O autor do livro de Esdras descreve, nos seus primeiros capítulos, a volta do primeiro grupo de exilados em Babilônia para Jerusalém. No capítulo quatro, relata as oposições e dificuldades que surgiram na época da reconstrução do templo de Deus e da cidade de Jerusalém.

Os primeiros cinco versos desse capítulo mencionam o problema enfrentado durante a reconstrução do templo: “Ouvindo os adversários de Judá e Benjamin que os que voltaram do cativeiro edificavam o templo ao Senhor Deus de Israel, chegaram-se a Zorobabel e aos cabeças de famílias e lhes disseram: Deixai-nos edificar convosco, porque, como vós, buscaremos a vosso Deus; como também já Lhe sacrificamos desde os dias de Esar-Hadom, rei da Assíria, que nos fez subir para aqui. Porém, Zorobabel, Jesua e os outros cabeças de famílias lhes responderam: Nada tendes conosco na edificação da casa a nosso Deus; nós mesmos, sozinhos, a edificaremos ao Senhor, Deus de Israel, como nos ordenou Ciro, rei da Pérsia. Então as gentes da terra desanimaram o povo de Judá, inquietando-o no edificar; alugaram contra eles conselheiros para frustrarem o seu plano, todos os dias de Ciro, rei da Pérsia, até ao reinado de Dario, rei da Pérsia.”

Sem dizer como foi solucionado o problema, o autor, em seguida, descreve os fatos que configuravam a oposição à reconstrução da cidade de Jerusalém, concluindo o capítulo com os versos 23 e 24, os quais dizem o seguinte: “Depois de lida a cópia da carta do rei Artaxerxes perante Reum, Sinsai, o escrivão, e seus companheiros, foram eles apressadamente a Jerusalém, aos judeus, e, de mão armada os forçaram a parar com a obra. Cessou, pois, a obra da casa de Deus, a qual estava em Jerusalém; e isso até ao ano segundo do reinado de Dario, rei da Pérsia.”

Esses dois versos parecem dar a impressão de que na ordem de sucessão dos reis da Pérsia, Dario substituiu Artaxerxes. Ademais, fica também a impressão de que as dificuldades enfrentadas na construção do templo e na reedificação da cidade foram simultâneas. E a paralização da obra da casa de Deus é a conseqüência direta da ameaça contra a reconstrução da cidade.

Os capítulos cinco e seis descrevem como foram superadas as dificuldades durante a reconstrução do templo. Em 6:15, lê-se: “Acabou-se esta casa no dia do terceiro mês de adar, no sexto ano do reinado do rei Dario.” E, mais adiante, a partir do capítulo sete, é relatada a solução do problema da construção da cidade e restauração do governo civil em Jerusalém, através do importante decreto do rei Artaxerxes, no sétimo ano de seu reinado.

Sucessão e problemas

Para sairmos da aparente confusão, é necessário que conheçamos a sucessão dos reis da Pérsia – Ciro, Cambises, Dario I, Xerxes (Assuero), Artaxerxes -, e façamos uma análise dos acontecimentos relacionados com a construção do templo e da cidade de Jerusalém.

Os problemas relacionados com a construção do templo (Esd. 4:1 a 5; 4:24 a 6:22) surgiram já nos dias do rei Ciro e agravaram-se com o passar do tempo, culminando com a cessação da obra até o segundo ano de Dario (Esd. 4:5 e 24). Animados pelos profetas Ageu e Zacarias, os judeus reiniciaram os trabalhos de construção (Esd. 5). Promulgado o decreto do rei Dario, favorecendo a obra da casa de Deus, esta foi completada no sexto ano desse rei (Esd. 6).

Por sua vez, as dificuldades atinentes à restauração da cidade (Esd. 4:6 a 23) apareceram no princípio do reinado de Assuero (Xerxes) e continuaram até os primeiros dias do reinado de Artaxerxes (Esd. 4:6, 7 e 23). Mais tarde, no reinado do mesmo rei, elas foram resolvidas oficialmente (Esd. 7).

Caminhos para compreensão

Se o propósito do autor do livro foi apresentar as duas questões juntas, e suas respectivas soluções posteriormente, o que se diz no verso 24 do capítulo quatro poderia estar escrito logo em seguida ao verso cinco; então a aparente confusão estaria evitada.

Com isso, não é nosso objetivo criticar ou alterar a mensagem bíblica, inspirada por Deus. No entanto, não somos impedidos de pesquisar diligentemente. Além de tudo, a divisão de capítulos e versículos é obra de estudiosos e eruditos. Há, na Bíblia, outros casos semelhantes.

Assim, poderiamos sugerir uma ordem para a leitura das porções escriturísticas que estamos considerando. Por exemplo, após a leitura de Esdras 4:1 a 5, adicionamos o verso 24. Retornamos então aos versos cinco e seis e continuamos até o verso 23.

Lendo os capítulos cinco e seis, encontramos a solução para o primeiro problema; e, a partir do capítulo sete, a solução do segundo problema.

Uma outra sugestão seria determinar o fim de um capítulo e o início do seguinte. Vejamos: Lemos o capítulo quatro de Esdras, até o verso cinco. Nessa altura, verificamos como surgiu a oposição aos trabalhos de reconstrução do templo, prosseguindo até o versículo 23, colocando aqui um ponto final no capítulo. Como vimos, anteriormente, nesse ponto está relatado o surgimento das dificuldades relativas à reconstrução da cidade de Jerusalém.

Nesta altura, podemos interrogar-nos: Como foram solucionados os graves problemas dos exilados israelitas que voltaram do cativeiro? A resposta está na leitura subseqüente.

Façamos, então, que o versículo 24 do capítulo quatro seja o primeiro verso do capítulo cinco. O escritor do livro, ao relatar a solução do primeiro problema, como introdução, faz-nos lembrar de que a construção do templo estava paralizada até o segundo ano do reinado de Dario, rei da Pérsia. Desse ponto até o fim do capítulo seis, há um relato sobre como esses trabalhos foram retomados e concluídos.

E a partir do capítulo sete, encontramos a solução do segundo problema. Esdras recebe do rei Artaxerxes, no sétimo ano do seu reinado, um importante decreto, dando-lhe autoridade civil e religiosa (Esd. 7:25 e 26), e inicia a restauração da cidade de Jerusalém. Porém, a solução completa e triunfante está narrada no livro de Neemias.

Desse modo, eliminamos qualquer suposta confusão existente sobre este assunto.