O Cordeiro devefazerparte do nosso ser, da nossa vida. Não somos de nós mesmos. Tudo o que temos e somos é do Cordeiro de Deus
A Páscoa tem uma história profética e comemorativa. Foi a maior e mais concorrida liturgia em Israel. No início, lá no Eden, o ato de sacrificar um cordeiro apontava em algum momento no futuro a vinda do Messias, o Emanuel, o Cordeiro de Deus. Após deixar o Eden, o casal arrependido continuou oferecendo e sacrificando o cordeiro. O agonizar do animal sem mancha e sem defeito, o derramar do sangue, produzia profundos sentimentos na família de Adão, sendo que Abel era o que mais absorvia o significado. Abel construiu um altar. Com devotada contrição e alegria espiritual, oferecia com freqüência um cordeiro, símbolo do esperado Salvador. Tal prática e a correspondente aceitação da parte do Senhor fizeram do justo Abel, cujas obras eram boas, o primeiro mártir da História.
Logo após a tragédia universal do Dilúvio, Noé e sua família, reunidos em tomo de um altar, expressaram sua fé de que, se vivos estavam, deviam essa proteção a Deus. E ali, na desolada e despovoada Terra, sacrificaram e adoraram.
Abraão, o missionário ambulante, armava a tenda, construía um altar e adorava, sacrificando um cordeiro. Aproximadamente mil pessoas que formavam a comunidade a serviço do rico patriarca tomaram-se adoradoras. Cristo era levantado e multidões O adoravam. A fé na vinda do Messias levou Abraão a sentir o que o Senhor sentiria no futuro, ao atender-Lhe o pedido: “Dá-me teu filho, o único, sacrifica-o.” O Céu não somente aplaudiu, como também entendeu pela primeira vez quanto custaria ao Pai salvar este planeta.
No Egito
A palavra páscoa é mencionada 77 vezes na Bíblia. O contexto em que foi instituída foi dos mais turbulentos. A partir de sua instituição cumpria duas finalidades: continuar anunciando a vinda do Messias e comemorar a libertação do povo de Deus da escravidão egípcia. Depois de nove pragas enviadas com o objetivo de impressionar Faraó a deixar o povo ir, restava ainda mais uma praga. Havia, portanto, um estado de excitação, angústia, dor e sofrimento. Cada uma das pragas anteriores deixara terríveis conseqüências. O que viria agora? As forças militares foram postas em estado de alerta máximo; a guarda palaciana foi reforçada. Moisés e Arão foram proibidos de voltar ao palácio. Os egípcios estavam no limite da tolerância, no ponto do desespero.
A insatisfação com a presença ameaçadora de Israel espalhou-se em todos os níveis. Uma comissão especial pediu audiência ao endurecido Faraó, dizendo-lhe: “Deixa ir os homens, para que sirvam ao Senhor seu Deus” (Êxo. 10:7). Enquanto isso, Moisés instruía o povo sobre como seria a sua última noite na terra da escravidão: até à meia-noite, todos dentro de suas casas; deviam matar o cordeiro, aplicar sangue nas ombreiras das portas; aprontar mochilas, sandálias nos pés. À meia-noite, o Senhor feriria os primogênitos egípcios. A situação se invertia. Os egípcios que pela força tentavam impedir o crescimento de Israel, não podiam imaginar perderem mão-de-obra tão barata. Agora, eles “apertavam com o povo, apressando-se em lançá-los fora da terra, pois diziam: Todos morreremos” (Êxo. 12:33).
A esta altura, “Moisés era mui famoso na terra do Egito, aos olhos dos oficiais de Faraó e aos olhos do povo” (Êxo. 11:3). É importante lembrar que ele foi um dos homens mais cultos daquela nação, preparado para ocupar o trono. De acordo com Êxodo 11:2 e 12:35, Deus o orientou a que pedisse uma indenização pelos quatro séculos de serviço prestado. Haviam construído cidades, estradas, pontes, viadutos, palácios, pirâmides e outras obras. E os egípcios foram despojados (Êxo. 12:36).
Aproximava-se a última noite. Um misto de temor e alegria expectante formava o contexto da instituição da páscoa. Parecia ser a mais escura de todas as noites e também a mais silenciosa. Ouvia-se o bater em muitas portas dos filhos de Deus. Eram famílias egípcias buscando ajuda e proteção na fortaleza da fé dos israelitas. O tempo corria, os ponteiros quase sobrepunham-se um ao outro, indicando a hora da libertação. O silêncio então deu lugar a gritos desesperados, ouvidos de longe e de perto. Havia grande clamor na terra do Egito; não havia uma casa onde não houvesse um morto. Em cada lar, do mais humilde ao mais abastado, mesmo no palácio real, o quadro era o mesmo.
