Ao anunciarmos o evangelho, proclamamos o triunfo do orgulho sobre a busca de status 

No livro de Miquéias, assim está escrito: “Ele te declarou, ó homem, o que é bom e que é o que o Senhor pede de ti: que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus” (Mq 6:8).

Um nervoso estudante de teologia parou em frente ao meu escritório e, com mil pensamentos fervilhando na mente, bateu à porta. Ele sabia o que o aguardava lá dentro. Poucos dias antes, ele havia pregado com toda a força do seu ser, na aula de homilética diante dos colegas e de uma câmera de vídeo. Agora, do outro lado daquela porta, seria submetido a julgamento. Em minha presença, ele poderia ver seu desempenho na exibição do vídeo.

Nesse momento, até os mais autoconfiantes batem timidamente à porta. Uma vez assentados diante do monitor, liguei o aparelho durante alguns minutos e convidei o aluno a se avaliar. Nessa circunstância, alguns mantêm os braços agarrados à cadeira, como se estivessem prontos para ser executados. Outros colocam as mãos na cabeça. Um deles certa vez gritou: “Este não sou eu!” Ocasiões como essa, produzem humildade quase universal.

Mas, um dia, um jovem estudante, cheio de alegria no Senhor, veio fazer sua auto-avaliação. Sentou-se e começou a assistir ao seu sermão no monitor de vídeo, sempre balançando afirmativamente a cabeça. Às vezes, respondia com sonoros “améns” à própria mensagem, mostrando-se claramente abençoado. Terminada a apresentação, perguntei: “Como você avalia este seu trabalho?” Radiante, ele se virou para mim e disse: “Excelente! Absolutamente fantástico!”

Agora, nos voltemos para outra cena de orgulhosa auto-avaliação. O rei Nabucodonosor II, de Babilônia, está de pé em seu canto favorito – o terraço no jardim de seu suntuoso palácio, justamente ao lado dos jardins suspensos de Babilônia. E enquanto ele permanece ali, seus olhos escanerizam o horizonte. A dupla muralha se estende por 27 quilômetros, cercando sua capital. Do palácio, seus olhos vagueiam pelo sagrado caminho processional; um quilômetro distante, seus muros estão cobertos por tijolos esmaltados, refletivas telhas azuis, e decorados com 575 animais mitológicos. E então, sobre a grande cidadela de Esagila, ergue-se o templo ao deus Marduque, o zigurato de Etemenanki erguido 90 metros no ar. Uma ponte de 130 metros estende-se sobre o rio Eufrates. Tudo isso, sem mencionar outros três palácios e 53 templos.

Contemplando essa grandeza, o rei diz: “Não é esta a grande Babilônia que eu edifiquei para a casa real, com o meu grandioso poder e para glória da minha majestade?” (Dn 4:30). Você pode até pensar que não existe nenhuma ligação entre essa narrativa e o ministério pastoral. Porém, os relatos dos primeiros capítulos de Daniel apresentam a importância da espiritualidade para líderes que são usados por Deus. Em outras palavras, são relatos significativos para os pastores de hoje.

Remédio para o orgulho

Nabucodonosor tomou Jerusalém. Ou, dizendo melhor, o Senhor entregou Jerusalém em suas mãos, como afirmou Daniel. Mas, no estágio em que se encontrava, Nabucodonosor não podia ver isso, pois ainda não tinha se encontrado com o Senhor. Ao contrário, ele acreditava que seu poder e seus esforços o tinham levado ao sucesso. Encheu-se com o orgulho da auto-realização.

Nabucodonosor sonhou com uma imensa e assombrosa estátua feita com muitos metais. Sua cabeça era de ouro, o ouro de Babilônia. Porém, como todo ídolo construído pelo homem, a imagem foi despedaçada por uma pequena pedra, lançada sem mãos. A pedra do reino de Deus. Nessa ocasião, Nabucodonosor apenas tinha ouvido a respeito de Deus; nada mais. E o destroçamento da imagem pouco representou para ele.

