Cinco fundamentos do ministério pastoral efetivo

O que faz um pastor? Acaso, existe uma descrição bíblica do trabalho pastoral? Depois que concluí o seminário e recebi minha primeira igreja, perguntei a muitos pastores experientes a respeito desse assunto. Um deles me respondeu: “Saia e faça o povo feliz”. Outro me animou a visitar e visitar cada vez mais. Ainda outro me ensinou que o principal trabalho do pastor é conquistar novos crentes.

Porém, existe um modelo escriturístico que possa nos ajudar a compreender o papel do pastor? Após muitos anos de observação e cuidadoso exame da literatura especializada, encontrei dois distintivos papéis pastorais: tradicional e contemporâneo.

Papéis tradicional e contemporâneo

Durante muitos séculos, as pessoas viam o pastor como um servo prestador de cuidados a quem competia fazer o seguinte:

  • • Ensinar e pregar doutrinas tradicionais.
  • • Visitar, aconselhar, confortar e satisfazer as necessidades do povo.
  • • Realizar rituais, como apresentação de crianças, batismo, casamento e funeral.
  • • Administrar, que inclui organização de programas e reuniões, cuidar de boletins, promover e fazer evangelismo.
  • • Servir como embaixador da igreja diante da comunidade.

Durante muitos séculos, os pastores fizeram isso. Porém, lá pelos anos 70 e 80, uma nova compreensão começou a ganhar força. Muitos escritores e pastores de mega igrejas passaram a ver o papel do pastor como um líder executivo, que partilha uma visão, reúne e motiva pessoas a levar essa visão.

A maioria dos livros sobre crescimento de igreja e liderança, hoje, argumenta que se os pastores continuarem a fazer o que têm feito durante anos, eles falharão. Greg Ogden propõe que o pastor deve ser um líder visionário que forma outros líderes, capta a visão e muda a cultura e a estrutura da igreja, fazendo tudo isso com o olho na missão, no evangelismo e no crescimento.1

Embora sejam novas, compreensivas e benéficas, essas ideias são teologicamente fracas. O antigo modelo do servo prestador de cuidados não favorece o crescimento, mas cria uma cultura de pessoas dependentes do pastor, que é inconsistente com os princípios bíblicos do sacerdócio de todos os crentes. Também encoraja as pessoas a focalizar suas necessidades e, assim, impede o crescimento do reino de Deus.

O novo modelo do líder executivo mistura algumas noções bíblicas e adaptação de práticas administrativas seculares. A maioria dos livros sobre crescimento de igreja é constituída basicamente de livros sobre liderança adaptados à igreja.

Porém, muitos perigos nos espreitam atrás desse modelo. Primeiro, ele pode levar o povo a seguir uma personalidade carismática em vez de princípios bíblicos. Segundo, também focaliza necessidades da igreja local, em detrimento da igreja mundial. A ênfase desse modelo se toma a construção da mega igreja em lugar de uma igreja saudável. Finalmente, qualquer modelo que adotemos necessita de fundamento bíblico e teológico.

Assim, o que devemos fazer, como pastores? A resposta pode ser encontrada no ministério de Jesus.

O Novo Testamento revela que Jesus fez cinco coisas, conforme analisaremos a seguir:

As Escrituras nos mostram que Jesus determinou como prioridade máxima de Sua vida o gasto de tempo sozinho com o Pai. Sua vida revela intensa paixão pela presença de Deus. Seu coração anelava e sentia fome de estar em sintonia com o coração de Deus. Note os seguintes incidentes:

  • • “Naqueles dias, retirou-Se para o monte, a fim de orar, e passou a noite orando a Deus” (Lc 6:12).
  • • “E, despedidas as multidões, subiu ao monte, a fim de orar sozinho. Em caindo a tarde, lá estava Ele, só” (Mt 14:23).
  • • “Tendo-Se levantado alta madrugada, saiu, foi para um lugar deserto e ali orava” (Mc 1:35).

A vida de Jesus foi de muita oração. Ele começava e terminava cada dia em relacionamento íntimo com o Pai celestial. Às vezes, passava toda a noite em comunhão. Realmente, Jesus estava sintonizado com Deus durante todo o tempo.

A primeira coisa que Jesus fazia diariamente era encher o reservatório de Seu Ser com a presença do Pai; então, vivia com o Céu em mente ao longo do dia. Administrava Seu tempo movendo-Se do ser para o fazer. Seu Ser estava em constante união com o Pai e experimentando a alegria da filiação divina. Sua conduta estava centralizada em fazer a vontade do Pai. Porque vivia no Pai e o Pai vivia nEle, recebia graça e poder para que Suas obras fossem poderosas e efetivas.

