Eu havia acabado de pregar para 20 mil pessoas na praça da apoteose, no sambódromo do Rio de Janeiro. Ao chegar ao hotel, tirei dos bolsos as cartas e os bilhetes que algumas pessoas me entregaram, como acontece sempre em reuniões desse tipo. Um dos bilhetes marcou profundamente a minha vida. Seu autor dizia: “Esta noite, eu ia acabar com minha vida, porque descobri há 15 dias que estou com Aids. Fui ouvi-lo pregar, esperando um milagre; e, pela graça de Deus, aconteceu. Não fui curado, mas algo ocorreu em meu coração, porque não tenho mais medo da morte. O senhor descreveu minha vida, até a roupa que eu vestia. Depois disse: Aconteça o que acontecer, você nunca mais estará só, se entregar hoje seu coração a Jesus.’”
Ajoelhado, naquele momento, disse a Cristo em oração: “Senhor, não sei se preguei um grande sermão, mas sei que de alguma maneira usaste este sermão para encontrar uma vida desfeita e transformá-la.”
Eficiência ou grandeza
Todos nós, pregadores, queremos ser usados por Deus: queremos pregar eficientemente e sentir que o sermão fez bem às pessoas. O problema é que, às vezes, confundimos eficiência com grandeza. Uma coisa é ser um pregador eficiente: e outra coisa é ser um grande pregador. Fomos chamados para ser pregadores eficientes. A grandeza é uma prerrogativa divina. Quando o pregador procura grandeza, corre o perigo de cair no terreno do orgulho, da autopromoção ou da auto-afirmação, e nada pode ser mais fatal do que isso para a eficiência da pregação. Essa eficiência, por sua vez, encontra-se no resultado verificado na vida das pessoas. Você não é eficiente quando sente que é um grande pregador, mas quando o propósito divino para a vida das pessoas se torna realidade.
Uma pregação eficiente, portanto, é uma pregação que transforma. Mas, o que fazer para que a nossa mensagem transforme vidas? Como pregar de modo que as pessoas sintam que foram beneficiadas pela pregação? Para atingir o coração das pessoas e deixar que o Espírito Santo as transforme, é pre-ciso entender, em primeiro lugar, que todo mundo vai a algum lugar em busca de algum benefício. Essa é uma lei da vida. Quando alguém entra numa loja de sapatos, por exemplo, não quer saber qual é o processo da fabricação do couro. Deseja simplesmente conseguir o melhor sapato, ao menor preço.
O problema que nós enfrentamos, co-mo pregadores, é que, às vezes, estamos mais preocupados com o nosso sermão do que com as pessoas. Nossos sermões podem ser obras mestras de homilética, mas se não responderem às inquietudes íntimas do coração humano, não passarão de uma teoria maravilhosa, mas que não produz efeito transformador de vidas.
Se alguém vai a uma padaria comprar pão e lhe dão pedra, com certeza, jamais voltará àquele lugar. Isso prova que as pessoas vão a qualquer lugar, inclusive para a igreja, porque esperam encontrar ali algo que lhes traga benefícios.
Observe, por exemplo, quando uma loja anuncia pela televisão que no dia seguinte estará fechada, na parte da manhã, mas que abrirá ao meio-dia com ofertas incríveis. Geralmente, formam-se enormes filas de pessoas esperando a abertura do estabelecimento, porque ali existe algo que lhes interessa muito. Os proprietários da loja souberam despertar o interesse, mostrando as vantagens dos descontos “fabulosos” que as pessoas terão apenas naquele dia.
Necessidades do povo
“De uma maneira ou de outra, toda empresa que lida com o público começa suas atividades a partir das necessidades do povo. Só os pregadores agem supondo que as pessoas vão à igreja ansiosas por descobrirem o que aconteceu com os amorreus”, afirma Harry Fosdick.
