O que podemos aprender sobre reavivamento, a partir do que aconteceu em South Lancaster? Como experimentar novamente e reproduzir o que ocorreu ali?

Ao longo dos últimos anos, a Igreja Adventista do Sétimo Dia tem enfatizado o reavivamento, em consonância com a declaração feita por Ellen G. White, por volta de 1887: “Um reavivamento da verdadeira piedade entre nós, eis a nossa maior e mais urgente necessidade.”1 Mas o que é realmente esse reavivamento? Como identificar os frutos do reavivamento? E o mais importante: O que deve acontecer para que possamos finalmente perceber o reavivamento que Deus deseja que experimentemos?

A experiência vivenciada por Ellen G. White pode nos ajudar a compreender e avaliar os movimentos atuais de reavivamento. Aproximadamente dois anos depois de apelar para houvesse um genuíno reavivamento entre o povo de Deus, ela comentou sobre um dos mais gloriosos eventos que a deixou tão eufórica a ponto de exclamar: “Parecia-nos estar respirando a própria atmosfera do Céu.”2 Na verdade, ela nem conseguiu dormir à noite, regozijando-se com o fato de que “Deus havia visitado Seu povo”.

Embora esse reavivamento não tenha sido o último do qual ela participou, talvez a análise de seu testemunho possa nos ajudar a redescobrir sua experiência e a pedir por aquilo que aconteceu naquele dia.

Reuniões em South Lancaster

Logo após a controversa assembleia geral realizada em Mineápolis, em 1888, Ellen G. White uniu-se a A. T. Jones e E. J. Waggoner a fim de ajudá-los a divulgar a mensagem que haviam apresentado. Segundo ela, “a luz que deveria iluminar toda a Terra com seu resplendor foi rejeitada” em Mineápolis, e “pela atitude de nossos próprios irmãos tem se conservado, em grande medida, afastada de todo o mundo”.3
A mensagem que ela levava estava “em estreita harmonia com a própria mensagem” que Jones e Waggoner apresentavam.4 O primeiro lugar em que eles pregaram foi South Lancaster, Massachusetts, Estados Unidos.

As reuniões, iniciadas em 11 de janeiro de 1888, estavam previstas para durar três dias. No entanto, o Espírito Santo tinha outros planos. “A poderosa atuação do Espírito de Deus estava lá”, comentou Ellen G. White.5 “Cada um desejava […] testemunhar”, ela acrescentou.6 Isso levou os administradores a fechar o colégio durante o período em que se estenderam as apresentações. “Os alunos foram envolvidos por uma atmosfera celestial tão intensa, que os testemunhos dados superaram até mesmo os depoimentos de 1844 antes do desapontamento. Aprenderam o que significa render o coração a Deus e estar convertido.”7

Assim, a conferência prevista para durar três dias foi transformada num evento de dez dias. Os participantes ficavam reunidos desde as primeiras horas da manhã até tarde da noite. A. T. Jones apresentou suas mensagens, duas ou três vezes por dia.8 Ellen G. White ficou encarregada de apresentar as mensagens devocionais da manhã e pregou o sermão no sábado. “Eu nunca vi uma obra de reavivamento avançar com tamanha profundidade”, ela lembrou.9

Mas, o que fez com que as reuniões fossem tão eficazes a ponto de os administradores fecharem a escola? Que mensagem foi compartilhada que levou os participantes a declarar que eles haviam “obtido uma experiência além de qualquer coisa que haviam visto antes?”10

Lições aprendidas

Ellen G. White falou em várias ocasiões a respeito da experiência vivida em South Lancaster, obviamente, desejosa de que tal evento de repetisse em outros lugares também. Cada um dos presentes pôde sentir que “os anjos do Senhor circulavam ao redor daquele ambiente”.11 Tendo como base uma série de artigos que ela e S. N. Haskell escreveram relatando o evento e os sermões que ela pregou durante aquelas reuniões, podemos unir algumas peças para construir um quadro do que foi apresentado ali.12

