(Sermão de Formatura Pronunciado na Andrews University em 7 de junho de 1975)

Presidente Hammill

Membros da Faculdade Formandos de 1975

Aceitei o convite para participar das alegrias e emoções deste programa de formatura, como uma homenagem desta Universidade à lealdade e dedicação dos ministros da América do Sul aos ideais da mensagem adventista do sétimo dia. Este maravilhoso exército de pregadores da bendita mensagem na América do Sul, está representado pelo orador desta manhã.

Formandos, há muitas maneiras de dizer adeus. Com um gesto da mão a um amigo que passa; com um sorriso expressando apreciação, afeição e amor; com os olhos, quando as palavras são impossíveis e desnecessárias. Mas o adeus que dizeis a este campus não é um adeus com mãos, com os lábios ou com os olhos. É um adeus com o coração. Um adeus que brota do profundo da alma e se derrama em reconhecimento, em gratidão e amor.

Estou certo de que dizeis adeus a vossos professores e colegas com um cordial aperto de mão; com sorrisos que procuram externar felicidade, e com palavras que são quase insuficientes para dissimular a tristeza e a emoção do adeus.

Mas é com o coração que dizeis adeus à Andrews University, onde tendes vivido parte de vossa vida, um período de vossa radiante e promissora existência. É com o coração que vos despedis de companheiros com quem tendes partilhado horas felizes e venturosas. É com o coração que ireis dizer adeus a professores que, com eficiência e dedicação, guiaram vossos passos.

Deixamos um pouco de nós mesmos em todo lugar por onde passamos. Neste recinto onde permanecemos por poucas horas, deixamos, talvez, em cada canto, uma recordação que nos deixa um pouco mais velhos. Numa deslumbrante cena pintada pela Natureza durante uma inesquecível viagem; na interpretação de uma peça musical que nos faz vibrar com profunda emoção; sim, em tudo e em todo lugar deixamos um pouco de nós mesmos.

Dentro de poucas horas estareis deixando esta Universidade para dardes início a uma nova vida, mas nas classes de aula desta instituição uma parte de vós, um fragmento de vossa existência, permanecerá. Talvez alguns de vós não possam no momento avaliar o que isto representa. Dia virá, no entanto, em que estas paredes, estas janelas, este coral, esta capela, estes arredores e edifícios serão para vós uma lembrança sagrada e terna.

Hoje, entretanto, podeis sentir que o adeus que dais a este campus, aos vossos colegas e professores, não é um adeus de indiferença, mas de profunda emoção, o adeus de um coração pleno de gratidão e reconhecimento por tudo que tendes recebido aqui.

Hoje, este dia de solene festividade é, portanto, para cada um de vós, um dia de mistos sentimentos, dia de tristeza, de alegria e de esperança.

Eu trairia minha consciência e o mandato que recebi de vossa faculdade se tão-somente enaltecesse vossos sentimentos durante esta hora, sem mencionar os grandes problemas que perturbam o mundo em nossos dias. Começais um novo estágio de vida num momento em que o mundo enfrenta a crise dos séculos. O tempo em que vivemos é dos mais tenebrosos da História. Nações e continentes estão ameaçados pelo holocausto atômico. Nuvens carregadas de tormenta cobrem o horizonte das esperanças humanas. Recuso-me a dar a este sermão uma conotação apocalíptica. Não desejo que minhas palavras sejam como a mão sobrenatural que no festim de Belsazar escreveu as misteriosas palavras que selaram a ruína e a queda de um grande império. Mas eu seria insincero e até mesmo incoerente se nesta hora de apreensões e temores vos falasse tão-somente das alegrias da vida, anunciando “paz e segurança”.

As seguintes palavras são transcritas da inspiração:

“Estamos no limiar da crise dos séculos. Em rápida sucessão os juízos de Deus se seguirão uns aos outros — fogo, inundações e terremotos, com guerra e derramamento de sangue. Não nos devemos ser surpreendidos neste tempo por eventos a um tempo grandes e decisivos; pois o anjo de misericórdia não pode ficar muito tempo mais a proteger os impenitentes”. — Profetas e Reis, p. 278.

