E perigoso haver na Igreja ministros que não fizeram uma entrega total de si mesmos. Essa entrega deve ser completa, sem nenhuma reserva

homem, um ser criado soberano e livre, renunciou a essa soberania e entregou-Se a uma verdadeira tirania. Renunciou à amorosa soberania divina, entregando-se à escravizante tirania de Satanás. Para ser reintegrado ao plano divino de salvação, o ser humano precisa renunciar à tirania satânica e voltar-se para a amorosa e paternal soberania do eterno Deus.

O cristianismo é uma filosofia de renúncia, e tem por base a própria renúncia. O convite para que um membro da igreja venha e se torne um ministro ou pregador do evangelho exige uma renúncia bem ampla.

Submissão total

Disse Jesus: “Se alguém quer vir após Mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-Me.” (Mat. 16:24). A primeira renúncia que um pastor deve fazer é a renúncia de si mesmo. Um ministro deixa de ter vontade própria; a vontade de Cristo passa a ser sua vontade. “Mas nós temos a mente de Cris-to”, afirmou Paulo.

Tendo a mente de Cristo, o ministro passa a pensar como Cristo; aprende a amar como Cristo; passa a orar como Cristo. Perdoa como Jesus; trabalha como Ele. A respeito de Jesus já se disse que “tão plenamente estava Cristo submetido à vontade de Deus, que unicamente o Pai aparecia em Sua vida” – O Desejado de Todas as Nações, pág. 389.

Nessa atitude residia o segredo da vida vitoriosa do nosso Senhor Jesus Cristo. Uma renúncia completa, uma entrega total. Quando tinha de tomar importantes decisões, Ele dizia: “Seja feita a Tua vontade”; “faça-se a Tua vontade”; “porque Eu desci do Céu não para fazer a Minha vontade, mas a vontade do Pai que Me enviou”. Era uma submissão tão plena, que somente a vontade do Pai aparecia. Uma renúncia que não dava lugar à busca da vontade própria.

Como ministros do evangelho, somente quando vivermos a teologia da renúncia, poderemos dizer: “vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim” (Gál. 2:20).

Negação do eu

Existe dentro de cada um de nós um perverso e pecaminoso tirano chamado EU, sempre clamando por atenção. É a esse tirano que devemos renunciar de maneira tão completa que somente Cristo apareça em nossa vida.

Parece que os sermões mais difíceis de pregar são os que falam de renúncia e de abnegação. A razão disso é porque também é difícil viver tais experiências. Segundo Ellen White, “sob o cabeçalho geral de egoísmo, vinha uma legião de pecados” (Testemunhos Seletos, vol. 1, pág. 518). E Satanás dizia: “eu subirei ao Céu”; “serei semelhante ao Altíssimo”; “exaltarei o meu trono”.

O chamado para o santo ministério é feito com base na renúncia, ou seja, tem como fundamento a negação do eu.

Negar-se a si mesmo é ocultar-se. “Porque morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente com Cristo, em Deus” (Col. 3:3). Um ministro escondido com Cristo, em Deus, significa somente Cristo aparecendo; somente o Espírito Santo falando; somente o Pai sendo glorificado. Negar o eu é esconder-se. “E Ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si mesmos, mas para Aquele que por eles morreu e ressuscitou” (II Cor. 5:15). Um ministro que não vive para si mesmo é uma glória para a Igreja. Precisamos evidenciar a experiência do apóstolo Paulo quando disse: “para mim, o viver é Cristo” (Fil. 1:21).

A abnegação, longe de ser um ato de autodestruição irracional ou perda de personalidade e da vontade, é um ato supremo de amor de alguém para consigo mesmo. É um ato de máxima significação e valorização da personalidade humana. “Vivo, não mais eu, mas Cris-to vive em mim” é a expressão do reflexo da imagem de Deus em nossa vida.

Tudo para Deus

As maiores contribuições para a História e para a Igreja foram realizadas por homens que tiveram a grandeza de renunciar. Eles renunciaram a si mesmos. Quando Cristo chama, nada é maior que o chamado. Cristo honra os que dizem “não” à fama e à fortuna. Caso Saulo de Tarso houvesse permanecido um fariseu orgulhoso e beato, seria de duvidar que a História tivesse recordado o seu nome. No entanto, quando voltou as costas aos desejos e ambições, decidindo servir a Deus e proclamar o evangelho da salvação por Cristo, foi chamado “o grande apóstolo dos gentios”. Deixou um registro de ministério cristão de tal maneira grandioso que foi superado apenas pelo ministério do próprio Cristo.

