Certa noite, quando ainda era um seminarista, comentava a respeito de um trabalho rotineiro de classe, com outro colega, quando fui surpreendido com uma pergunta sua: “Será que nossa comunhão com Deus tem sido tão intensa quanto a nossa dedicação aos requisitos escolares?” Confesso que isso me fez refletir bastante.

Hoje, tenho o privilégio de integrar o quadro de obreiros da Igreja de Deus, e, sem esquecer-me daquela noite, continuo fazendo a mesma interrogação, devidamente contextualizada: Será que nossa comunhão com Deus tem sido tão intensa quanto a nossa dedicação às atividades ministeriais? É natural que essa pergunta cause alguma preocupação aos ministros.

É possível alguém pregar uma verdade sem ser santificado por ela? Pode um prega-dor levantar-se diante de uma congregação, falar, por exemplo, sobre o salmo do pastor, sem conhecer o Pastor do salmo? Sim, lamentavelmente, é possível.

Falando sobre a vida devocional do ministro, Ellen White declara: “O poder convertedor de Deus deve sobrevir ao coração dos ministros, ou estes devem procurar outra vocação. … Digo-vos claramente, irmãos, que a menos que os nossos ministros sejam convertidos, nossas igrejas serão doentias e estarão prestes a morrer.” (Testemunhos para Ministros e Obreiros Evangélicos, págs. 142 e 143).

Advertências oportunas

Nessas palavras, pelo menos dois aspectos são evidentes: primeiro, o desempenho da missão pastoral é baseado numa genuína conversão. Segundo, o estado espiritual das igrejas está intimamente relacionado com o conteúdo espiritual do próprio ministro.

De fato, a genuína conversão é uma necessidade primária na vida do pastor. A menção disso nos faz recordar as palavras de Jesus, dirigidas a Pedro: “Tu, pois, quando te converteres, fortalece os teus irmãos.” (Luc. 22:32). Mesmo fazendo parte do privilegiado grupo de discípulos de Jesus, Pedro era um ser humano, sujeito às mesmas tentações às quais estão expostos todos os membros da Igreja. Foi exatamente por negligenciar a comunhão com Deus, que ele, naquela noite de quinta-feira quando o Mestre foi preso, seguindo-O de longe, acovardou-se diante de uma criada, e O negou três vezes (Luc. 22:54-62).

Escrevendo a Timóteo, Paulo advertiu: “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina…” (I Tim.4:16). Está implícito nessa declaração, o fato de que o cuidado de si mesmo precede o cuidado do rebanho. Apesar de todo o preparo intelectual que possui, o ministro jamais deve olvidar a realidade de que é humano, e, como tal, pode tornar-se presa do inimigo. Só a graça de Cristo é suficientemente poderosa para sustentá-lo no cumprimento da missão que lhe foi confiada. Dessa graça ele necessitar depender constantemente. “Sem Mim, nada podeis fazer”, disse Jesus (João 15:5).

Bíblia e oração

No intuito de cumprir cabalmente suas tarefas, muitos ministros passam por alto aspectos importantíssimos para seu crescimento espiritual. Um deles é o estudo da Bíblia. Diz Ellen White, falando de seu tempo: “Foi-me mostrado que da parte dos ministros de todas as nossas associações, há negligência no estudo das Escrituras.” (Idem, pág. 148). A idéia de que um ministro assuma o púlpito de uma congregação, abrindo-lhe a Bíblia, apenas pelo vínculo profissional, é simplesmente inconcebível.

A oração é outro aspecto fundamental na vida de um pastor. O ministério toma-se um deserto árido, sem prática da oração. Sammy Tippit declara que “o primeiro sinal de que um escândalo atingiu o Céu, é a ausência de oração”. (O Fator Oração, pág. 18). Dar-se-á o caso de que na ansiedade para atualizar-nos, através dos grandes tratados teológicos, na pressa para realizar trabalhos administrativos do distrito, e mesmo pastorais, na rotina de preenchimento de relatórios estatísticos, tenhamos escandalizado o Céu, com a ausência de oração em nossa experiência diária?

“O pecado da ausência de oração é a prova para um cristão comum, e mesmo para um ministro, de que a vida de Deus na alma está seriamente enferma e fraca”, acrescenta Tippit.

Cuidado da família

Em seus conselhos ministeriais a Timóteo, Paulo não omitiu o cuidado da família. Disse ele: “Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos de sua casa, tem negado a fé, e é pior do que o descrente.” (I Tim. 5:8).

Antes de procurar desincumbir-se das atividades relacionadas com o distrito, congregações, instituições ou quaisquer outros organismos denominacionais, o ministro tem um rebanho digno de sua atenção prioritária – sua família.

Em virtude da amplitude das atividades nas quais estão envolvidos, muitos obreiros existem que acabam negligenciando a proteção da família. Vivem, até diligentemente, a experiência de procurar salvar outras famílias, ao passo que os seus estão desgarrados como ovelhas sem pastor. “Os deveres do ministro jazem em tomo dele, próximos e distantes. Mas seu primeiro dever é para com seus filhos”, diz Ellen White.

Um dia, poderemos ouvir a pergunta: “Onde está o rebanho que te foi confiado, o teu lindo rebanho?” (Jer. 13:20). Que resposta lhe daremos?

A extensão do distrito, o acúmulo de atividades burocráticas e administrativas; nada há que justifique a colocação da família num plano secundário no programa de um ministro. “Coisa alguma pode desculpar o ministro de negligenciar o círculo interior, pelo mais amplo círculo externo. O bem-estar espiritual de sua família vem em primeiro lugar.” (O Lar Adventista, pág. 353).

É necessário, portanto, que o ministro tenha um programa pessoal de trabalho devidamente equilibrado, e que respeite as devidas prioridades – Deus, família e distrito. Exatamente nessa ordem. Tal equilíbrio é extremamente necessário, porque “…fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes” (I Tim. 4:16).