No Oriente, nos quais a imortalidade da alma ocupa lugar preeminente. A metempsicose, em alguns dêles, assume o caráter de dogma.
Reportando-nos aos egípcios que criam na existência de um “duplo” imaterial da mesma forma e aspecto do corpo notamos que posteriormente essa crença sofreu ligeiras modificações, mas não na estrutura. Assim lemos no “Livro do Silêncio”: “A essência vital é Khiu. É uma flama escapada do Sol, uma fagulha do fogo divino. À morte do corpo, Khiu toma a sua própria personalidade e deixa todos os elementos que a personalidade humana lhe superjuntou. Volta para o Sol de onde é emanado e, apesar disso, as suas agitações de alma forçá-la-ão a descer de seu irradiante e maravilhoso asilo para animar outro corpo.” 1 Temos aí um nítido perfil de “alma” entre os egípcios, em tempos recuados.
Outro ponto alto na apreciação da ideia imortalista, é a famosa lenda hindustânica da metempsicose. Iniciaimente é o verme rastejante que, atendido em seu desejo, se transforma em flor; esta se transmuda em borboleta que, por sua vez, toma a forma de águia. Esta, de acôrdo com o seu anelo, se transforma em estrêla. Finalmente a estrêla, anelando a imortalidade, foi mudada em Alma Humana. E esta, para que fôssem frenadas as suas expansões, foi encarcerada no corpo do homem. Aí está o grande disparate, apesar do colorido poético.
A imortalidade natural era o leitmotiv das antigas concepções religiosas. No vedismo (antiga religião hindu, anterior ao braamanismo) havia yam, deus dos mortos amrita, bebida da mortalidade. Havia o naraka (inferno), lugar abaixo da terra onde as almas dos condenados ficavam temporàriamente, antes de entrarem no ciclo normal da metempsicose. Mutatis mutandis e com novas roupagens, eis a ideia reencarnacionista tão apregoada pelos espiritualistas hodiernos. O taoísmo (500 A. C.), anterior ao confucionismo, é um amálgama de adoração dos espíritos da natureza e almas dos mortos. Havia também o elixir da imortalidade. O confucionismo caracterizava-se pela ênfase ao culto dos antepassados. Tanto no taoísmo como no confucionismo, os espíritos dos mortos vivem na atmosfera, nos lugares que habitaram.
Saquiamuni, fundador do budismo, também pregava a imortalidade inerente. “A alma, identificada com a Lei, quando entra na beatitude do Nirvana, continua a velar pela felicidade do universo”. Nos templos budistas se pintam as “câmaras de horrores”, ou seja, o itinerário infernal das almas e seus incríveis padecimentos.
Na Pérsia, segundo a doutrina mazdeana, “a alma depois de permanecer dias pelos arredores de seu cadáver, deixava-o e ia para o lugar do juízo final.” 2
Segundo os gregos, as almas ficavam no Érebo, perto do abismo do Tártaro. No século V, A. D., com os mistérios órficos e de Eleusis, veio o concepção de recompensa e castigo das almas. O paganismo romano — essencialmente animista — dava grande importância às almas dos mortos — os manes que se encontravam em toda a parte. Sabido é que os escandinavos admitiam um inferno de várias categorias e subdivisões, ao fundo do Helheim, mundo dos mortos.
