Para encontrarmos Pedro e Paulo, no Céu, a melhor indicação é procurá-los perto de Jesus

Os relatos da vida e experiência dos personagens bíblicos não perderam sua força ao longo do tempo. Ao contrário, nos cativam, motivam e nos provêm instrução. Na opinião de Ellen G. White, “estas histórias são de interesse vital. A ninguém são elas de maior importância do que aos jovens”.1

Portanto, vamos refletir sobre quatro aspectos da vida de dois desses personagens – os apóstolos Pedro e Paulo -, com o objetivo de captar as lições que eles encerram e, sobretudo, sem deixar de notar a mão do Senhor conduzindo-os carinhosamente à vitória. Certamente, nos fará bem lembrar que essa poderosa mão também é capaz de guiar-nos em nossa jornada.

O chamado

O convite para conhecer Jesus chegou a Pedro através de André, seu irmão. E Jesus não o rejeitou. Ao contrário, aceitou-o, vendo-o exatamente como era: impulsivo, mas afetuoso; ambicioso, porém simpático; autoconfiante, mas também capaz de se arrepender com sinceridade. Assim foi o primeiro encontro de Pedro com Cristo: sereno, sem estridências (João 1:40-42).

Depois, viria o chamado para a missão, às margens do mar da Galiléia, no alvorecer de um dia precedido por uma frustrante noite de pesca. Jesus entrou no barco, transformando-o em cátedra e púlpito. Seguiu-se a pesca milagrosa na hora menos propícia. Contudo, para Pedro, os peixes já não importavam muito. Aprendera a ver Jesus sob nova luz; testemunhara Seu poder sobrenatural. Além disso, viu-se também de modo diferente: impuro e pecador, ao mesmo tempo em que se agarrava fortemente ao Mestre. Aceitou o chamado e, dali em diante, seria um pescador de homens (Luc. 5:1-11). A partir de então, abandonou o ofício de pescador para dedicar-se inteiramente ao ministério apostólico.

Pedro era um pescador sem estudo, mas seu chamado demonstra que o Senhor pode preparar e usar instrumentos humildes. Por isso, Cristo chamou indivíduos que não tinham tanta confiança própria, mas possuíam disposição de aprender dEle.

A história de Paulo foi diferente. Seu encontro com Cristo foi dramático. Saulo de Tarso não era simplesmente um pescador da Galiléia, mas era um jovem rabino judeu e cidadão romano. Recebera a melhor educação em Jerusalém e ocupou função pública privilegiada, tendo diante de si uma carreira promissora. Em seu zelo religioso, chegou a ser perseguidor implacável do cristianismo. Foi com esse cruel propósito que se dirigiu a Damasco, quando recebeu a visão de Cristo. “Às portas de Damasco a visão do Crucificado mudou todo o curso de sua vida. O perseguidor tornou-se discípulo, o mestre, aluno.”2 Em três dias, Saulo tornou-se um cristão batizado e pregador do evangelho (Atos 9:1-19).

Paulo era um mestre instruído, cujo chamado demonstra que Deus também pode usar indivíduos preparados e cultos. “O Salvador não desprezava a educação; pois, quando regida pelo amor de Deus e consagrada a Seu serviço, a cultura intelectual é uma bênção.”3

Ao lembrarmos dos encontros de Pedro e Paulo com Jesus, não podemos esquecer nossa própria experiência. Vem-nos à lembrança a pessoa que nos estendeu o convite. De algum modo, ouvimos a respeito de Cristo, estudamos Sua Palavra e recebemos Seu chamado. Pode ter acontecido em momento de quietude e reflexão, ou de crise e preocupação. Seja como for, uma voz a que não pudemos resistir nos convidou a nos aproximarmos de Deus. É possível que o tenhamos sempre em mente, ou que nem nos lembremos com exatidão; mas o apelo celestial nos alcançou.

Ao mesmo tempo, devemos estar conscientes de que o Senhor usa todos os que respondem positivamente, além da cultura, dos talentos ou do preparo intelectual. O que importa não é o que temos, mas o que estamos dispostos a entregar; não o que recebemos, mas o ser, mas o que nos dispomos a dar; não o que acreditamos que podemos ser, mas o que permitimos que Ele faça em nós e através de nós.