Quando Jesus andou na Terra, preocupou-Se pelas necessidades do povo e dirigiu-Se a cada pessoa, tocando o ponto nevrálgico da sua vida. A Zaqueu, um homem rejeitado e desprezado por todos, mostrou os braços abertos da aceitação e do perdão. À mulher samaritana, vazia e sedenta no coração, ofereceu água que realmente satisfaz. Ele nunca falava para o ar. Tocava nas necessidades específicas do ser humano. Por isso, multidões O seguiam aonde quer que Ele fosse e eram transformadas por Sua pregação.
Multidões assim, carentes, continuam vivas ainda hoje. Estão sentadas todos os dias de culto em nossas igrejas. São formadas de pessoas vazias, desesperadas, angustiadas, aflitas, sentindo-se solitárias, rejeitadas, traídas e injustiçadas. Pessoas que choram em silêncio, tentando esconder a dor íntima. Sorriem, fingem que tudo está bem, mas o coração está dolorido; não sabem mais para onde ir, não têm mais forças para resistir e, no sábado, no domingo ou na quarta-feira, vão à igreja esperançosas de que Deus tenha alguma resposta para as inquietudes de seu coração, através do pregador.
Na próxima vez, quando você se levantar para pregar, lembre-se de que ali, entre as 30, 50, 100, 200 ou 300 pessoas diante de você existe igual número de pequenos universos. Cada pessoa tem suas próprias lutas, sonhos e dificuldades. Ali estará, por exemplo, uma garota de 14 anos que foi abandonada durante a semana pelo namorado. Seus pais estão felizes, porque não concordavam com aquele relacionamento, mas a garota está sofrendo por dentro, pensando que a vida não tem mais sentido, cor ou alegria. Todos a contemplam sentada no banco da igreja, mas ninguém compreende o vulcão de tristeza que está prestes a explodir em seu coração. Ela se sente sozinha, incompreendida pelos pais, traída pelo namorado, injustiçada pela vida. E Deus tem um instrumento – você – para dizer àquela menina: “Filha, você não está sozinha. Eu estou aqui com você, embora não possa Me ver ou Me tocar.”
E aquela garota não será a única pessoa magoada na congregação. Ali também haverá alguém que traiu a esposa e levou uma mulher estranha para um motel. Veio à igreja, sim, mas está perturbado pela voz insistente da consciência. Não tem paz, não conseguiu dormir, sente-se imundo e perdido. No fundo do coração, pergunta: “Há perdão para mim?” E você é o instrumento que Deus tem para dizer àquele homem: “Sim, existe bálsamo em Gileade.”
Da próxima vez que você se levantar para pregar, pense no pai de família desempregado que sofrerá uma ação de despejo se não pagar o aluguel atrasado. Lembre-se da mãe aflita, que luta para manter os filhos na igreja contra a vontade do marido incrédulo. Não se esqueça do jovem que foi mal no exame vestibular e está desanimado. Enfim, lembre-se de que você prega para seres humanos que estão buscando solução para seus problemas.
Pensando nas pessoas
Minha pergunta é a seguinte: Na sexta-feira à noite, quando você dá os últimos retoques no sermão, verifica o título, as ilustrações e as frases de impacto, lembra-se das pessoas? O que você terá para dizer a cada uma delas? Uma coisa é dizer: “Irmãos, aqui o Senhor afirma que Ele nos ama e nunca nos abandonará”; e outra coisa é dizer: “Está você sentindo-se sozinha e traída porque o namorado a abandonou? Está você angustiado porque não sabe onde conseguir o dinheiro para o aluguel? Porventura há alguém aqui que falhou com Jesus e entrou num lugar imundo, onde um filho de Deus nunca deveria entrar? O fogo da consciência culpada está queimando o seu coração e deixando-o sem paz? Quero lhe dizer, em nome do Senhor, o que a Escritura afirma nesta manhã: você não está só. As lágrimas de tristeza podem impedir-lhe de ver a Cristo, o grito da consciência pode estar dizendo que você se encontra perdido, sem perdão, mas a Palavra de Deus garante que Ele não o abandonou. Ele compreende sua dor. Quando você deita na cama e sente que não existe saída, acredite, Jesus está perto de você pronto a ajudá-lo e dar-lhe poder para viver uma vida vitoriosa.”
