A esposa olhou para seu esposo pastor, depois de quase 30 anos de casamento, e disse: “Querido, nestes trinta anos de vida juntos, jamais guardei um segredo para você, mas agora quero lhe pedir um favor. Se um dia, em algum canto da casa, você encontrar uma caixa amarrada com uma fita vermelha, não abra. É o único segredo que eu gostaria que você respeitasse.

O marido prometeu que respeitaria o segredo, mas, quando a esposa saiu, ele começou a procurar por toda a casa e, finalmente, achou a misteriosa caixa. Foram momentos de luta e indecisão, entre abrir e não abrir, mas lamentavelmente acabou derrotado pela curiosidade. Abriu a caixa. O que viu dentro dela aumentou mais ainda sua perplexidade. Ali estavam três ovos e dois mil reais em dinheiro.

Ao chegar a noite, não podendo mais entender a razão do conteúdo da caixa, pro-curou a esposa, confessou seu delito e foi perdoado por ela. Já aliviado pelo perdão, perguntou-lhe: “Por que tanto mistério? O que significam esses ovos e o dinheiro?”

“Bem, querido”, respondeu a esposa, “eu gostaria de guardar esse segredo comigo, mas já que você abriu a caixa, preciso mesmo desvendá-lo. No dia em que nos casamos, disse a mim mesma que guardaria um ovo nessa caixa, para cada sermão fraco que você pregasse.” O pastor ficou muito feliz com a descoberta. Na caixa só havia três ovos; e ele tinha quase 30 anos de ministério. Era uma média razoável. “E o dinheiro, o que significa?”, perguntou ansioso. “Cada vez que eu ajunto uma dúzia de ovos, vendo-os e guardo o dinheiro aí”, a esposa respondeu.

Isso pode ser engraçado, mas talvez se-ja a realidade de muitos pregadores.

Ser total

A verdade é que nenhum pregador deseja pregar um sermão fraco. Talvez por isso, nos empenhamos muito em pesquisar, construir um fundamento sólido para o sermão e apelar todo o tempo ao intelecto dos ouvintes, esquecendo-nos muitas vezes da emoção.

Com alguma freqüência, ouvimos entre os pregadores a seguinte argumentação: “Eu sou um pregador racional. Não gosto de tocar as emoções, porque acho que levar as pessoas a tomarem decisões com base nas emoções, é a mesma coisa que construir uma casa sobre a areia.” Mas até que ponto esse raciocínio é cor-reto? Será mesmo que existe algo como pregação racional e emocional? Em caso afirmativo, qual delas é mais efetiva? É possível achar lugar para a emoção, numa pregação racional e lógica?

O primeiro passo para entender qual é o papel da emoção na pregação é buscar compreender a natureza humana. O homem é uma pessoa Vivente, com capacidades físicas, mentais e emocionais. Nenhum desses aspectos atua separadamente do outro. Os três encontram-se estritamente interligados, formando uma unidade indivisível. Esse é um fato que não pode ser questionado. Todos os feitos do homem são concretizados na sua unidade. No mo-mento em que escrevo este artigo, por exemplo, onde estão minhas faculdades físicas? Tenho na mão uma caneta, meus olhos estão acompanhando o texto que está brotando: aqui estou sentado, sentindo o vento entrar pela janela. E minhas faculdades mentais? Igualmente estão aqui elaborando os pensamentos e dando à minha mão ordem para escrever. O que acontece com minhas faculdades emocionais? Estão aqui presentes, colocando calor e entusiasmo na redação da matéria.

Poderia minha mão escrever, enquanto minha mente estivesse ocupada com outros problemas, e minhas emoções estivessem descansando para entrar em ação à noite, no momento de apresentar a mensagem? Não. O ser humano é uma unidade indivisível. E sempre que alguém tenta dividir essa unidade, somente tem conseguido criar problemas para si e para outras pessoas.

Analisemos, por exemplo, uma pessoa que senta à mesa para tomar a refeição, e, enquanto sua boca mastiga e seu aparelho digestivo trabalha, ela sofre com a lembrança de algum problema que tem de ser resolvido durante o dia. Seu corpo está presente, mas não sua mente nem seu coração. O resultado será que logo começará a sentir dores no estômago, irá ao médico que dará o diagnóstico de uma úlcera. É sempre assim. Do contrário, estaríamos indo contra a natureza humana. O ser humano é uma cabeça, um coração e um corpo, indivisivelmente unidos.

Intelecto e sentimento

Portanto, se você, como pregador, quer alcançar o ser humano em sua totalidade, deve alcançá-lo racional, emotiva e fisicamente. Caso se considere um pregador apenas racional, existe a possibilidade de ser incompleto. Afinal as pessoas para quem você prega não possuem apenas faculdades mentais. Você não fala a computadores programados simplesmente para pensar. Fala a seres humanos que, além de possuir faculdades mentais e físicas, têm emoções que estão presentes sempre, até nas coisas e situações mais corriqueiras da vida.