A conversão

Aprender a desconfiar de si mesmo e a depender apenas de Cristo foi um longo processo na vida de Pedro. Até o fim do ministério terrestre de Jesus, esse discípulo se sentia muito seguro da decisão que tomara (Mar. 14:29-31). Era sincero, mas apoiava-se em lugar errado. Dormiu no Getsêmani, quando deveria permanecer em oração. Depois, fugiu, quando deveria ter estado presente.

derramar lágrimas de sincero arrependimento. No fim, o Senhor lhe concedeu a chance de mudar seu remorso e vergonha por segurança e coragem. Como Lhe negara três vezes, O confessou três vezes, com humildade, dando evidência de conversão autêntica.

Uma profunda consciência de pecado acompanhou Pedro durante sua vida. “Pedro havia-se arrependido sinceramente daquele pecado … Ele, porém, nunca pôde perdoar a si mesmo.”4 É que os grandes homens de Deus nunca deixaram de sentir

Durante o julgamento, seguiu de longe a Jesus, quando deveria tê-Lo seguido de perto. Envergonhou-se e negou o Mestre, depois de ter prometido morrer por Ele. Escolheu a indiferença e o anonimato, quando eram necessárias testemunhas valentes. Foi covarde diante do ridículo. Porém, quando seu olhar cruzou com o de Cristo, entendeu sua verdadeira situação. Correu para o jardim; desta vez, para orar e que eram meros seres humanos pecadores. Quanto mais próximos do Senhor, mais conscientes estavam da própria nulidade.

A conversão de Paulo foi uma experiência repentina. A caminho de Damasco, compreendeu seu erro e se entregou a Cristo. Sua decisão seria permanente. O encontro com Jesus, a conversão e o chamado ocorreram quase simultaneamente. Jamais retrocedeu, muito menos negou seu Mestre. Contudo, à semelhança de Pedro, o grande apóstolo se considerava um grande pecador (I Tim. 1:15; I Cor. 15:9).

Evidentemente, nem todos experimentam a conversão da mesma forma. Muitos levam tempo para entregar-se a Cristo, enquanto outros respondem imediatamente. Há os que nem se lembram quando se converteram. “Pode alguém não ser capaz de dizer exatamente a ocasião ou lugar de sua conversão, nem seguir toda a cadeia de circunstâncias no seu processo; mas isto não prova que essa pessoa não seja convertida.”5 Não há dúvidas quanto ao fato de que a conversão muda a vida. Porém, não nos faz perfeitos e impecáveis. “Quanto mais perto vos chegardes de Jesus, tanto mais cheio de faltas parecereis aos vossos olhos; porque vossa visão será mais clara e vossas imperfeições se verão em amplo e vivo contraste com Sua natureza perfeita.”6

O ministério

O incidente em que Pedro quis andar sobre as águas (Mat. 14:22-33) ensinou-lhe a importância de olhar para Jesus, e não aos homens nem às circunstâncias. Naquela noite, ele compreendeu que o orgulho nos separa de Cristo e conduz a perdas infinitas. Por sua vez, Paulo aprendeu muito cedo que o êxito de seu trabalho dependia de tornar Cristo o centro de tudo. Era-lhe muito claro que sua carta de apresentação não seria sua retórica nem seu brilho intelectual (I Cor. 2:1-5).

Pedro foi enviado aos judeus e seu ministério estava direcionado a eles. Cristo lhe entregara as “chaves do reino dos Céus” (Mat. 16:19). Segundo Ellen White, as chaves “são as palavras de Cristo. Todas as palavras da Santa Escritura são dEle e acham-se aqui incluídas. Estas palavras têm poder para abrir e fechar os Céus”.7 Assim, essas chaves que foram utilizadas pelos cristãos em seu testemunho, também foram empregadas por Pedro para evangelizar os judeus, no Pentecostes, e os gentios na casa de Cornélio, embora fosse especificamente o 

pregador para os judeus. Paulo, entre-tanto, foi enviado aos gentios e nesse trabalho deveria gastar grande parte de sua vida. Levou-lhes o evangelho e estabeleceu igrejas entre eles.

Logo no início de seu ministério, Paulo desejou conhecer Pedro e foi a Jerusalém, onde se encontraram pela primeira vez. Voltaram a ver-se no concilio realizado nessa cidade, em aproximadamente 49 d.C. Paulo recebeu apoio de Pedro para o trabalho entre os gentios, embora nem sempre estivessem de acordo em tudo. Houve uma ocasião em que Paulo sentiu a necessidade de repreender Pedro publicamente (Gál. 2:13 e 14). Embora os melhores homens, deixados a si mesmos, possam cometer enganos, os convertidos corrigem seus erros com a ajuda de Deus. Por isso, é inspirador notar que o repreendido Pedro referiu-se a Paulo como “amado irmão” (11 Ped. 3:15). Quem vive para servir a Cristo não pode ser rancoroso nem vingativo. Pedro e Paulo eram diferentes, mas os dois eram instrumentos nas mãos de Deus. Para eles, rivalidade não fazia sentido (1 Cor. 1:12 e 13; 3:21-23).