Em poucos dias, os egípcios sofreram mais que Israel em seus 400 anos de severa e desumana escravidão. Comido o cordeiro, tocada a trombeta, chegara a hora da libertação e da vitória. A primeira páscoa estava instituída. Agora, além de anunciar a futura vinda do Messias, a liturgia da imolação do cordeiro comemora a libertação vitoriosa do povo de Deus. Os egípcios, com angústia, dor e morte, viviam o fracasso e a humilhação de todos os seus deuses. Israel, com reverência, comia e cantava sua vitória pelo sangue do Cordeiro.
Em Jerusalém
Celeremente o tempo passou e o Messias, anunciado em cada celebração pascal, finalmente chegou. Aos doze anos, Ele foi a Jerusalém e assistiu à cerimônia da imolação do inocente cordeiro. Identificou-Se profundamente, sentindo-Se parte daquele cerimonial. Como um adolescente educado a respeitar e reverenciar os ritos, não gostou do que acontecia no pátio. Improvisados currais, muitas gaiolas, mesas onde atuavam os cambistas, gritaria dos vendedores anunciando os melhores preços, os maiores descontos. Disputava-se em um corpo-a-corpo a atenção dos adoradores. Havia uma atividade como se fora bolsa de valores ou feira de importados.
Aos doze anos, Jesus decidiu que um dia a casa de Seu Pai voltaria a ser uma respeitável casa de oração para todos os povos. E o fez por duas vezes.
Os poucos anos após o início do Seu ministério passaram rapidamente. E um dia os discípulos perguntaram: “Onde queres que vamos fazer os preparativos para comeres a páscoa ?”(Mar. 14:12). Três anos e meio de ensino e treinamento aos discípulos pareciam infrutíferos, pois ao adentrarem ao cenáculo onde o encontro teve lugar, o fizeram aos empurrões, disputando as cadeiras da direita e da esquerda. O lava-pés revelou não terem eles absorvido muitos dos princípios do reino. Não havia servos.
O ambiente era pesado. Como na primeira páscoa, havia perturbações. “Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta páscoa”, disse o Mestre (Luc. 22:15). Seria a páscoa da transição. O último cordeiro seria morto e comido. Je-sus interrompe um pouco e declara: “Um de vós Me há de trair.” Em algum momento no passado, Ele sentenciara: “Um de vós é diabo” (João 6:70). As duas frases produziram um impacto aterrador. “Porventura sou eu, senhor?”, indagaram. A instituição da primeira páscoa foi antecipada por destruição, miséria, desespero, dor, angústia, culminando com o comer do cordeiro e o vitorioso livramento. Ao final da última páscoa, seguiram-se cenas não menos traumáticas do que as tidas no Egito.
Em um período de 24 horas após a última páscoa, Jesus passou por uma angústia mortal regada a sangue e suor. A traição foi confirmada. Em poucas horas, o verdadeiro Cordeiro foi levado a três tribunais: o Sinédrio judaico, Pilatos, Herodes, e outra vez Pilatos. Do pretório foi para a cruz. Agonizou, vertendo até a última gota de sangue. Houve escuridão, relâmpagos, o rasgar das cortinas do santuário, a fuga do cordeiro no sacrifício da tarde. As palavras da cruz terminaram com o grito de vitória. Todos podem ser perdoados. O Cristo vivo passou a ser nossa páscoa. Nenhuma condenação para quem aceita Seu convite: “Vinde a Mim. Não vos lançarei fora.” Ele é nossa páscoa.
Não é preciso esperar por uma data no calendário. Todos os dias, todos os momentos, como diz Paulo, “Cristo vive em mim”. O Cordeiro deve fazer parte do nosso ser, da nossa vida. “Vivo não mais eu; Cristo vive em mim”. O Cordeiro deve estar encarnado em nosso ser. Não somos de nós mesmos. Nenhum milímetro de nosso ser pertence a mais ninguém. Tudo o que temos e somos é do Cordeiro de Deus.
No futuro
“A Santa Ceia aponta à segunda vinda de Cristo. Foi destinada a conservar viva essa esperança na mente dos discípulos. … ‘E digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vide até aquele dia em que o beba de novo convosco no reino de Meu Pai.’” – O Desejado de Todas as Nações, pág. 659.
Os últimos acontecimentos serão rápidos; logo estaremos no reino. Ele será nosso anfitrião e guia. “Logo Lhe ouvimos de novo a delicada voz, dizendo: ‘Vinde, povo Meu; viestes da grande tribulação, e fizestes Minha vontade; sofrestes por Mim; vinde à ceia, pois Eu Me cingirei e vos servirei’. Nós exclamamos: Aleluia! Glória! e entramos na cidade. E vi uma mesa de pura prata; tinha muitos quilômetros de comprimento, contudo nossos olhares podiam alcançá-la toda. Vi o fruto da árvore da vida, o maná, amêndoas, figos, romãs, uvas e muitas outras espécies de frutas.” – Vida e Ensinos, pág. 64.
Tudo é nosso, daquele momento e por toda a eternidade. Tudo será alegria, tudo será glória. Aleluia! Ora, vem, Senhor Jesus!