Volto a usar uma ilustração esportiva. Uma partida do campeonato mundial de futebol tem o Brasil como um dos competidores. Faltam cinco minutos para o final e o placar não foi movimentado. De repente, numa jogada genial, um atleta brasileiro escapa e faz o gol. Você está diante do aparelho de TV, assistindo ao jogo. Sua razão lhe diz que se a bola ultrapassou a linha sob a trave, entrou, é gol. Como reage? Sorri levemente e afirma que é gol, ou deixa a emoção explodir, gritando gol? Percebe a diferença? Se em algo tão simples e corriqueiro, não é possível separar as faculdades mentais, emocionais e físicas do ser humano, como pode alguém atrever-se a fazê-lo na pregação, que é tão solene e de conseqüências eternas?

Jamais devemos nos esquecer de que a pregação é a bendita arte de persuadir, fazer com que as pessoas sintam o desejo de tomar decisões. Persuadir não é obrigar, nem forçar, muito menos apenas expor. O homem faz algo porque sua mente compreende que deve fazer, e porque seu coração sente que quer fazer. Não existe persuasão sem alcançar o ser humano em suas três dimensões.

A ordem dos fatores

Mas existe um processo a ser seguido no desejo de ser bem-sucedido na bendita arte de alcançar o homem em sua unidade completa. Primeiro, é preciso trabalhar com a razão. Jamais comece com as emoções, porque elas são como a poeira no fundo de um balde com água. Se forem agitadas, levará algum tempo para que voltem a ficar assentadas. A razão não pode compreender muita coisa quando as emoções estão agitadas. Portanto, comece o sermão mostrando de maneira lógica que 1+2 = 3. Mostre o fundamento bíblico e racional de sua mensagem. Indutiva ou dedutivamente leve seus ouvintes ao entendimento racional da verdade.

A razão é como o fundamento de um prédio. Ela ajudará as pessoas na com-preensão de que Jesus Cristo está ao seu lado, mesmo nos momentos em que sentem que estão abandonadas. A ordem do Mestre não se limita a pregar, mas também envolve ensinar. Cada sermão deve ser uma aula. Anselmo dizia que a teologia é “a fé procurando entender”. Se isso é ver-dade, então cada pregador, de alguma forma, deve ser um teólogo. Não é suficiente apresentar as promessas divinas; é preciso dar o fundamento de tais promessas.

No entanto, explicar a verdade lógica e ficar somente nisso, é um grande erro. É preciso dar um segundo passo. Depois de ter a certeza de que os ouvintes entenderam a mensagem, mostre de que maneira ela funciona na vida diária. Em outras palavras, toque as emoções, faça com que os ouvintes sintam a mensagem. De que for-

Pregação é a bendita arte de persuadir o ser humano em suas três dimensões.

ma? Contando uma história triste para fazê-los chorar? Não. Despertar a emoção das pessoas usando relatos tristes é a mesma coisa como arrancar lágrimas espetando-as com um alfinete.

A melhor maneira de tocar as emoções é relacionar a verdade apresentada com as necessidades humanas. Como sabemos, todos os seres humanos têm necessidades que precisam ser satisfeitas. As pessoas vão à igreja esperando soluções divinas para suas tristezas, dificuldades e lutas, e o pregador tem a oportunidade de apresentar a verdade racional, mostrando como Deus, através dessas verdades, está preocupado em ajudar Seus filhos a serem felizes.

Não tenha medo de tocar as emoções. Com freqüência, a falta de emoção numa pessoa é a falta de entrega e dedicação ao que está fazendo. Só os mortos não têm emoções. Ellen White dá o seguinte conselho: “O alvo da pregação não é apenas prestar informação, nem meramente convencer o intelecto. A pregação da Palavra deve apelar ao intelecto e comunicar conhecimento; deve ela porém fazer mais do que isto. As palavras do ministro devem alcançar o coração dos ouvintes.” (Testemunhos para Ministros, pág. 62).

O grande problema é que, desde a nossa infância, estamos ouvindo dizer que “homem que é homem não chora”. Então crescemos escondendo as nossas emoções, para não correr o risco de sermos confundidos com indivíduos frágeis. Mas quem poderia considerar Jesus um homem fraco, quando, antes da entrada em Jerusalém, chorou por causa da rebeldia de Seu povo? Aquelas lágrimas eram de fraqueza, ou eram lágrimas de um ser plenamente racional, que colocava vida e emoção naquilo que fazia? Em certa ocasião, Paulo escreveu “com lágrimas”. Po-de você imaginar o destemido apóstolo como um homem fraco somente porque apresentou sua mensagem lógica, carregada de emoção?

