A internet como ferramenta para evangelismo direto, mobilização e discipulado

Silvano Barbosa

A igreja já aprendeu a ir para a rua. Agora precisamos entrar na sociedade. Como? Oferecendo serviços relevantes às comunidades ao redor das nossas igrejas e instituições. Para fazer isso, provavelmente precisaremos utilizar a internet, pois essa é a ferramenta mais eficaz para manter comunicação direta com as pessoas, onde quer que elas estejam. Não vamos abandonar os métodos evangelísticos que temos utilizado até aqui. Ao contrário, vamos utilizá-los ainda mais, à medida que aplicarmos essa abordagem. O objetivo deste artigo é oferecer uma proposta de como esse processo pode ser desenvolvido.

A tripla convergência

Em The World is Flat, Thomas Friedman apresenta uma breve história do século 21 e explica como o mundo passou a ter as características atuais. Friedman sugere que um dos fatores de maior relevância foi o que ele define como a “tripla convergência”.1

A primeira convergência foi a integração de vários fatores, como a comunicação entre diferentes softwares, a terceirização, a produção em outros países, as ferramentas virtuais de busca e as diferentes tecnologias digitais, que possibilitou a criação de uma plataforma global de compartilhamento de conhecimento e trabalho em tempo real, independentemente de geografia e distância, viabilizada por meio da internet.2

A segunda convergência refere-se à quantidade cada vez maior de profissionais de diferentes áreas, com diferentes qualificações, que está confortável com essa nova realidade e tem desenvolvido habilidades e práticas que nos permitem explorar as muitas possibilidades do mundo interconectado. Por isso, a cada dia, mais empresas e indivíduos se adaptam rapidamente e passam a utilizar essas oportunidades. A criação do WhatsApp e sua utilização em massa na América do Sul é um exemplo disso.

A terceira convergência é resultado da inserção repentina de um número cada vez maior de pessoas nesse novo contexto. Em todo o mundo, mais de 3 bilhões de pessoas passaram a ter acesso a essa nova conjuntura e foram habilitadas a competir e colaborar de maneira mais igual, horizontal, e com ferramentas mais baratas do que nunca.

A tripla convergência transformou o mundo para sempre e agora nos permite fazer evangelismo de maneira mais pessoal e abrangente do que em qualquer outra época. Essa é a nova realidade à qual devemos nos adaptar.

A tenda de evangelismo só nos permitia alcançar diretamente as pessoas que vinham até nós, normalmente na periferia das cidades. A internet, por sua vez, nos permite ir diretamente às pessoas e manter comunicação com elas na periferia ou no centro, no bairro ou no condomínio, em casa, no trabalho, na rua ou no lazer, sejam elas ricas ou pobres, altamente instruídas ou sem qualquer instrução formal.

Contudo, não basta ter acesso às pessoas. A comunicação só será estabelecida se as pessoas nos escolherem, se estivermos oferecendo algo de que estejam precisando. Como fazer isso? A receita é antiga. Jesus ofereceu serviços: ensinando, pregando e curando (Mt 4:23); Ele ganhava a confiança, mostrando simpatia e suprindo as necessidades das pessoas.3 Para aproveitar as possibilidades que o mundo interconectado nos oferece e ter a chance de mantermos comunicação direta com as pessoas, precisamos usar a internet para oferecer soluções para as necessidades delas.

Não tenho a pretensão de apresentar uma resposta definitiva para esse desafio. Ao contrário, acredito que à medida que uma quantidade maior de pessoas começar a pensar nessa direção surgirão diferentes maneiras de colocarmos esse conceito em prática. Apresento abaixo uma sugestão.

App Esperança

Imagine um aplicativo que poderia colocar à mão dos habitantes de uma determinada região todos os serviços que nossas igrejas, grupos, centros de influência, escolas, faculdades, internatos, editoras, fábricas de alimento saudável, lojas, restaurantes, Adra, rádios e TV estão oferecendo naquela área.

A principal característica desse aplicativo seria uma ferramenta de busca com uma pergunta do tipo: “Como posso ajudar você hoje?”. Fazer esse questionamento é importante, pois nos possibilita (1) conhecer as necessidades das pessoas, (2) saber a localização dessas pessoas necessitadas e (3) oferecer-lhes os serviços de que estão necessitando.

No momento em que a pessoa fizesse a busca, o aplicativo mostraria no mapa os pontos mais próximos onde ela poderia encontrar em nossas iniciativas o serviço de que precisa. Pelo aplicativo, o interessado poderia se inscrever para participar do projeto, programa, curso, seminário, palestra, clínica, atendimento ou qualquer outro serviço que estejamos oferecendo. Ademais, ao permitir notificações do aplicativo, ele poderia ser informado a respeito de outros serviços oferecidos, além de ser alcançado também pelas redes sociais regionais.

Os serviços prestados à comunidade dariam às pessoas a oportunidade de conhecer nossa mensagem e nosso estilo de vida. À medida que o relacionamento fosse desenvolvido, poderiam conhecer também nossos pequenos grupos, classes bíblicas, séries de evangelismo e receber estudos bíblicos em casa. Esse é um exemplo simples de como podemos integrar os conceitos de evangelismo direto, por meio de uma abordagem indireta, em um formato adequado à época em que estamos vivendo.

Talvez, a maior limitação para o sucesso de uma abordagem como essa é o fato de ainda não termos em nossas igrejas uma cultura bem desenvolvida de ministérios de prestação de serviços relevantes à comunidade. Entretanto, não seria essa uma excelente forma de crescermos nesse aspecto?

Além disso, acredito que o maior benefício dessa abordagem seria a contribuição que daria aos processos de mobilização e discipulado da igreja.

