batista de Belém manifestam a mesma opinião.

Ministério: Administrador e pastor podem se encontrar numa mesma pessoa, ou as duas coisas não se combinam?

Pastor Moisés: Segundo Paulo, pastorear e administrar são dons do Espírito. E sabemos que os dons são dados para atender às necessidades da Igreja e para o seu crescimento. Por isso, creio que seja imprescindível que um administrador tenha, entre outros, essas duas qualidades. Há vários administradores que dão um excelente toque pastoral às suas ações. Eu oro muito a Deus para que possa me encontrar entre estes.

Ministério: Que diferenças existem entre administrar a Igreja e administrar empresas seculares?

Pastor Moisés: Empresas seculares são pragmáticas e buscam resultados preferencialmente imediatos, embora se deixem nortear por alguns princípios que podem ser úteis à Igreja. A história da administração nos fala de diferentes ênfases, ou modismos, na arte de administrar: valorização do cliente, qualidade total, e, ultimamente, valorização do ser humano, sua felicidade, para que produza mais. São bons princípios que devem ser considerados. Mas, como Igreja, também podemos refletir no seguinte; já temos os princípios, os métodos e a certeza do triunfo do nosso empreendimento. Deus já nos deu no passado, dá-nos agora, e lembra que estará conosco no futuro. Que administrador secular enfrentaria as inquietudes do panorama da globalização e dos resfriados econômicos com tal garantia? Pode algum dentre eles dizer que “nada temos a temer quanto ao futuro, a menos que nos esqueçamos a maneira como Deus nos guiou, e os ensinos que nos ministrou no passado”? A principal diferença que eu vejo é a de fontes. As empresas seculares bebem nas fontes acadêmicas e empíricas da arte de administrar. A igreja bebe na fonte da orientação do próprio Deus, e, a partir daí, constrói seus paradigmas administrativos.

Ministério: Que prioridades o senhor estabeleceria para o trabalho e a vida dos seus pastores?

Pastor Moisés: É interessante que, em todos os nossos concílios, nós apresentamos de diferentes maneiras as prioridades da vida pastoral. Concilio vai, concilio vem, e elas são as mesmas, embora às vezes apresentadas numa embalagem diferente: 1) o pastor e seu relacionamento com Deus, 2) o pastor e sua família, e 3) o pastor e seu trabalho.

Ministério: O que é. a seu ver, um pastor de sucesso?

Pastor Moisés: O pastor de êxito é aquele que está em paz com Deus, com a família, com a igreja e consigo mesmo. É aquele que não para de sonhar e, no poder de Deus, usando os dons que recebeu ou venha a receber Dele, realiza muitos desses sonhos. É aquele que não mede seu sucesso em comparação com os outros, mas em comparação consigo mesmo, estabelecendo cada ano novas marcas de conquistas, quer de pessoas convertidas, território conquistado ou crescimento pessoal. Pastor de sucesso é aquele “aprovado, que não tem de que se envergonhar”. Espero ser esse pastor, e que cada ministro adventista também o seja, no poder do Espírito.

Ministério: Quais as maiores ameaças que o senhor vê para a igreja, hoje, e como poderemos enfrentá-las com êxito?

Pastor Moisés: Creio que nossa maior ameaça é o perigo de alterarmos, ainda que minimamente, nossa compreensão de que a Bíblia é autoritativa para nós, e fonte suficiente para aferir todo ensino e experiência. Devemos estudá-la como sempre o fizemos como adventistas do sétimo dia, com oração, considerando o seu contexto histórico. Outra grande ameaça é não apreciarmos devidamente o dom de profecia manifestado entre o Remanescente, através do ministério de Ellen White. Ligado a esses perigos, existe o de não dedicarmos tempo diário para o exame necessário desses escritos. Podemos salvaguardar a Igreja dessas ameaças, como pastores, fazendo um trabalho pessoal e do púlpito, que desperte nossos irmãos para a necessidade de comunhão com Deus através de Sua Palavra. Certamente o pastor é o ponto de partida, lembrando que Lutero, quanto mais problemas enfrentava, mais tempo empregava para o estudo da Bíblia e a oração.

Ministério: Considerando o momento tão solene e crítico da história do mundo, que mensagem o senhor gostaria de dar aos leitores?

Pastor Moisés: Gostaria de dizer que, um dia, a Obra de pregação do evangelho vai terminar. Isso pode ser em nossos dias, e acredito que o será. Homens e mulheres serão usados por Deus para a conclusão da tarefa. É nosso privilégio ser esses homens e mulheres. Podemos sentir que estamos no limite da oportunidade de rompermos com as atrações do mundo e nos comprometermos incondicionalmente com os planos do Salvador. Se o alvo que perseguimos coincidir com o alvo dos Céus, então vivenciaremos muito breve, felizes, a concretização da bendita esperança Maranata.