Mas o pregador precisa saber controlar suas emoções no púlpito. Não é nada agradável ver um pregador chorando descontrolado, enquanto prega. O público pode sentir a emoção de sua voz, pode até ver o brilho de seus olhos, ao ouvi-lo falar de assuntos de vida ou morte. Mas nunca deveria vê-lo desmanchar-se em lágrimas, lá na frente.

A reação

Ao longo de meu ministério, tenho visto muitas pessoas lutarem para entregar a vida a Cristo. Às vezes, a verdade lógica já foi apresentada; elas entenderam racionalmente que o caminho delineado por Jesus é o melhor para o ser humano. Sabem que o convite é de graça e que Jesus está com os braços abertos, esperando-as. Sabem que a vida passada lhes trouxe somente amargura, culpa e desespero. Entendem tudo, mas não sentem.

É então que começo a relacionar a ver-dade bíblica com as necessidades que elas possuem. Começo a descrever de maneira dramática essas necessidades, e as vejo inquietas, agitadas e nervosas no auditório. Algumas vezes, até vejo um lenço enxugando discretamente uma lágrima. Nesse momento, sei que a verdade lógica está começando a cobrar vida. Sei que elas estão sentindo vontade de aceitar uma verdade que seu intelecto já tinha compreendido, mas com a qual seu coração ainda não se havia comprometido.

Depois, quando faço o apelo, vejo essas pessoas se levantando e vindo à frente. São pessoas maravilhosas, que viveram durante anos na escuridão da vida. Sofreram, machucaram-se a si mesmas e aos seus queridos. Tentaram ser felizes à sua maneira e saíram ainda mais feridas. Mas um dia assistiram a uma reunião evangelística onde foram vistas, não como computadores programados somente para pensar, mas como seres humanos que tinham também sentimentos e emoções. E o Espírito de Deus usou o pregador para alcançá-las em sua totalidade: mente, coração e corpo.

Há mais uma coisa: existem ocasiões quando o Espírito Santo usa outros recursos além da palavra falada. Há cantinhos do coração humano onde somente a palavra cantada pode alcançar. A música é a linguagem celestial. Não há coração que permaneça indiferente diante da mensagem cantada. Ela possui a capacidade de chegar aos recônditos mais difíceis, aparentemente inalcançáveis, do coração humano. Mais de uma vez, tenho observado em meus sermões pessoas que, durante toda a pregação, estiveram atentas à mensagem, entenderam a verdade lógica e racional, mas, permaneceram indiferentes ao apelo, mesmo tendo eu relacionado a ver-dade intelectual com as emoções. De repente, porém, quando a música do apelo é cantada, posso ver a maneira poderosa co-mo o Espírito Santo usa a vida e o minis-tério de uma pessoa dedicada à música, na resposta dos ouvintes.

Algumas pessoas me perguntam por que prefiro quase sempre cantores com vozes graves nos apelos. Contralto, entre as mulheres: barítono e baixo, entre os homens. Sopranos e tenores são vozes maravilhosas. É admirável ouvir um hino que alcança notas elevadíssimas. Desperta admiração. As vozes graves, ao contrário, quase não despertam admiração, mas têm a capacidade de penetrar fundo no coração e levar o ouvinte a uma atitude de meditação.

Para terminar, uma pergunta: Usar a emoção durante a pregação é mesmo construir sobre a areia? Depende. Se for alterada a correta ordem intelecto-emoção, o método pode ser fatal. Lembre-se: primeiro deve ser apresentada a verdade lógica, apelando à razão. Depois, o pregador deve descer ao coração e tocar as emoções. Assim mesmo, a pregação ainda estará incompleta se não comprometer o aspecto físico das pessoas com a mensagem.

Às vezes, encontro algumas pessoas, seis ou oito anos depois que elas se levantaram e atenderam ao apelo feito após um sermão. Outras vezes recebo cartas emocionadas, muitos anos depois de ser tomada a decisão de seguir a Cristo Jesus. É admirável comprovar como a fé dessas pessoas cresceu, amadureceu e produziu frutos. Eis um exemplo:

“Minha vida estava como um vaso quebrado”, escreveu Rosalina. “Meus sonhos tinham-se desvanecido, um a um; meu casamento tinha acabado, e eu havia sido demitida do emprego ao qual dediquei 13 anos de minha vida. Estava deprimida e quase não tinha forças para andar, quando o ouvi pregar. Então, aprendi que não estava só, senti que devia entregar minha vida a Jesus, e o fiz. Hoje estou saudável nova-mente, arranjei um bom emprego e aguardo em Jesus um plano para reconstruir um lar, inteiro, sem rachaduras.”

Quando recebo cartas como essa, sinto que vale a pena ser um pastor e pregador. Compensa dedicar muitas horas ao estudo da Palavra de Deus e transmiti-la com equilíbrio, tentando alcançar o ser humano em sua unidade completa e indivisível.