No livro Caminho a Cristo, escreveu Ellen G. White: “Sua humanidade tornou-Lhe a oração uma necessidade, e privilégio. Encontrava conforto e alegria na comunhão com o Pai. E se o Salvador dos homens, o Filho de Deus, sentia a necessidade de orar, quanto mais devemos nós, débeis e pecaminosos mortais que somos, sentir a necessidade de fervente e constante oração!”2

E mais: “Consagrai-vos a Deus pela manhã; fazei disto vossa primeira tarefa. Seja vossa oração: ‘Toma-me, Senhor, para ser Teu inteiramente. Aos Teus pés deponho todos os meus projetos. Usa-me hoje em Teu serviço. Permanece comigo, e permite que toda a minha obra se faça em Ti.’ Essa é uma questão diária. Cada manhã consagrai-vos a Deus para esse dia. Submetei-Lhe todos os vossos planos, para que se executem ou deixem de se executar, conforme o indique a Sua providência. Assim dia a dia podereis entregar às mãos de Deus a vossa vida, e assim ela se moldará mais e mais segundo a vida de Cristo.”3

Quando o pastor mantém uma vida de oração, à semelhança de Jesus, e se submete ao discipulado, prontificando-se a receber informação espiritual, Deus o usará para fazer da igreja um santuário para vidas transformadas, como disse Jesus: “A Minha casa será chamada casa de oração” (Mt 21:13). Assim, a igreja é o instrumento para levar pessoas ao trono da graça, para que elas experimentem a presença de ‘Deus e recebam Seu poder.

Infelizmente, muitos técnicos têm invadido a igreja com programas e idéias, transformando-a em uma instituição humana em lugar do corpo vivo de Cristo. Quando nossa vida está ligada ao Pai celestial, a igreja se torna um santuário de oração, força e habitação da presença do Senhor.

Pregação do evangelho

Frequentemente, Jesus proclamava a mensagem do amor de Deus. Ao descrever Sua missão terrestre, Ele disse: “O Espírito do Senhor está sobre Mim, pelo que Me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-Me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista ao cegos, para pôr em liberdade os oprimidos” (Lc 4:18). Disse Mateus: “E percorria Jesus todas as cidades e povoados, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e enfermidades.” (Mt 9:35).

Todos os dias, Cristo ensinava às pessoas transmitindo-lhes a orientação da Palavra, chamando-as a confessar seus pecados e experimentar nova vida. O ministério da Palavra sempre transforma vidas. Pela Palavra de Deus, o mundo veio à existência e Cristo foi levantado da sepultura. É a Palavra que nos devolve a saúde espiritual e dá sentido à vida. Desde Sua infância, Jesus Cristo desenvolveu intenso amor pelas Escrituras. Ele as aprendeu e ensinou com poder e autoridade (Lc 2:46-50). Seu amor ao Pai O motivava a ler o sagrado livro e aprender qual era a vontade deste.

O pastor deve sempre levar as pessoas a melhor compreensão da Palavra de Deus. Note os seguintes benefícios espirituais vitais que a Palavra de Deus nos outorga: Ela nos dá vida (Fp 2:16), justifica (1Co 15:1, 2), produz crescimento espiritual (lPe 2:2), santifica (Jo 17:7) e nos torna sábios (Sl 119:98).

Apesar disso, com frequência, reduzimos as Escrituras a mera informação. Paulo nos lembra que elas possibilitam nova vida em Cristo Jesus. Também advertiu a Timóteo para que não descuidasse da leitura pública e exposição das Escrituras (lTm 4:13). Na segunda epístola a esse seu companheiro de lutas, o apóstolo lembrou que toda Escritura é divinamente inspirada “e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2Tm 3:16).

“Não é tanto de conhecimento teórico que precisas, mas de regeneração espiritual. Não necessitas satisfazer tua curiosidade, mas ter um novo coração. É necessário que recebas nova vida de cima, antes de te ser possível apreciar as coisas celestiais. Antes que se verifique essa mudança, tornando novas todas as coisas, nenhum salvador proveito tem para ti o discutir comigo Minha autoridade ou missão.”4

É tempo de parar a discussão sobre o que cremos e começar a focalizar que diferença isso faz em nossa vida. Necessitamos de mais renovação espiritual do que conhecimento. Devemos estudar a Bíblia, não para satisfazer curiosidades, mas em busca de um novo coração. Isso resume a essência do poder da Palavra. Cristo não pregou sobre sociologia, política ou psicologia. Ele pregava a Palavra. Por essa razão, Seus ensinamentos continham poder e autoridade.

Satisfação de necessidades

Com frequência, a Bíblia diz que Jesus, ao ver as multidões “compadeceu-Se delas, porque estavam aflitas e exaustas como ovelhas que não têm pastor” (Mt 9:36). Ele amava as pessoas, sabia que Deus Se impor­ tava com os perdidos; portanto, Ele também Se importava com eles.

