Apenas a constante dependência de Cristo nos manterá protegidos contra a soberba

Na antiga Roma, após uma vitoriosa batalha, havia a cerimônia do “triunfo”, uma das mais importantes solenidades e a maior recompensa dada aos generais vitoriosos. O general romano vitorioso, o “Triunfador”, vestido de púrpura, com uma coroa de louros na cabeça e conduzido por um magnífico carro puxado por quatro cavalos brancos, era levado em pompa ao Capitólio. Ali, era aclamado por senadores, rodeado de parentes e amigos e seguido por todo o seu exército e por grande número de cidadãos.

Adiante dele iam os despojos dos inimigos vencidos – riquezas e objetos preciosos das províncias conquistadas. Acorrentados com cadeias de ouro e prata seguiam à frente os reis e chefes inimigos subjugados, prisioneiros. Atrás, na grande procissão, vinham as vítimas que deveriam morrer.

Durante a cerimônia, para abater um pouco o orgulho que esse aparato tão deslumbrante certamente inspirava no vitorioso, um escravo, postado atrás dele, no mesmo carro juntava uma voz discordante às vibrantes aclamações da multidão e fazia ouvir cantos irreverentes e palavras satíricas. “Lembra-te de que és apenas um homem”, gritava ele ao vitorioso. E, em seguida, pronunciava esta outra advertência em latim: Cave ne caudas, que significa: “Cautela, não caias!”1

Lição para todos

Nas palavras do escritor Luiz Marins, “é grande a lição dada por esse costume romano. Aquele escravo, junto do Triunfador, repetia aquele alerta para que, na embriaguez da glória, o general romano não esquecesse sua condição humana, para que tanta pompa e circunstância não o fizessem julgar-se um deus nem um super-homem dotado de poderes divinos. O escravo repetia incessantemente as palavras ‘cave ne caudas’ para que o general se lembrasse de que, muitas vezes, a queda segue de perto o triunfo”.2

A História está repleta de exemplos de pessoas, empresas e organizações que se tomaram arrogantes devido ao sucesso de um produto ou projeto, a conquista de um prêmio ou a ocupação de um cargo ou função de destaque. A essa arrogância segue-se, invariavelmente, a queda como ocorreu na origem do pecado com aquele que é o autor e principal promotor do espírito soberbo. “Tu dizias no teu coração: Eu subirei ao Céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo. Contudo, serás precipitado para o reino dos mortos, no mais profundo do abismo.” Isa. 14:13-15.

Não é à toa que Salomão nos deixou a seguinte advertência: “A soberba precede a ruína, e a altivez de espírito, a queda.” Prov. 16:18. A Bíblia condena quaisquer manifestações de soberba: “O Senhor deita por terra a casa dos soberbos; contudo, mantém a herança da viúva.” Prov. 15:25. “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes.” Tiago 4:6. Fundamentado nisso, Paulo dá um conselho valioso aos líderes da igreja: “Porque é indispensável que o bispo seja irrepreensível como despenseiro de Deus, não arrogante, não irascível, não dado ao vinho, nem violento, nem cobiçoso de torpe ganância.” Tito 1:7.

Antídotos

Felizmente, existem antídotos contra o veneno espiritualmente letal que é a soberba. Vamos destacar alguns dos que consideramos principais:

Humildade. A humildade nos levará a desenvolver o senso de verdadeiro equilíbrio entre a grandiosidade da nossa obra, a grandeza do Senhor da obra e a nossa pequenez para executá-la com poder e eficiência: “Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós.” II Cor. 4:7.

Espírito de gratidão. Esse é um dos mais poderosos antídotos contra a febre do poder. Quando sentimos gratidão a Deus, em primeiro lugar, e às pessoas que nos cercam pelas vitórias conquistadas e as funções das quais estamos investidos, estaremos, com isso, lançando ou reafirmando as balizas para o exercício da liderança cristã que, certamente, nos impedirão de cair no abismo da soberba. Ninguém faz ou consegue nada sozinho, nesta vida. Daí, a indagação paulina: “Pois quem é que te faz sobressair? E que tens tu que não tenhas recebido? E, se o recebeste, por que te vanglorias, como se o não tiveras recebido?” I Cor. 4:7.