Quando se examina a evidência de South Lancaster, o segmento principal, apresentado ao longo das várias reflexões de Ellen G. White é a grande ênfase que foi colocada sobre o amor, o perdão a misericórdia e a graça de Deus. “O conhecimento do amor de Deus é o conhecimento mais eficaz a se obter.”13 Com essas palavras, ela iniciou seu sermão no sábado pela manhã, dia 19 de janeiro, e continuou: “Estou ansiosa para que todos desfrutem da misericórdia e do amor de Jesus. Quanto mais falarmos de Seu amor e poder, mais teremos para dizer de Sua ternura, compaixão e verdade.” Continuando, ela perguntou: “Por que nosso coração tem sido tão insensível ao amor de Deus? Por que fazemos tão duro julgamento de nosso Pai celestial? Segundo a luz que me foi dada, sei que Satanás tem deturpado o caráter de Deus, de todas as formas possíveis. Lançou sua sombra infernal atravessando nosso caminho, impossibilitando-nos de ver Deus como um Ser pleno em misericórdia, compaixão e verdade.” Então, apelou: “Existe algum coração aqui que não irá se render ao amor de Jesus?”14

Essas novas foram como música aos ouvidos dos participantes. “Eles enxergaram Cristo como “um Salvador que não está longe, mas sim, ao alcance de todo aquele que O procura”.15 Muitos “testemunharam da alegria de que Cristo havia perdoado seus pecados… e sentiram que podiam descansar no amor de Deus”.16

No primeiro sábado à tarde, dia 12 de janeiro, Ellen G. White ficou feliz por ter tido a liberdade de falar sobre a “necessidade de obedecer à lei de Deus”, e a importância de termos a “fé genuína que opera por amor”.17 Ela destacou a lei como a perfeita norma de justiça, e convenceu muitos participantes de que eles eram transgressores dessa lei. “Muitos têm confiado em sua própria justiça”, ela comentou. “Agora, eles a veem como trapos imundos, em comparação com a justiça de Cristo, a única aceitável a Deus.”18

A junção da lei com o amor de Deus é o que Ellen G. White frequentemente mencionou como a “lei e o evangelho caminhando lado a lado”.19 Sendo a lei de Deus o padrão perfeito pelo qual a humanidade é julgada, e pelo fato de a obediência meramente humana não ser aceita por Deus, os seres humanos estão condenados por seus pecados e, assim, preparados para receber a justiça de Cristo. O coração é transformado pelo amor, perdão e pela graça de Deus, e entra em comunhão com Ele. Sendo que o coração foi transformado, Cristo pode então viver Sua vida no pecador.

Isso não era um paradigma tão difícil de experimentar, no entanto, Ellen G. White, A. T. Jones e E. J. Waggoner não promoveram tal mentalidade. Ellen G. White, por exemplo, mencionou em seu sermão do último sábado daquelas reuniões: “Há aqueles que acham que devem se tornar um pouco melhores antes de ir a Jesus. […] Mas não podemos fazer isso. Nossa única esperança é olhar e viver.”20Refletindo sobre aquelas reuniões, ela comentou a respeito dos participantes: “Eles estavam lutando para se abster do pecado, mas confiavam em sua própria força.” Tais tentativas eram inúteis. Portanto, ela convidou todos a “ir para Jesus, assim como estavam, confessar seus pecados, e lançar-se desamparados sobre nosso compassivo Redentor”.21 Quando vamos a Jesus, em seguida, “podemos ficar em paz, acreditando que o que Deus prometeu, Ele é capaz de cumprir”.22

Os frutos

Repetidamente, Ellen G. White falou do “poder de Deus [que] assistiu à mensagem onde quer que ela fosse pregada”.23 Em vez de ser apenas um poder sentimental que “fazia cócegas” nas emoções das pessoas, muitos eram convertidos e se reconciliavam um com o outro. “Eles foram transformados, refletindo essa mudança através de sua própria imagem.”24 Confissões foram feitas, erros foram consertados, o eu foi crucificado, corações que estavam separados voltaram à harmonia um com o outro. Isso aconteceu porque “o plano de salvação ficou tão claro que mesmo uma criança em sua simplicidade podia entendê-lo”.25 Ellen G. White disse: “Não se poderia convencer aquelas pessoas em South Lancaster, de que aquela não era uma mensagem de luz que tinha vindo diretamente para elas.”26