As mitologias também ensinavam a imortalidade. “As almas, antes de chegarem à corte de Plutão e ao tribunal de Minos, tinham de passar o Rio Aqueronte em uma barca governada por Caronte, ao qual elas davam uma pequena moeda pela passagem.” 3
Bunsen, afamado historiador, também nos diz: “Os egípcios ensinaram a doutrina da imortalidade da alma, fato mencionado por todos os escritores gregos, desde Heródoto a Aristóteles, e brilhantemente confirmado pelos monumentos.”4
Sabemos que a raça indo-européia, de que as pop ilações gregas e italianas são os ramos, cria cm algo que sobrevivia ao corpo. Originaram resses povos os chamados “ritos de sepultura”, demonstrando que quando metiam um corpo no sepulcro, acreditavam que lá punham também “alguma coisa que vivia.” Nota-se isto, de modo inequívoco, em Virgílio, ao descrever os funerais de Polidoro, cuja narração assim conclui: “Encerramos a alma no túmulo.” Em Ovídio e Plínio, o Moço, encontram-se expressões idênticas, o que prova sobejamente ser essa idéia corrente em seu tempo, idéia que provinha de crenças mui remotas. Deve-se notar que, no final da cerimônia fúnebre, era costume o oficiante chamar três vêzes a alma do morto, pelo nome que tinha usado em vida, augurando-lhe vida feliz debaixo da terra. A fórmula era: “Passa bem, F. . . ., e que a terra te seja leve”. 5 Considerava-se um sacrilégio a inumação de um corpo sem cs ritos tradicionais e as fórmulas consagradas. Plauto menciona a história de uma alma do outro mundo, que andava errante, porque seu corpo fôra enterrado sem o ritual fúnebre. Suetônio relata que, pelo fato de ter o corpo de Calígula sido enterrado sem estas prescrições ritualísticas a sua alma andou errante, aparecendo aos vivos, só cessando de o fazer quando se decidiu exumar o corpo e cumprir o ritualismo. Esta crença ganhou tal consistência, que atingiu as raias do fanatismo. De uma feita, os atenienses chegaram ao cúmulo de fazerem morrer os generais que, depois de uma grande vitória no mar, tinham descurado o entêrro dos mortos. Por essa razão, a multidão acusou de impiedade êstes generais, e foram inapelávelmente mortos. Tinham salvo Atenas, mas perdido milhares de almas. Afirma-se que os progenitores dos mortos, crendo na desgraça que estas almas iam sofrer pela ausência dos ritos, compareceram ao tribunal em trajes de luto, reclamaram vingança, e insistiram até que a mesma se cumpriu.
Ovídio e Virgílio descrevem também o costume que havia em seu tempo, de os parentes dos mortos depositarem grinaldas de flôres, plantas, frutas, sal, comestíveis, leite e vinho sôbre a sepultura. Outros escritores gregos também a êle se referem. Diziam que a alma do morto se agradava de tais coisas e delas se nutria.
Estas concepções francamente pagãs, por influência do convívio começaram a infiltrar-se na Palestina. Já no tempo de Cristo, notamos a influência dessas ideias. “Os fariseus ensinavam a existência de espíritos, tanto bons como maus . . . (ideia que) recebeu talvez grande impulso das ideias pérsicas. Acreditavam no galardão e suplício eternos, ideias que tiveram um grande desenvolvimento nos dois séculos antes de Cristo”. 6‘Em Atos 23:8 se afirma que os fariseus admitiam a existência de espíritos.
Mais uma citação que reforça este fato, insuspeito Walker: “As religiões orientais (Cibele, ou Grande mãe, e Atis, na Ásia Menor; Isis e Serápis, no Egito, e a de Mitra na Pérsia) ensinavam o renascimento e que os fiéis participavam da imortalidade de seus deuses . . . Não pode haver dúvida alguma sobre o efeito que estas doutrinas exerceram sobre o desenvolvimento dos sacramentos do cristianismo.”7
Sem receio de errar, podemos afirmar com toda a convicção: a imortalidade natural e a concepção de alma como entidade distinta do corpo são doutrinas pagãs, antibíblicas e vêm de encontro à verdadeira escatologia ensinado nas Escrituras.
Referências
(1) H. Durville, “Ciência Secreta’’.
(2) Dic. e Encicl. Internacional, pág. 5876.
(3) Arquimina Brito, “Mitologia Dupla”, pág. 135, ed 1926.
(4) Bunsen, “Egypt in Universal History”, Vol. IV, pág 639.
(5) Fustel de Coulanges, “Apêgo à Sepultura”,
(6) W. Walker, “História da Igreja Cristã”, pág. 17.
(7) Ibidem, pág. 21.