Quando Jesus indagou a Nicodemos: “Tu és mestre em Israel, e não compreendes estas coisas?’’ (S. João 3:10), Êle estava fazendo uma pergunta que precisa ser repetida hoje em dia. Ali es-tava um membro do Sinédrio, um preeminente clérigo, alguém que pretendia guiar a outros no caminho da justiça, sem que êle mesmo estivesse bem certo dêsse caminho. Sem dúvida, Nicodemos tinha um conflito interior, e nesta condição era de pouco proveito para a obra de Deus. O grande Médico indicou o único remédio para a cura do pecado e para se obter paz duradoura, ao dizer: “Importa-vos nascer de nôvo.’’ Verso 7. Os mestres em Israel, os publicanos e pecadores, e todos os que são “culpados para com Deus,” só poderão encontrar paz e segurança mediante a regeneração por Aquêle que disse a Nicodemos: “E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o rilho do homem seja levantado; para que todo aquêle que nÊle crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” Verso 14. Não houve outro caminho de lá para trás, nem de lá para cá, até êstes últimos dias.
Experiências recentes deram-me a convicção de que há uma espécie de conselho religioso que é de pouco proveito, valendo quase o mesmo que os estéreis e fastidiosos conselhos dados pelos escribas e fariseus do passado. Precisamos acautelar-nos, para que não se diga de nós o mesmo que foi dito a respeito dos bem-intencionados conselheiros de Jó: “Vós, porém, sois inventores de mentiras, e vós todos médicos que não valem nada.” Jó 13:4.
Que levou o piedoso Moisés a mandar fazer aquela serpente de metal, levantando-a depois entre um povo religioso? Acaso não foi o conflito que surgiu por causa de sua contínua apostasia e recusa em submeter-se inteiramente a Deus? Não discernindo a verdadeira causa de sua miséria, o povo culpou a Deus e murmurou contra Êle. Mas “a maldição sem causa não virá.” O sábio conselheiro compreenderá que o pecado, mesmo que seja apenas uma falta de verdadeira confiança em Deus, de alguma maneira ou outra, jaz à base da maior parte da angústia humana. Foi o Senhor que enviou aquela aflição sôbre Israel, pois lemos em Números 21:6: “Então o Senhor mandou entre o povo serpentes abrasadoras, que mordiam o povo; e morreram muitos do povo de Israel.” O propósito do sofrimento e terror que afligiu a Israel era que êles reconhecessem seu peca-do e olhassem para Aquêle através de cuja plenitude a alma humana encontraria satisfação e paz. Quando os israelitas confessaram sua concupiscência e exclamaram; “Havemos pecado, porque temos falado contra o Senhor” (Núm. 21:7), e olharam então para a serpente de metal, como lhes foi ordenado, êles foram salvos.
E nossa época, entregue à rebelião contra Deus, em que por tôda parte há homens temendo ao Senhor e adorando “seus próprios deuses,” certamente está fervilhando das víboras do pecado mortal, que mais cedo ou mais tarde põe os homens em pânico, sem saberem onde encontrar paz e cura. Foi a picada das serpentes que no passado conduziu os homens ao grande Médico, e é a aguilhoada do pecado que hoje em dia leva os homens de consciência amargurada a clamar por aquela paz que o mundo não pode dar ou tirar. Sem dúvida, nosso dever é diagnosticar os sintomas com clareza e, recusando abandonar os homens fazendo uma análise psicológica ou uma simples exposição sôbre como dominar o eu pelo controle da mente, dirigi-los Àquele que disse: “E Eu, quando fôr levantado da Terra, atrairei todos a Mim mesmo.” S. João 12:32.
Na verdade, os homens precisam examinar-se a si mesmos e ser ensinados a pensar “em tudo o que é de boa fama,” e devemos ser gratos pelos recentes estudos sôbre a mente humana, que nos ajudam de muitas maneiras, mas cumpre precaver-nos contra tudo o que tenha uma natureza substituinte, pois é o evangelho “eterno” ou antigo que é necessário. Quando somos feridos pelo pecado, “é a grande obra que Êle realizou, que nos salva. Não é procurar, mas confiar.” Se deixarmos de exaltar a Cristo dum modo que atraia, os pecadores não “olharão” para Êle e não “viverão.” Se de alguma maneira Sua graça e poder forem substituídos pe-la auto-sugestão, em tempos de dificuldade, quando declina a fôrça física e a mente está deprimida, prevalecerão o fracasso e o desespero.