No momento em que deixarmos de generalizar as coisas e começarmos a particularizar a aplicação da mensagem, veremos que a menina distraída, porque estava pensando na traição do namorado, abrirá os olhos e passará a prestar atenção ao sermão. O mesmo acontecerá com as outras pessoas. E, quando o culto acabar, certamente ninguém dirá apenas que aquele foi um sermão extraordinário. As pessoas apertarão nossas mãos, silenciosas, e veremos o brilho da alegria, da gratidão e da esperança em seus olhos. São pessoas que entraram destroça-das na igreja, e voltam para casa reconstituí-das pelo poder divino, através da pregação.
Hoje, os mestres da homilética falam de “pregação experiencial, encarnacional, terapêutica, bipolar ou bifocal”. Todos esses termos se referem apenas ao estilo de pregação que se fundamenta na Bíblia, mas que tem como propósito mostrar a solução divina para os problemas humanos. Halford E. Luccock, em seu trabalho intitulado Ministers Workshop, pág. 51, comentando sobre a construção de um sermão, diz o seguinte: “Comece com um assunto da vida, um problema real, pessoal ou social e jogue sobre ele toda a luz de Cristo, de modo que as pessoas saiam da igreja dispostas a enfrentar os problemas em nome de Jesus.” Em outras palavras, que elas retornem para casa reanimadas e transformadas.
Talvez as pessoas durmam durante a pregação porque estamos pregando sobre assuntos que achamos ser do seu interesse, mas, na realidade só interessam a nós mesmos.
Imaginemos 50 pessoas assistindo a um jogo de futebol. No campo estão as seleções do Brasil e da Argentina, enfrentando-se numa final do campeonato mundial. Faltam cinco minutos para o encerramento e o placar continua 0x0. Você acha que alguém vai cochilar? Agora, imaginemos outro jogo, entre o Madureira, do Rio de Janeiro, e Picos, do Piauí. Quem tem disposição para assistir a uma partida dessa, além dos fanáticos torcedores dos dois times?
Precisamos aprender a pregar sobre coisas que interessam ao povo, e não sobre coisas que interessam apenas a nós. Possivelmente você goste de chocolate, mas acho que não seria tão ingênuo a ponto de colocar chocolate como isca no anzol, porque o peixe gosta de minhoca e não de chocolate. E quando prega, você usa chocolate ou minhoca?
Contextualização da mensagem
A essa altura, é possível que alguns leitores sejam tentados a fazer uma observação: Pastor, quer dizer que para ser um pregador de êxito devo pregar somente o que o ser humano deseja ouvir, e não o que ele precisa ouvir?
Evidentemente, não. A Palavra de Deus é soberana e útil “para ensinar, para repreender, para corrigir e para instruir em justiça” (II Tim. 3:16). Mas a lei da mente é que as pessoas só ouvem aquilo que lhes interessa, e o pregador precisa apresentar os princípios eternos do evangelho, contextualizados, de modo que o povo queira ouvir.
Quando meus filhos eram pequenos, havia um que não gostava de vegetais. Era uma dificuldade fazer com que ele os comesse: mas uma das coisas de que mais gostava era assistir aos jogos de basquete da NBA. Um dia, perguntamos para ele: “Você quer crescer e jogar basquete como Michael Jordan?” A resposta foi “sim”. Então argumentamos: “Pois é, filho, ele comia vegetais quando era criança. Não há outra forma de crescer forte sem comer vegetais.” Aquela foi a solução. O garoto queria crescer e passou a comer vegetais. Se, como pais, eu e minha esposa falássemos para ele sobre a composição química dos vegetais, das vitaminas e outros elementos nutritivos neles existentes, com certeza, nada conseguiriamos. Mas, sabíamos do seu interesse em crescer. Ele sentia a necessidade de crescer, não havia maneira de continuar pequeno e se tornar um “cestinha”. Crescer tinha se tornado para ele uma necessidade; e quando a relacionamos com o hábito de alimentar-se com vegetais, imediatamente o garoto abriu a mente, o coração e a boca para eles.