Discipulado e evangelismo

Uma de nossas principais responsabilidades como líderes da igreja é ajudar os membros a utilizarem seus dons, provendo continuamente novas formas de participação. Temos falado em ajudar as pessoas a descobrirem seus dons, mas normalmente elas sabem aquilo que gostam de fazer e fazem bem. Pesquisas sugerem que não há relação direta entre ajudar as pessoas a descobrirem seus dons e o aumento na participação. Por outro lado, há aumento no envolvimento sempre que criamos novas formas de participação.4

O segredo para engajar um número maior de pessoas é ajudá-las a fazer mais daquilo que até agora têm trazido satisfação espiritual a elas.5 Para fazer isso, é necessário proporcionar um ambiente que tenha oportunidades de envolvimento, motivação para a participação e habilidade de se envolver mais.6

O projeto “Meu Talento, Meu Ministério” foi uma das ações mais consistentes no sentido de ajudar cada membro a achar seu lugar no corpo de Cristo. Mesmo assim, ainda há um grande espaço para crescimento nessa área.

Ao criar uma plataforma de compartilhamento de serviços, na prática, estamos organizando uma “feira de exposições permanente”, na qual a igreja poderá oferecer seus préstimos e os membros terão oportunidade e motivação para desenvolver a habilidade de transformar seus dons em ministérios. Mesmo nas igrejas pequenas, no interior ou na periferia, os membros podem oferecer serviços compatíveis à área em que estão inseridos.

Adicionalmente, embora a igreja sempre deva oferecer serviços à comunidade, os membros têm níveis de interesse ou disponibilidade diferentes. Portanto, precisamos dar-lhes a oportunidade de desempenharem seus ministérios em diferentes períodos de tempo como uma vez por ano, uma vez por semana, uma semana por mês, uma vez por mês ou durante um trimestre.

Ao mesmo tempo, ao implementarmos uma abordagem como essa, fazemos um investimento concreto no discipulado da igreja. Sabemos que o discipulado é o processo de uma vida inteira que requer a participação do discípulo e da comunidade de crentes.

Projetos como “Reavivados por Sua Palavra”, “Crede em Seus profetas” e “Maná” têm provido a motivação e as ferramentas para ajudar a igreja a desenvolver um relacionamento pessoal com Deus e crescer em compromisso e maturidade cristã. Contudo, providenciar oportunidades de serviço talvez seja uma das ações mais relevantes que a comunidade de crentes possa fazer para contribuir no processo de discipulado de cada membro.

Ao relacionar o serviço ao discipulado, Ellen White afirmou: “O espírito de abnegado amor pelos outros proporciona ao caráter profundeza, estabilidade e formosura cristã e traz paz e felicidade ao seu possuidor.”7

O esforço para abençoar outros resultará em bênçãos sobre a própria pessoa, pois esse serviço desinteressado atrai o crente, “ligando-o mais estreitamente ao Redentor do mundo”.8 Assim como Jesus viveu na Terra para abençoar e ministrar a outros, a conduta do cristão deve ser um testemunho do trabalho da graça de Deus em sua vida. Desse modo, o serviço se transforma numa forma de transbordar o amor divino, à medida que participa do processo de santificação.9 Consequentemente, uma das mais claras evidências de discipulado ocorre quando o cristão entende seus dons espirituais e os utiliza na forma de serviço desinteressado em favor dos outros.

Conclusão

Por volta do ano 2000, a convergência de vários fatores contribuiu para a criação de uma plataforma global de compartilhamento de conhecimento e trabalho, viabilizada pela internet. Desde então, profissionais de diferentes áreas têm desenvolvido um conjunto de habilidades e práticas que permitem que a cada dia mais empresas e pessoas explorem as possibilidades do mundo interconectado. Essa é a nova realidade e, como igreja, precisamos nos adaptar.

Assim, a internet nos permite fazer evangelismo de maneira mais pessoal e abrangente do que nunca. No centro dessa abordagem está a ideia de oferecer serviços relevantes à comunidade, que serão escolhidos por meio de dispositivos móveis e realizados em nossas igrejas e instituições. Assim, faremos evangelismo direto, utilizando uma abordagem indireta, num formato adequado aos dias atuais. Ao mesmo tempo, a implementação desse conceito será um investimento concreto nos processos de mobilização e discipulado da igreja.

Vivemos em uma época na qual precisamos decidir se vamos aproveitar apenas as oportunidades para as quais temos potencialidades, ou se vamos desenvolver novas potencialidades para aproveitar novas oportunidades. Essa escolha definirá a eficiência de nossas ações e, consequentemente, os resultados de nossos esforços.

Referências

1 Thomas Friedman, The World is Flat (Nova York: Farrar, Straus and Giroux, 2005), p. 173-200.

2 Ibid., p. 48-173, 176.

3 Ellen G. White, A Ciência do Bom Viver (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2015), p. 143.

4 S. Thumma e W. Bird, “Mobilizando os Outros 80%”, Foco na Pessoa, v. 3, n. 4, p. 17, 2014; S. Thumma e W. Bird, The Other 80 Percent (San Francisco: Jossey-Bass, 2011), p. 1-56.

5 S. Thumma e W. Bird, “Os outros 80%: 20% da igreja produz 80% dos resultados, mas isso não tem que ser assim”, Foco na Pessoa, v. 3, n. 2, p. 18-25, 2014.

6 Ibid., p. 23.

7 Ellen G. White, Caminho a Cristo (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2016), p. 80.

8 Ibid., p. 79.

9 Denis Fortin, “Growing up in Christ: Ellen G. White’s concept of discipleship”, Journal of Adventist Mission Studies, v. 12, n. 2, p. 60-75, 2016.

Silvano Barbosa, professor da Faculdade de Teologia do Unasp, Engenheiro Coelho