“As transgressões quase já alcançaram o seu limite. A confusão enche o mundo, e um grande terror logo deverá sobrevir aos seres humanos. O fim está muito próximo. Os que conhecemos a verdade devemos estar nos preparando para o que logo desabará sobre o mundo como esmagadora surpresa”. — 8 T, p. 28.

Haveria necessidade de eu sublinhar a exatidão dessas predições? A massa média do povo é acumulada cada dia com notícias que descrevem as feridas morais de uma sociedade corrupta e pervertida. Há ódio concentrado no coração humano. Há flamas do mal devorando as almas. Há um vendaval de insanidades sacudindo os fundamentos de nossa estrutura social. Uma nova geração com sua surpreendente rebelião contra o status quo, com sua incompreensível revolta contra a ordem existente, está agora desafiando algumas das instituições mais tradicionais como o lar, a escola, a igreja, a sociedade e os tribunais. Com efeito, esta é uma hora de crise.

Tendes perante vossa consciência, formandos, nesta hora de crise, um solene dever a cumprir e uma grande tarefa a desempenhar. Não tendes o direito de serdes inúteis. Não tendes o direito de viver somente para o que é trivial, fútil, banal. Não tendes o direito de encher vossa existência com inutilidades inventadas apenas para satisfazerem uma existência ociosa. Deveis viver para a glória de Deus e o bem da humanidade.

Que mensagem poderia eu deixar convosco hoje? No livro de Atos, cap. 13, verso 22, lemos o seguinte: “Achei a Davi, filho de Jessé, homem segundo o Meu coração, o qual fará toda a Minha vontade”. Este texto sugere a idéia de Deus procurando por um homem que promovesse os Seus planos relacionados com Israel. O reino não estava consolidado. Pairando sobre Israel estava a ameaçadora sombra da desintegração nacional. As nações vizinhas estavam se tornando mais poderosas, os corruptos costumes de Israel conspiravam contra os planos de Deus.

Saul, o primeiro rei nacional, havia falhado como estadista e guia espiritual do reino. Impelido por impulsos neuróticos, torturado por paixões tempestuosas, ele se afastou de Deus, precipitando o fim de sua vida de modo dramático.

Era necessário agora eleger outro rei, mais leal, mais fiel e temente a Deus. Entre os milhões de Israel e os milhares de Judá, Deus encontrou um homem, desconhecido pastor e humilde harpista, nas verdejantes montanhas de Belém, cuidando do rebanho de seu pai. Exultante, Deus exclamou: “Achei a Davi . . .”!

Através dos séculos Deus tem estado a procurar homens. Um dia, faz muito tempo já, Ele procurava um homem que estabelecesse o Seu povo peculiar, e em Ur dos caldeus, ao sul de Babilônia, Ele encontrou a Abraão. O Livro inspirado nos diz que Abraão, o pai de uma grande nação, satisfez completamente aos desejos, propósitos e ideais de Jeová.

Tempos depois, ao procurar um homem que organizasse o Seu povo em nação, que lhe desse leis e o conduzisse à terra prometida, nos pacíficos e majestosos arredores de Midiã Ele encontrou a Moisés. Embora de palavra difícil e pesado de língua, Moisés realizou uma poderosa obra como líder de Deus num tempo de provas e de dificuldades para Israel.

Nos dias da igreja primitiva, Deus buscava um homem que fizesse chegar ao povo do mundo mediterrâneo o poder redentor de Cristo, um homem que apresentasse a mensagem do Calvário perante reis e imperadores, e de um modo absolutamente incomum encontrou na poenta estrada de Damasco a Paulo — o apóstolo das nações. Depois da experiência de Damasco, “Cristo, e Este crucificado” tornou-Se a absorvente paixão de sua vida. Humberto Rhoden, numa impressiva afirmação a respeito de Paulo, diz:

“Paulo foi um livro que só falava de Cristo. Foi uma flama que ardia apenas por Cristo. Foi um gênio que só pensava em Cristo. Foi um homem com uma vontade que só desejava a Cristo. Foi um soldado que só lutava por Cristo. Foi uma alma que só vivia para Cristo, por Cristo e através de Cristo”.