A resistência de Nabucodonosor à humildade não foi detida. Assim, ele construiu uma imagem inteiramente de ouro. Medindo 30 metros de altura, essa imagem só foi superada pelo legendário Colosso de Rodes, uma das maravilhas do mundo antigo que tinha 35 metros de altura. O tamanho daquela imagem dourada reacendeu o orgulho de Nabucodonosor. Mas, ao observar a fornalha em que lançou três jovens que não quiseram curvar-se a ela, e ver caminhando com eles uma terceira figura “semelhante a um filho dos deuses”, a verdade começou a raiar em seu coração, e nada mais.

Novamente, Nabucodonosor teve um sonho. Nesse sonho ele viu uma árvore que era uma representação dele mesmo. Seu tamanho mais uma vez acendeu o orgulho do rei. De fato, a árvore era enorme: seu topo alcançava o céu, “e era vista até os confins da Terra” (Dn 4:11 ). Isso explicava o orgulho do monarca babilônico – “Não é esta a grande Babilônia?”

Nos episódios anteriores, quando Nabucodonosor sitiou Jerusalém, ele era ignorante a respeito de Deus. Porém, ouviu sobre Deus, quando Daniel interpretou o sonho da imagem multi metálica, depois viu as obras de Deus, quando os três amigos caminhavam na fornalha sem que tivessem queimado um só fio de cabelo. Mas, nesse episódio, o rei experimentou Deus. Qual foi o fator que o levou a tal experiência? Humildade.

Eis aqui um sábio pensamento para nós, como pastores. Corremos o perigo de oscilar entre dois extremos: por um lado, alimentando autocongratulação e orgulho, ou a síndrome de Nabucodonosor: “Não são estes meus candidatos ao batismo, minha congregação quetenho construído e nutrido? Não é esta a minha igreja?” Por outro lado, podemos experimentar depressão – não cumprindo o que a igreja espera de nós: damos poucos estudos bíblicos e colhemos poucos batismos, alimentamos dúvidas a respeito do nosso chamado, mantemos relacionamento difícil com os membros, demandas do presidente da Associação, etc. O antídoto para os dois extremos de orgulho e depressão é humildade. A humildade de Nabucodonosor e sua árvore.

A árvore

Nabucodonosor, o grande suserano do Império de Babilônia é representado pela árvore com a qual ele sonhou. A primeira lição dessa árvore para nós está relacionada com seu tamanho (Dn 4:10, 11). Era imensa, assim como a imagem metálica do capítulo 2 que representava os impérios do mundo. Mas, a humilde rocha do reino de Deus despedaçou esses altaneiros impérios, pois, no reino de Deus, grandeza não é importante.

Talvez fosse isso que Cristo tinha em mente quando falou: “O reino dos céus é semelhante a um grão de mostarda, que um homem tomou e plantou no seu campo; o qual é, na verdade, a menor de todas as sementes, e, crescida, é maior do que as hortaliças, e se faz árvore, de modo que as aves do céu vêm aninhar-se nos seus ramos” (Mt 13:31, 32).

É interessante notar que Jesus chama o pé de mostarda de “árvore”, o que poderia ser exagero. O pé de mostarda não é árvore. Mas, Ele assim o chama porque Seus olhos estão no Antigo Testamento. E talvez, particularmente, no capítulo 4 do livro de Daniel e outros lugares em que árvores representam reinos. No sonho de Nabucodonosor, o reino de Babilônia é apresentado como uma árvore cuja altura chegava até o céu e abrigava aves em seus ramos. No livro de Ezequiel, a Assíria é como um imenso cedro do Líbano com aves nos ramos (Ez 31:3-6). E Cristo disse que o reino de Deus é como uma semente de mostarda, também com aves aninhadas em seus ramos.