O Senhor deseja sacrifícios vivos (Rom. 12:1). Nosso Deus não tem interesse em doações posteriores à morte, como os que doam o próprio corpo à ciência médica. O Senhor não é ave de rapina para que Lhe entreguemos carcaças. Ele não está procurando homens e mulheres que Lhe dêem escassas noites, alguns finais de semana ou alguns dos anos alquebrados de uma aposentadoria.

Nada menos que submissão incondicional poderia ser uma adequada resposta ao sacrifício de Jesus no Calvário. Tão admirável e divino amor jamais poderia satisfazer-se com menos que o nosso tempo, nossos talentos, nossos bens e todo o nosso ser. Quando homens entregam o coração a Deus e a vida a Seu serviço, eles avançam mais rapidamente do que os que vivem para a ambição egoísta.

Negar simplesmente o próprio eu, sem seguir o restante das instruções do Mestre, daria origem a uma vida negativa e infrutífera. Por isso, Ele disse: “tome a sua cruz e siga-Me.”

Prévia da condecoração

As medalhas que mais honra conferem têm a forma de ‘uma cruz. Aqui no Brasil, temos a Ordem do Cruzeiro do Sul. No serviço militar americano, a medalha de distinção apresenta uma águia, um rolo com a inscrição e uma cruz. A França tem a cruz de guerra; e a Alemanha, a cruz de ferro. O heroísmo é exaltado e condecorado quase sempre com uma cruz. A maior organização humanitária do mundo colocou uma cruz vermelha em sua bandeira mundial. Trata-se da Cruz Vermelha Internacional.

A renúncia nos prepara para a condecoração divina. Devemos tomar a cruz e seguir o Mestre. Ele também foi condecorado. Os seres por Ele criados deram-Lhe uma cruz como condecoração. Foi uma cruz extremamente pesada, porque nela estavam depositados os pecados de toda a humanidade. A cruz foi tão pesada que o condecorado Cordeiro de Deus sucumbiu ao seu peso.

Pouco depois da morte de Filipe Brooks, seu irmão mais velho disse ao Dr. McVicker:

“Filipe poderia ter-se cuidado, e haveria, por certo, prolongado a vida. Outros trabalham, porém Felipe se dava aos que os buscavam.”

A resposta do Dr. McVicker foi impressionante:

“Efetivamente, Filipe poderia haver-se cuidado; mas se o tivesse feito não teria sido Filipe Brooks.”

O maior elogio que Jesus recebeu veio dos lábios dos Seus algozes: “Salvou os outros, a Si mesmo não pode salvar-Se.” Ele veio para dar-Se.

A renúncia de nós mesmos, no santo ministério, deve ser completa, total, sem nenhuma reserva. Muitos nunca se entregaram completamente; não viveram em profundidade a experiência da renúncia. Vivem e trabalham tal como Judas, de quem é dito que “não chegou ao ponto de render-se inteiramente a Cristo. Não renunciou as suas ambições terrenas”. – O Desejado de Todas as Nações, pág. 717.

Neste final de tempo, é perigoso haver no seio da Igreja ministros que não fizeram uma entrega total de si mesmos. Judas aceitou o chamado, a imposição das mãos, a investidura e as boas-vindas às fileiras do santo ministério sem negar-se a si mesmo; sem renunciar o próprio eu. Foi um eterno insatisfeito, durante seus três anos de trabalho. E se perdeu.

O homem da cruz

Nada menos que submissão incondicional poderia ser uma adequada resposta ao sacrifício de Jesus no Calvário.

Estéfano era um converso à mensagem do advento e vivia no Congo. Trabalhava como operário. Logo teve de enfrentar problemas com a guarda do sábado. Ele falou com seu chefe e explicou cuidadosamente a razão pela qual não podia trabalhar nesse dia. O chefe mostrou-se compreensivo e condescendente, mas houve um detalhe ao qual era preciso dar atenção. A empresa mantinha uma lista onde eram anotadas as ausências dos empregados e as razões pelas quais elas ocorriam. Se o ausente estava enfermo, o sinal era de um tipo. Se a falta era motivada por motivos particulares, o sinal era outro. A ausência de Estéfano, causada por motivos religiosos, deixou os patrões perplexos. Que sinal seria posto cada sábado, ao lado do seu nome?

O chefe meditou um pouco e, depois, seu semblante iluminou-se ao dizer:

“Coloquem uma cruz ao lado do nome de Estéfano. Ele é um homem da cruz.”

Que formoso tributo – “um homem da cruz”!

Qualquer de nós que não renuncie a si mesmo, não pode ser “um homem da cruz”. Não pode ser um discípulo de Cristo.