Algum tempo atrás, dois membros cuja sociedade comercial se desintegrava, solicitaram o meu conselho. Estavam num grande litígio e cada um dêles procurou resolver a questão por meio de processo judicial. Cada um podia apontar para a deslealdade e desonestidade do outro, e teria sido fácil tomar partido e improvisar uma decisão. Em essência, ambos eram boas pessoas, mas puseram-se numa situação em que sua experiência cristã corria perigo. Foi unicamente após oração e o sólido testemunho do evangelho, exaltando a Cristo, que êstes homens chegaram à conclusão de que a paz de Cristo valia mais do que as posses materiais. Contemplando-se a si mesmos à luz do Calvário, resolveram fazer o que era correto, mesmo que caíssem os céus, e partiram com paz e segurança no coração.
Uma mulher que abandonou o marido por diversas ocasiões veio obter a autorização da igreja para divorciar-se dêle. Na verdade, ela passava por uma situação difícil, e seu marido não era um exemplo digno, mas o seu caso de divórcio não estava claro, e só depois de sofrer uma prostração, sendo completamente dominada por suas aflições, ela compreendeu que precisava mais de Cristo do que livrar-se de seu marido. Viu-se a si mesma como realmente era, aceitou a Cristo de nôvo, passou a ter paz e acabou dizendo: “Irei para casa e enfrentarei tudo o que o futuro trouxer, e sei que agora possuo fôrça interior para fazê-lo.”
Quantos há na igreja hoje, e fora dela, que vivem num estado de agitação, não desfrutando plenamente a bênção de Deus, devido a nutrirem dúvidas no tocante às providências terrenas que adotaram para sua paz e felicidade. O mundo de hoje tem um grande número de mestres que levam o nome de Cristo e pretendem realizar curas mentais. Recomendam que as pessoas procurem “o que é belo” até encontrarem-no, e que então “retenham o pensamento.” “Mas, ainda que nós mesmos, ou um anjo do Céu vos anuncie outro evangelho, além do que já vos tenho anunciado, seja anátema.” Gál. 1:8. Em todos os conselhos que damos, a fim de que nosso ensino trague paz duradoura e agrade a Deus, devemos considerar atentamente cinco fatos fundamentais:
1. Os homens precisam contemplar-se à luz da verdade, e a não ser que compartilhemos amplamente da bênção do Espírito Santo, fracassaremos, pois está escrito: “Convém-vos que Eu vá, porque se Eu não fôr, o Consolador não virá para vós outros. . . . Quando Êle vier convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo.” S. João 16:7 e 8.
2. Tanto na vida dos justos como dos ímpios, é o pecado que os separa de Deus, e O leva a ocultar o rosto dêles. “Mas as vossas iniqüidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o Seu rosto de vós, para que vos não ouça.” Isa. 59:2. “Se eu atender à iniqüidade no meu coração, o Senhor não me ouvirá.” Sal. 66:18.
3. Por mais bem treinada que seja a mente na terapêutica mental, ou por mais forte que ela seja em dominar-se, não pode haver paz duradoura sem a confissão e o abandono do pecado. “O que encobre as suas transgressões, jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa, alcançará misericórdia.” Prov. 28:13. “Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo os seus pensamentos; converta-se ao Senhor, que Se compadecerá dêle, e volte-se para o nosso Deus, porque é rico em perdoar.” Isa. 55:7.
4. “A paz de Deus que excede todo o entendimento” não é elaborada no íntimo ou aperfeiçoada por um rigoroso exercício mental — Ela é um dom de Deus e um fruto de Seu Espírito. “Deixo-vos a paz, a Minha paz vos dou; não vo-la dou como a dá o mundo.” S. João 14:27. “Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade.” Gál. 5:22.
5. Essa paz é mantida por confiar nÊle e levar uma vida de obediência. “Tu conservarás em paz aquêle cuja mente está firme em Ti; porque êle confia em Ti. Confiai no Senhor perpètuamente; porque o Senhor Deus é uma rocha eterna.” Isa. 26:3 e 4. “Ah! se tivesses dado ouvidos aos Meus mandamentos! então seria a tua paz como o rio, e a tua justiça co-mo as ondas do mar.” Isa. 48:18.
Numa época de astúcia filosófica, o apóstolo Paulo aprendeu a acautelar-se dos sofismas de seu tempo, e a basear-se na pregação do evangelho simples, no espírito e poder de Cristo, para que Deus pudesse operar Suas maravilhas transformadoras, tanto em judeus como em gentios. Exclamou êle: “Porque não me envergonho do evangelho de Cristo, pois é o poder de Deus para salvação de todo aquêle que crê.” Rom. 1:16.
Sim, “Êle é a nossa paz.” Exaltemo-Lo, e se fazendo assim notarmos que os homens não são atraídos para Êle, choremos “entre o pórtico e o altar” até poder dizer: “A minha palavra e a minha pregação não consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstração do Espírito e de poder, para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria humana; e, sim, no poder de Deus.” I Cor. 2:4 e 5.