“Unicamente os métodos de Cristo trarão verdadeiro êxito no aproximar-se do povo. O Salvador misturava-Se com os homens co­ mo uma pessoa que lhes desejava o bem. Manifestava simpatia por eles, ministrava-lhes às necessidades e granjeava-lhes a confiança. Ordenava então: ‘Segue-Me’.”5

O método de Cristo inclui a construção de relacionamentos e satisfa­ção de necessidades. A primeira coisa que Jesus fazia era misturar-Se com as pessoas, manifestando sincero interesse pelo bem-estar delas. Em as­ sim fazendo, Ele tocava seu coração. A segunda coisa que Ele fazia era lhes mostrar simpatia. À medida que fazia isso, reunia-Se com elas em seus afa­zeres diários manifestando interesse em seus negócios seculares. A terceira coisa que o Mestre fazia era ganhar a confiança das pessoas. Depois que construirmos relacionamento, satis­fizermos as necessidades e tocarmos o coração das pessoas com quem entramos em contato, então, podemos convidá-las para seguir a Jesus.

Note os passos progressivos que Cristo deu na tarefa de testemunhar: Começou misturando-Se com os in­divíduos e terminou chamando-os para ser discípulos.

Discipulado

Tão logo iniciou Seu ministério público, Jesus chamou e capacitou doze homens como Seus discípulos – doze homens que deviam defender Sua causa evangelística. De acordo com Robert Coleman, “Sua preocupação não era com programas para alcançar multidões, mas com homens a quem as multidões deviam seguir… Homens eram Seu método de conquistar o mundo para Deus”.6

A sabedoria de Seu método estava centralizada no princípio da utilização desses homens para transformar multidões; não programas nem eventos massivos. Falando teologicamente, essa sempre tem sido a metodologia de Jesus. Ele desafiou Seus discípulos para essa causa, ao dizer: “A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, pois, ao Senhor da seara que mande trabalhadores para a Sua seara” (Lc 10:2).

Cristo está dizendo que temos um problema numérico. Necessitamos de mais trabalhadores, mais discípulos, para fazer a colheita e, assim, fazer discípulos. Nosso papel é orar pela colheita e, especialmente, pelos ceifeiros. O papel de Deus é nos enviar indivíduos que se tornarão novos ceifeiros.

A necessidade de fazer discípulos é tão fundamental que Jesus investiu três anos e meio, em tempo integral, na prática do discipulado. Na verdade, se Ele não tivesse feito discípulos, não haveria igreja hoje.

Serviço e sacrifício

Há duas importantes verdades a respeito de Cristo. A primeira delas é que Ele foi um líder servo. Nenhum estudo sobre liderança cristã estará completo, a menos que estudemos a vida de serviço e sacrifício de Cristo. “Pois o… Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a Sua vida em resgate por muitos” (Mc 10:45). “Pois, no meio de vós, Eu sou como quem serve” (Lc 22:27). O Rei do Universo não estava em busca de autoglorificação, autossatisfação, poder ou domínio. Ele veio para servir, e ministrar às necessidades humanas.

A segunda é que Ele deu Sua vida em sacrifício vivo para nos redimir. Jesus viveu, sofreu e morreu. Da agonia do Getsêmani à morte no Calvário, Deus pagou o preço da nossa redenção. Na realidade, o infinito preço pago por nossa redenção deve nos dar uma ideia de quão valiosos somos para Ele. Cristo declarou: “Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o perdido” (Lc 19:10). Deus Se importa com os perdidos. Desse modo, se eu for um genuíno pastor e discípulo de Cristo, me importarei também com os perdidos. O papel do pastor é instilar esse valor no coração das pessoas em sua congregação.

Essa vida sacrifical se manifesta em dois níveis. O primeiro é a vida de doação de tempo, recursos e da própria vida. O segundo é o de entregar nossa vida em sacrifício, até a morte. Deus nos chama para viver a vida que Jesus viveu. O ministério pastoral não é algo para nos satisfazer egoisticamente, mas para conhecer e servir a Cristo.

O que faz um pastor? Primeiro e acima de tudo, necessitamos aprofundar nosso relacionamento com o Pai, através da oração. Então, seremos capacitados para pregar o evangelho do reino de Deus e formar líderes que se interessam pelas necessidades alheias. Na igreja, a liderança autêntica é caracterizada pelo serviço. Nosso Mestre veio para servir, não para ser servido. Veio para dar Sua vida em sacrifício e nos convida para fazer o mesmo.

Referências:

  • 1 Greg Ogden, Unfinished Business (Grand Rapids, MI: Zondervan, 2003).
  • 2 Ellen G. White, Caminho a Cristo, p. 94.
  • 3 Ibid., p. 70.
  • 4 Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 171.
  • 5 ______________, A Ciência do Bom Viver, p. 143.
  • 6 Robert Coleman, The Master Plano of Evangelism (Old Tappan, NJ: Spire Books, 1963), p. 21.