Curiosamente, esses resultados não eram forçados. As reuniões transcorreram “livres de toda euforia indevida. Não houve nenhum apelo nem convite. As pessoas não foram chamadas para ir à frente”.27

Poucas semanas depois, escrevendo para a Review and Herald, S. N. Haskell destacou o mesmo fato em uma das mais profundas reflexões sobre aquelas reuniões. Ele mencionou o seguinte: “O grande desejo manifesto era pela pureza de coração. Todos pareciam compreender que estávamos sob o juízo investigativo, e que tudo devia estar bem com Deus e entre os irmãos. A obra foi profunda e completa. Houve grande espontaneidade nas confissões apresentadas, o que raramente é testemunhado, e nada era forçado. Nenhuma pressão foi exercida sobre os participantes. Quando os pecados foram confessados, cânticos de louvor e ações de graças se seguiram de forma revivificadora. Foram ouvidas expressões como: ‘Eu nunca havia experimentado nada parecido com isso’; ‘parece que temos um novo evangelho’; ‘eu nunca havia entendido o amor de Deus assim como foi apresentado aqui’. A impressão solene que ficou para muitos era a de que aquilo era apenas algumas gotas do que será experimentado por aqueles que desempenharem seu papel no fechamento da obra de Deus – o alto clamor da terceira mensagem angélica, que irá amadurecer o grão para a colheita.”28

Esse autoexame profundo e essas confissões somente puderam acontecer porque aquelas pessoas tiveram a certeza do perdão divino para seus pecados. Haskell concluiu seu artigo com as seguintes perguntas para reflexão: “Será realmente verdade que estamos recebendo o derramamento do Espírito Santo, o qual irá crescer em poder e extensão até atingir o alto clamor da mensagem do terceiro anjo? Será que compreendemos que estamos no limiar do tempo de provas e das cenas do mundo eterno?” Quase sem acreditar em si mesmo, ele exclamou: “Estas coisas são verdadeiras!”

No encerramento daquelas reuniões, 17 pessoas foram batizadas, e muitas outras saíram dali com o mesmo desejo.

Reavivamento hoje

Alguns poderiam argumentar que o ambiente em que se encontrava o adventismo, mais de 120 anos atrás, foi totalmente mudado, e o que foi relevante para nossos irmãos em South Lancaster não é importante para nós hoje. Porém, creio que Ellen G. White discordaria disso. Eles difundiram a mensagem do amor de Jesus e da justificação pela fé em Cristo não apenas em South Lancaster, mas também em inúmeras cidades nos meses seguintes ao do reavivamento. Essa ênfase dupla o protegeu contra os extremos do legalismo – de tentar estabelecer sua justiça própria e merecer o amor divino – e do liberalismo – de proclamar que Deus nos ama tanto que não Se importa com o que fazemos. Tal equilíbrio ainda é necessário e relevante para nós hoje.

Um ano depois das reuniões em South Lancaster, Ellen G. White compartilhou esta reflexão: “Essa mensagem, assim como foi apresentada, deveria estar em cada igreja que afirma crer na verdade e levar nossos irmãos a alcançar um nível mais elevado.”29 Lamentavelmente, seu desejo ainda não havia sido realizado completamente.30

O que podemos aprender sobre reavivamento, a partir do que aconteceu em South Lancaster? Como podemos novamente experimentar e reproduzir o que ocorreu ali? Para começar, pensando no adágio popular, “não podemos dar o que não temos”. Portanto, nós mesmos precisamos estar intimamente familiarizados com o verdadeiro evangelho que tocou o coração de Ellen G. White. Para que isso aconteça, podemos ler, por exemplo The Glad Tidings e Christ and His Righteouness, de E. J. Waggoner,31 ou, mais frequentemente, o livro Caminho a Cristo, da própria Ellen G. White. Estudar a Bíblia e, em suas páginas, buscar Cristo e “Este crucificado”.