Contudo, o grão de mostarda representativo do reino de Deus é muito insignificante em tamanho, perto da árvore de Nabucodonosor, que podia ser vista até os confins da Terra ou do altaneiro cedro do Líbano que era a Assíria. Justamente como a humilde pedra do reino de Deus era diminuta diante da imensa imagem multi metálica. Esse é o lado surpreendente do reino de Deus. Ele chega de modo surpreendente, não como uma altíssima árvore, mas como humilde planta de um jardim. Pois, o reino de Deus não será esmagado pelos impérios humanos nem é construído pelo poder e autoridade humanos. Na verdade, é uma aventura de fé.

Muitos de nós somos pastores de igrejas pequenas, de modo que podemos ser tentados a pensar ou dizer: “Conheço tudo a respeito de humildade”. A primeira congregação que pastoreei era composta de três senhoras: uma tocava o piano, outra recolhia a oferta e a outra dormia durante todo o sermão. Ali cheguei ostentando o título de mestre em Divindade, e pensando que estava aprendendo a ser humilde. Mas a história de Nabucodonosor é mais profunda, mais significativa que a minha. A árvore de seu sonho era grande e forte, justamente como o rei dizia: “Não é esta a grande Babilônia?” Ele absorveu todo o poder e glória de seu reino, em apenas um momento.

Houve Alguém que experimentou isso no passado. Foi conduzido a um lugar alto e viu todos os reinos do mundo em um instante. Observou a glória imperial de Babilônia, Pérsia, Grécia, Roma, China, dos Astecas, Zulus, França, Inglaterra e Estados Unidos. E foi tentado a aceitar os princípios dos reinos do mundo: “Levou-O ainda o diabo a um monte muito alto, mostrou-Lhe todos os reinos do mundo e a glória deles e Lhe disse: Tudo isto Te darei se, prostrado, me adorares. Então, Jesus lhe ordenou: retira-te, Satanás, porque está escrito: Ao Senhor, teu Deus, adorarás, e só a Ele darás culto” (Mt 4:8-10). A resposta de Cristo mostrou que Seu evangelho está baseado não em orgulho e ambição humanos, mas em humilde fé em Deus.

Finalmente, isso foi o que Nabucodonosor aprendeu, quando seu orgulho foi abatido. Essa experiência de Nabucodonosor estabelece o cenário para todo o restante do livro de Daniel. Grandes cidades caem, ídolos imensos são destruídos, espantosos animais são abatidos, chifres presunçosos são arrancados, árvores frondosas são cortadas. Todos eles receberam o devido galardão, porque não assimilaram a lição aprendida por Nabucodonosor: o dom da humildade.

Deus humilde

Mas, em que ponto queremos chegar? Qual é o aspecto essencial da humildade? O que tudo isso nos diz? A meu ver, o aspecto essencial da humildade não é o fato de conhecermos que Deus é eterno, onipotente, onisciente ou sermos subjugados por Sua grandeza. Certamente, podemos fazer isso. Entretanto, humildade significa muito mais, porque é um dos mais proeminentes e mais esquecidos atributos de Deus. Nosso Deus é humilde. E, ao exercitarmos humildade, experimentamos algo que é dEle. Ao exercitarmos humildade, nos aproximamos ainda mais do Seu coração.

De fato, a Bíblia apresenta a majestade de Deus. Isaías viu o Senhor assentado em um alto e sublime trono, e a orla de Seu manto encheu o templo. Passagens assim tornam a humildade de Deus ainda mais empolgante.

Por Seu modo de agir, Cristo exemplificou a humildade. “Não tinha aparência nem formosura; olhamo-Lo, mas nenhuma beleza havia que nos agradasse. Era desprezado e o mais rejeitado entre os homens; homem de dores e que sabe o que é padecer; e, como um de quem os homens escondem o rosto, era desprezado, e dEle não fizemos caso.” (Is 53:2, 3). “Sabendo este que o Pai tudo confiara às Suas mãos, e que Ele viera de Deus, e voltava para Deus, levantou-Se da ceia, tirou a vestimenta de cima e, tomando uma toalha, cin-giu-Se com ela. Depois, deitou água na bacia e passou a lavar os pés aos discípulos e a enxugar-lhos com a toalha com que estava cingido” (Jo 13:3-5).