É Cristo o centro de nossa vida? Anelamos servir-Lo, independentemente do lugar que nos seja indicado? Estamos dispostos a cooperar com nossos irmãos, a aprender com eles e a aceitar seus conselhos e correções? Porventura já aprendemos a esquecer de nós mesmos e a sentir que apenas somos instrumentos nas mãos de Deus?

A morte

Pedro e Paulo sofreram e morreram por Cristo. Em uma ocasião, Pedro foi liberto milagrosamente da prisão. Paulo esteve preso muitas vezes. Sob o reinado de Nero, por volta de 67 d.C., Pedro morreu crucificado, e Paulo foi decapitado. A respeito da crueldade daquele imperador, Tertuliano, em sua Apologia contra os gentios, declara: “A religião cristã não tem maior abono do que haver sido perseguida por Nero; quem o conheceu, sabe que um homem tão mau não poderia perseguir senão algo extremamente bom.”

“Na providência de Deus foi permitido a Pedro encerrar seu ministério em Roma, onde sua prisão foi ordenada pelo imperador Nero, aproximadamente ao tempo da última prisão de Paulo. Assim os dois apóstolos veteranos, que por muitos anos tinham estado separados pela distância, em seu afirme que Pedro está sepultado sob a basílica que leva seu nome, no Vaticano, assim como é dito que Paulo foi sepultado na Via Ostia. O certo é que ambos estarão no reino de Deus. Teremos prazer em conhecê-los; e acredito que, para encontrá-los no Céu, o melhor será procurá-los perto de Jesus.

trabalho, deviam dar seu último testemunho em prol de Cristo na metrópole do mundo, e sobre seu solo derramar o sangue como a semente de uma vasta colheita de santos e mártires.”8

Ao receber a sentença de morte, Pedro pediu para ser crucificado de cabeça para baixo. “Julgava demasiada honra sofrer pela mesma maneira que seu Mestre.”9 Por sua vez, Paulo, na ocasião de seu martírio, tinha os pensamentos voltados para o dia da volta de Jesus. “Seus pensamentos e esperanças estão centralizados na segunda vinda de seu Senhor. E quando a espada do carrasco desce e a sombra da morte cai sobre o mártir, seu último pensamento avança, do mesmo modo que o primeiro quando ressuscitar, para encontrar o Doador da vida, que o há de convidar para o regozijo dos santos.”10

Pedro foi levado para onde não queria (João 21:18 e 19). Paulo foi levado para onde sempre quis ir em outras circunstâncias (Rom. 1:8-15). Há quem

Todos nós preferimos ver Cristo voltar, sem experimentarmos a morte. Porém, também sabemos que ser cristão significa estar dispostos a sofrer e morrer por Cristo. Estamos nos preparando para cruzar o “vale da sombra da morte” com a certeza do dever cumprido e com a esperança posta na glória vindoura?

O Novo Testamento dedica muitas páginas ao registro das histórias de Pedro e Paulo. Depois de havermos refletido juntos em alguns aspectos da vida desses baluartes, convém tomar tempo para responder algumas perguntas: Na hora da tormenta ou da calma, temos sentido o chamado de Cristo? Entendemos que o reino de Deus está reservado apenas para os que tiverem nascido de novo? Quer seja em um momento, ou durante um processo, temos entregado nossa vida ao Senhor? Qual é o sentido de nossa vida? Compreendemos que fomos chamados a servir a Cristo com amor e abnegação? Estamos decididos a viver e morrer por Cristo, com a fé estabelecida firme-mente na esperança da vida eterna?

Daniel O. Plenc, professor de Teologia e diretor do Centro de Pesquisas Ellen G. White, na Universidade Adventista Del Plata, Argentina

Referências:

1 Educação, pág. 68.

2 Ibidem, pág. 65.

3 O Desejado de Todas as Nações, pág. 249.

4 Atos dos Apóstolos, pág. 538.

5 Caminho a Cristo, pág. 57.D

6 Ibidem, pág. 64.

7 O Desejado de Todas as Nações, pág. 413.

8 Atos dos Apóstolos, pág. 537.

9 O Desejado de Todas as Nações, pág. 816.

10 Atos dos Apóstolos, pág. 513.