Sim, ao longo de todos os séculos, Deus tem estado a procurar homens. E os anos passaram nesta irreversível sucessão de dias e noites, e sobre o mundo desceu a longa noite da apostasia medieval. E Deus estava procurando um homem que dissipasse as sombras dessa era tenebrosa, e achou a Lutero, piedoso monge agostiniano. Com sua voz ousada e eloqüente e com poderosas e persuasivas pregações, Lutero perturbou papas e cardeais, reis e imperadores, Estados e continentes. Pregando a mensagem de justiça pela fé, ele sacudiu pelos fundamentos a poderosa estrutura da escolástico-medieval, mudando a corrente da História.

Mais tarde, ao buscar um homem para restaurar na igreja cristã a obra missionária em terras pagãs, encontrou no interior de humilde oficina de sapateiro a Guilherme Carey, um dos maiores milagres de Deus na fascinante história das missões.

“Achei a Davi”, disse o Senhor com radiante júbilo.

Aproximava-se o fim do mais longo período profético registrado na Bíblia, os 2.300 dias, e Deus estava a procura de um homem que proclamasse com poder, convicção e fervor, a mensagem do primeiro anjo, preparando o caminho para o início do movimento adventista. E um dia, posso imaginar a Deus dizendo: “Achei a Guilherme Miller”. Após liderar um notável reavivamento e levar a cabo uma das maiores campanhas evangelísticas nesta nação, e depois de haver passado pela triste experiência de 1844, ele foi para o repouso. Segundo a inspiração, os anjos de Deus guardam sua tumba.

Como resultado do reavivamento dirigido por Miller, e em harmonia com a providência divina, a igreja adventista veio à existência. E Deus procurava um mensageiro que desse liderança a Sua igreja e conduzisse o Seu povo em tempos de crise e de dificuldades. Surpreendentemente Ele encontrou uma jovem adolescente — Ellen Harmon. Quão maravilhoso foi o seu ministério! Durante 71 anos como testemunha da verdade e da justiça, ela esteve ante este movimento como uma “torre e fortaleza”, guiando e protegendo esta igreja contra a heresia, a confusão, a desconfiança, incredulidade e fanatismo. Deus procurava um homem, e encontrou uma jovem.

A igreja adventista, em seu período de formação, e com a bênção de Deus, estava crescendo, mas limitada às fronteiras desta nação. O desafio de pregar o evangelho do reino em todo o mundo não fora levado em conta por alguns líderes naqueles dias. Mas Deus estava procurando um homem capaz para iniciar a obra em terras missionárias, e encontrou a John Nevins Andrews, o mais habilitado nesta denominação naqueles dias. E com Andrews, esta igreja começou a sofrer de uma incurável doença, uma aguda “febre de mar”. Daí para cá, nossos missionários têm estado a cruzar os oceanos, dando a esta igreja uma impressionante dimensão mundial.

Um dia Deus procurava um homem para iluminar as selvas do Amazonas, o “Inferno Verde” da América do Sul, e achou neste país a Léo Halliwell e sua esposa. Estimulados por um vigoroso sentido de missão, eles realizaram notável obra que a poeira do tempo jamais cobrirá. Tão notável foi sua atividade que o governo do Brasil, mediante decreto especial, concedeu-lhes a mais alta honraria oficial do país: a “Ordem do Cruzeiro do Sul”.

Sim, através de todos os séculos, Deus tem-Se empenhado na tarefa de procurar homens. Agora, suscitamos a interrogação: Que espécie de homem está Deus procurando?

O homem que Deus necessita não terá que ser necessariamente um gênio ou um indivíduo com elevado QI ou de personalidade carismática. Deus pode, obviamente, usar gênios na edificação de Sua igreja; entretanto, os escolhidos por Deus são em geral pessoas do termo médio.