Quando formos contagiados pela mensagem do ilimitado amor de Cristo e de Sua poderosa graça, isso será refletido em nossa pregação. Encontraremos maneiras para pregar sobre todos os assuntos: mordomia cristã, profecias, saúde, qualquer que seja o tema, através das lentes deste evangelho motivador.

O que aconteceria se, em nossos concílios pastorais e assembleias, dedicássemos mais tempo ao estudo desses temas? Se realizássemos um retiro espiritual de dois ou três dias, para aprofundar nosso conhecimento nesse assunto, o qual, como bem expressou Ellen G. White, “vai absorver todos os outros”?32 Temos experimentado isso nos últimos anos em nossa Associação (Nordeste da Nova Inglaterra, Estados Unidos). Como pastores, temos passado alguns dias em nosso acampamento durante o outono, simplesmente orando e juntos estudando a Bíblia. Para nós, eles têm sido doces e emocionantes momentos de comunhão que nos deixam reavivados, revigorados e mais bem preparados para apresentar o Pão da vida aos membros de nossas igrejas.

Quando cada um de nós experimentar um reavivamento por meio dessas experiências, contagiaremos os irmãos em nossas igrejas e avançaremos para a vitória, desfrutando o reavivamento pleno e final que Deus ansiosamente deseja que experimentemos. 

Referências:

  • 1 Ellen G. White, Review and Herald, 22 de março de 1887, p. 177.
  • 2 _______________ , Ibid., 5 de março de 1889, p. 146.
  • 3 The Ellen G. White 1888 Materials (Washington, DC: Ellen G. White Estate, 1987), v. 4, p. 1575.
  • 4 Ibid., v. 2, p. 542.
  • 5 Ibid., p. 543.
  • 6 Ellen G. White, Review and Herald, 5 de março de 1889, p. 146.
  • 7 _______________ , “Draw Nigh to God”, Review and Herald, 4 de março de 1890.
  • 8 Com base nos dados disponíveis, não me parece que E. J. Waggoner estivesse presente nas reuniões em South Lancaster.
  • 9 Ellen G. White, Review and Herald, 5 de março de 1889, p. 146.
  • 10 Ibid.
  • 11 Ibid.
  • 12 Para material auxiliar sobre o assunto, acesse http://www.adventistarchives.org/docsRH/RH18890129-V66-05_B/index.djvu.
  • 13 Ellen G. White, Review and Herald, 5 de março de 1889, p. 145.
  • 14 _______________ , Ibid., 26 de fevereiro de 1889, p. 129.
  • 15 _______________ , Ibid., 5 de março de 1889, p. 145.
  • 16 Ibid., p. 146.
  • 17 Ibid., p. 145.
  • 18 Ibid., p. 146.
  • 19 Ver 1888 Materials, v. 1, p. 217.
  • 20 Ellen G. White, Review and Herald, 26 de fevereiro de 1889, p. 130.
  • 21 _______________ , Ibid., 5 de março de 1889, p. 146.
  • 22 Ibid., p. 145.
  • 23 Ellen G. White, Review and Herald, 18 de março de 1890, p. 161.
  • 24 _______________ , Ibid., 5 de março de 1889, p. 146.
  • 25 1888 Materials, v. 1, p. 371.
  • 26 Ellen G. White, Review and Herald, 18 de março de 1890, p. 161.
  • 27 _______________ , Ibid., 5 de março de 1889, p. 146.
  • 28 S. N. Haskell, Review and Herald, 29 de janeiro de 1889, p. 73.
  • 29 Ellen G. White, Ibid., 18 de março de 1890, p. 161.
  • 30 Ver Ron Duffield, The Return of the Latter Rain: A Historical Review of Seventh-day Adventist History From 1844 Through 1891 (n.p.: 4th Angel, 2010).
  • 31 E. J. Waggoner, The Glad Tidings (Oakland, CA: Pacific Press, 1900); Christ and His Rightneousnes (Oakland, CA: Pacific press, 1890).
  • 32 Ellen G. White, Review and Herald Extra, 23 de dezembro de 1890, p. 2.