Espírito de serviço. Nosso Senhor Jesus deixou claro que os nossos métodos de administrar recursos e gerir pessoas não deveriam, jamais, se igualar aos meios despóticos do mundo: “Então, Jesus, chamando-os, disse: Sabeis que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tomar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo.” Mat. 20:25-27.

A este respeito, afirma o escritor Hans Finzel, o pecado número um em liderança é a arrogância autocrática do tipo líder-liderado”, cujas características ele enumera: abuso de autoridade, delegação deplorável, egocentrismo ou centralização na forma de administrar e ditadura na tomada de decisões.3 É interessante notarmos que esse tipo de liderança está com os dias contados mesmo no mundo secular.

Valorização das pessoas. Creio que foi Leonardo Da Vinci quem afirmou: “Sábio é aquele que usa as coisas para alcançar as pessoas. Tolo é aquele que usa as pessoas para alcançar as coisas.” A valorização das pessoas parte do reconhecimento de que o bem mais precioso que temos em nossas igrejas, escolas e demais instituições são as pessoas e, Conseqüentemente, elas devem polarizar nossas maiores e melhores atenções. Lembremo-nos sempre: Jesus passou mais tempo cuidando das pessoas, e conversando com elas, do que em qualquer outra coisa.

Saber quando parar. O pastor e escritor Howard Hen-dricks faz a seguinte afirmação: “É importante que todo crente saiba que ninguém é indispensável para Deus. Somos apenas instrumentos em Suas mãos. O Senhor deseja usar-nos. Mas, o problema é que, quando Ele nos usa, ficamos inclinados a pensar que a vitória foi nossa. Talvez, seja esse o motivo pelo qual, vez por outra, Deus remove um indivíduo do ministério, para manter vivo em nossa memória o fato de que o trabalho não é nosso, mas dEle.”4

A causa do triunfo

Como cidadão e alguém que viveu no auge do Império Romano, Paulo conhecia muito bem a cultura e as suas tradições, inclusive a cerimônia do triunfo. Por isso, são oportunas as suas palavras: “Graças, porém, a Deus, que, em Cristo, sempre nos conduz em triunfo e, por meio de nós, manifesta em todo lugar a fragrância do Seu conhecimento. Porque nós somos para com Deus o bom perfume de Cristo, tanto nos que são salvos como nos que se perdem. Para com estes, cheiro de morte para morte; para com aqueles, aroma de vida para vida. Quem, porém, é suficiente para estas coisas?” II Cor. 2:14-16.

A verdadeira causa do nosso triunfo em qualquer atividade encontra-se nesta sentença: “Deus, em Cristo, sempre nos conduz em triunfo.” Ellen White assegura: “Todo o nosso êxito, toda a nossa eficiência, está em Cristo. Devemos olhar continuamente acima do auxílio terrestre, mais alto do que o maior poder humano, mais alto do que os apóstolos. Temos de firmar nossa fé na própria pessoa de Cristo.”5

Com certeza, não precisamos de um escravo falastrão junto aos nossos ouvidos, a pronunciar: Cave ne caudas!, todas as vezes que galgarmos uma nova função, ou lograrmos êxito em qualquer atividade ministerial. No entanto, precisamos estar em constante vigília contra a soberba; para isso, nada melhor do que manter em nossa mente e nosso coração a seguinte exortação de Cristo: “Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em Mim, e Eu nele, esse dá muito fruto; porque sem Mim nada podeis fazer.” João 15:5.

Elizeu C. Lira, pastor na Associação Mineira Central

Referências:

1 Luiz Marins, Homo Habilis, pág. 55.

2 Ibidem, pág. 56.

3 Hans Finzel, Dez Erros Que Um Líder Não Pode Cometer, pág. 22.

4 Howard Hendricks, Aprenda a Mentorear, pág. 73.

5 Ellen G. White, Manuscrito 114, 1897.