O homem a quem Deus está procurando não é necessariamente um homem de grande prestígio social. Que classe de homens Deus escolheu no passado? Davi era um obscuro pastor em Israel. Pedro era um rude e instável pescador nas praias da Galiléia. Lutero era filho de um pobre mineiro. Carey era um sapateiro anônimo. Gipsy Smith era uma desprezada cigana. Por esta razão, Paulo diz: “Não são muitos os sábios segundo a carne, nem muitos os poderosos, nem muitos os nobres que são chamados. Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes; e Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para confundir as que são . . . para que nenhuma carne se glorie diante dEle”. I Cor. 1:26-31.

O homem a quem Deus busca não é um homem perfeito, sem mancha. Nenhum daqueles a quem Deus chamou era perfeito ou imaculado. Isaías, ao tornar-se cônscio do divino chamado, exclamou: “Ai de mim que vou perecendo; pois sou um homem de lábios impuros, e habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos!” Isa. 6:5. Na presença de Deus o profeta sentiu sua própria indignidade.

Pedro, chamado para ser apóstolo, era impulsivo em suas reações e explosivo no seu comportamento.

Paulo, o legionário da cruz, era rude, ríspido, intolerante e algumas vezes violento.

Em obediência ao chamado de Deus, porém, todos esses homens foram transformados, e pela graça de Deus habilitados a realizar grandes coisas por Sua Causa.

Mas que qualificações precisa possuir o homem de quem Deus necessita? Deve ele ser um homem de grande fé. A fé honra a Deus, e Deus honra a fé, realizando grandes coisas por aqueles que nEle confiam.

O homem que Deus está procurando deve ser possuidor de exuberante paixão pelos perdidos, os que estão sem Deus e sem esperança.

Moisés, Paulo, Carey, Moody e outros heróis da fé nada seriam, não fora o fato de que estavam possuídos de impelente amor — amor que os consumia — pela humanidade.

A Bíblia nos diz que Jesus certa vez olhou do sopé do monte a desassossegada multidão, e Seu coração foi tocado pelo espetáculo. Ele não viu o povo como uma coleção amorfa de corpos. O Salvador viu neles homens, mulheres e crianças com suas enfermidades, frustrações, desapontamentos e aflições, e moveu-Se de grande compaixão e simpatia.

Deus necessita de homens que possuam compaixão como a de Cristo pelas necessidades de um mundo sacudido pelo temor, angústia e desespero. O fundador do Exército da Salvação, numa audiência com a rainha da Inglaterra, disse: “Uns têm paixão pelo ouro; outros pela fama; outros ainda têm paixão pelo poder. Minha paixão, Majestade, é pelas almas”.

O homem que Deus está procurando deve ser capaz de dar-se a si mesmo completamente, incondicionalmente, nas mãos de Deus. George Truett, disse: “A maior e mais nobre contribuição que podeis dar ao Senhor é vossa vida”.

Os dias de Ezequiel foram dias de declínio moral e eclipse espiritual. Nunca dantes havia o povo de Deus caído em tão profunda apostasia como nesse tempo. Eles desprezavam o Senhor e Seu culto, e profanavam Suas leis. Falando nesses dias Deus disse: “Busquei dentre eles um homem que estivesse tapando o muro, e estivesse na brecha perante Mim por esta terra, para que Eu não a destruísse; mas a ninguém achei”. Eze. 22:30. Que tragédia!

Esta triste experiência lembra-nos a velha história de Diógenes, fundador da escola cínica de filosofia, o qual apareceu nas ruas de Atenas durante o dia, tendo à mão uma lanterna acesa, procurando um homem honesto.

Em nossa geração Deus não está em busca de edifícios, nem de instituições, nem de doações em dinheiro. Nestes dias de crise Deus procura um homem, e esta grande busca Ele a encontrou em cada um de vós.

Corpo, alma, intelecto, emoções, vontade, dons — tudo deve ser posto no altar do serviço. Deus encontrou um homem — Você!