O pregador precisa contextualizar os eternos princípios do evangelho para atrair a atenção do povo.
É um exemplo simples, mas evidencia o erro que às vezes cometemos como pregadores. Gastamos minutos preciosos analisando o texto teologicamente, apresentamos a doutrina sólida, fundamentada na Bíblia, e aí paramos. Deixamos de mostrar como essa verdade teologicamente correta pode ajudar as pessoas a resolverem os problemas que enfrentam diariamente. Noutras palavras, aquela verdade não lhes diz muita coisa diante das dificuldades que encontram. Pensemos num médico lendo um tratado de gastroenterologia para um paciente que está se contorcendo de dores estomacais. O que deseja o paciente: entender como funciona o processo digestivo, ou que a dor seja estancada?
Problemas básicos
Talvez alguns ainda se perguntem: “Como fazer para falar dos problemas de uma congregação inteira num período de 45 minutos?” Embora existam dificuldades específicas, há cinco necessidades básicas e universais que todo ser humano carrega no coração. Ao falar delas, estaremos tocando o coração de qualquer pessoa, quer esteja na China ou no México, seja rico ou pobre, jovem ou velho. Essas necessidades são as seguintes:
Solidão. Todos os seres humanos se sentem sós, alguma vez. Há pessoas que se sentem usadas, traídas, rejeitadas. Têm parentes e amigos, trabalham cercadas de outras pessoas, mas estão sozinhas e o coração dói. Assim, cada vez que mencionarmos a solidão, podemos estar seguros de que de uma forma ou de outra, estaremos tocando os corações.
Problemas financeiros. São problemas comuns a todas as pessoas, ricas ou pobres. O problema financeiro do pobre é que não tem dinheiro para pagar suas contas. O problema financeiro do rico é que não pode dormir pensando na queda da bolsa ou na desvalorização do dólar.
Problemas familiares. Não se trata apenas da esposa e dos filhos. Todos possuem pais, irmãos, primos, sobrinhos e netos com os quais se preocupam, de certa forma. O que fazer com a mãe enferma, que está distante, quando não se tem tempo nem dinheiro para visitá-la? Como ajudar o filho da irmã, que está afundando nas drogas? A família é uma das coisas sagradas que uma pessoa tem. Falemos sobre algo relacionado com ela e estaremos atendendo a uma necessidade básica.
Medo do futuro. Houve um tempo quando eu pensava que somente os idosos tinham medo do futuro, mas um dia, voltando de um cemitério, após o funeral de um amigo, um dos meus garotos me abraçou forte e disse: “Você não vai morrer, não?” Perguntei-lhe: “Por que, filho?” Com a voz embargada, o menino indagou: “Se você morrer, quem vai tomar conta de mim?” E ele tinha apenas sete anos; mas o futuro lhe causava temor. É uma necessidade comum a todos.
Culpa. Após o pecado, o ser humano vem ao mundo com aquilo a que os sociólogos modernos chamam de culpa existencial. Quer dizer, o indivíduo sente-se culpado e nem sequer sabe o porquê. É uma sensação esquisita de vazio; e, naturalmente, fruto na natureza pecaminosa com que nascemos.
Cada vez que você for preparar um ser-mão, pergunte-se: De que maneira este sermão vai atingir as necessidades básicas e universais das pessoas que o ouvirão? Então, prepare-o de modo que ele responda perguntas que o povo está fazendo. Certo pregador escocês costumava dizer: “Coce onde o povo sente que está coçando.”
E lembre-se da cruz de Cristo. Com um extremo de seu sermão, toque a glória de Deus através de Sua Palavra. Com o outro extermo, pise a terra onde as pessoas vivem, toque as feridas dos homens, mulheres e crianças. Coloque nelas o bálsamo curador do evangelho.