Qual foi, finalmente, a lição aprendida por Nabucodonosor? O rei Nabucodonosor II, grande suserano do Império Neo-Babilônico, aprendeu humildade tomando a forma de boi (Dn 4:33-37). Mas, Cristo, “subsistindo em forma de Deus …a Si mesmo Se esvaziou, assumindo a forma de servo” (Fp 2:6, 7). Quando Nabucodonosor experimentou humildade, aproximou-se do coração de Deus. Este evangelho de humildade necessita de pastores humildes. Porque, ao experimentarmos humildade, também somos aproximados do coração de Deus.

Alguns anos atrás, cuidei de uma pequena igreja, com aproximadamente 50 membros, na costa leste dos Estados Unidos. Em nossa unidade da Escola Sabatina, ocasionalmente recebíamos um visitante que era um velho amigo. Ele não era membro da igreja, mas tinha interesse nas coisas de Deus. Pessoa modesta, discreta, de fala mansa, participava discretamente do estudo da lição da Escola Sabatina. Chamava-se John. Certo dia, depois da programação da igreja, fomos conversar. Estavam acontecendo os jogos olímpicos, e eu perguntei se ele tinha visto alguma competição.

“Um pouco”, ele respondeu.

“Você gosta de atletismo?”, perguntei, ao que ele respondeu: “Sim. Quando eu era mais jovem, participei de competições.”

“Não diga! Você já participou oficialmente de alguma corrida?”, continuei. Ele disse: “Um pouco”.

“Qual foi sua maior conquista?”, insisti, para me surpreender com a resposta: “Bem, acho que foi quando ganhei a medalha de ouro na Olimpíada de 1936.”

John. John Woodruff, vencedor da corrida dos 800 metros, em apenas 52 segundos e nove décimos, nos jogos olímpicos de 1936, em Berlim. John Woodruff: membro da Escola Sabatina e campeão olímpico. E se eu não tivesse perguntado, não ficaria sabendo.

Vitória sobre o orgulho

Como você percebeu no início deste artigo, dou aulas de Homilética. Por isso, freqüentemente sou interrogado: “Qual é a qualidade mais importante para alguém se tornar bom pregador?” Na maioria das vezes não sei o que dizer. Há tantas qualidades necessárias! Mas, e a mais importante? Recentemente, compreendí qual é: humildade. Humildade para levar a pregação a sério. Humildade para aceitar a autoridade das Escrituras. Humildade para aceitar que o Espírito Santo opera mais através de profundo estudo e intenso preparo em vez de tentar obtê-lo, rapidamente, sábado pela manhã. Humildade para aceitar que nossas congregações necessitam não de nossa inteligência, nem de anedotas triviais, ou surrados clichês, mas do fruto de nossa labuta com as Escrituras e do fruto de nossa experiência espiritual.

Quando proclamamos o evangelho de Jesus Cristo, anunciamos o triunfo da humildade sobre o orgulho e a busca por status. Necessitamos orar em favor da vitória da humildade em nosso pastorado.

“Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois Ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a Si mesmo Se esvaziou, assumindo a forma de servo, tomando-Se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a Si mesmo Se humilhou, tomando-Se obediente até à morte e morte de cruz” (Fp 2:5-8).

Sim, Cristo Jesus nos mostrou, em Sua própria vida, o que Miquéias escreveu. Ele nos mostrou o que é bom. E o que o Senhor requer de nós? Que pratiquemos a justiça, amemos a misericórdia, e andemos humildemente com nosso Deus.