Este pensamento tem sido o âmago de centenas de mensagens apresentadas aos crentes na mensagem do advento através dos longos anos do serviço consagrado de Ellen G. White. Quanto mais se lêem estas mensagens, especialmente quando se podem ler os originais de próprio punho, maior será o reconhecimento do fervor, do anseio e do encargo doloroso que impeliam a mensageira do Senhor a “clamar em alta voz” e “não cessar”, e levantar-se a qualquer hora da noite para escrever. Quão repetidas vêzes se nos deparam, em seus artigos, expressões como as seguintes: 2 “Levantei-me à uma hora da madrugada para escrever-lhe.” “Noite após noite durante quatro semanas não me foi possível dormir depois da meia noite.” “A carga que sôbre mim repousa tem sido tão pesada que, semanas a fio, não tenho podido dormir depois da uma ou das duas horas da madrugada.” (Ver também Testimonies, Vol. 5, pág. 430.)

Houve no passado homens que sentiram suas cargas, e a frase “os encargos do Senhor” lhes parecia um estribilho através dos escritos dos profetas do Velho Testamento. Não era uma responsabilidade ordinária que fazia Ellen G. White acordar dessa forma, noite após noite. Não era insônia como a sofrem algumas pessoas, derivada de aborrecimentos domésticos ou de negócios, indigestão ou fadiga nervosa. Não era comparável à justa e conscienciosa preocupação que sentem consagrados obreiros pressionados pelo trabalho em seu território. Para Ellen G. White não era apenas o pêso da responsabilidade que pudesse cair sôbre um simples indivíduo. Era o quadro completo de um mundo em necessidade, ou de obreiros que precisavam de orientação, ou de almas a serem salvas, que lhe era pôsto diante dos olhos pelo Senhor. Quando ela estêve na Austrália, não apenas as necessidades locais da obra lhe eram continuamente apresentadas, mas os problemas de Battle Creek, da África, da Europa, de Washington e de muitos campos não penetrados. Quando ela estêve em Elmshaven durante os últimos anos de sua vida, preocupava-se com os problemas da Austrália, de Loma Linda, Glendale, e do Sul.

À medida que a obra crescia, aumentavam os problemas. Que fardo tremendo e acabrunhador deve ter sido o enfrentar, a cada hora, as necessidades do campo mundial, ao mesmo tempo aperceber-se dos fatôres que, por detrás das cenas, estavam detendo a obra! Com que zêlo procurava ela partilhar êste discernimento com os dirigentes para que se operasse avançamento mais rápido.

Êste fardo, expresso em tôdas as cartas, em tôdas as páginas, constitui uma das maiores provas de inspiração. Era uma paixão todo-absorvente, impelente no sentido de transmitir a outros a beleza, a magnitude e o privilégio da tarefa que deveria ser aceita indisputàvelmente por todos os seguidores de Cristo. E Ellen G. White achava-se plenamente qualificada para falar daquilo que lhe absorvia todo o pensamento. Tendo visto com os próprios olhos, ouvido com os próprios ouvidos, e sido testemunha ocular de Sua majestade, tendo provado o dom celestial e sido participante do Espírito Santo, como poderia ser desobediente à vi-são celestial, especialmente ao compreender que os favores que havia recebido não eram para seu deleite egoísta, mas deviam ser partilhados com quantos quisessem recebê-los?

Parte do fardo consistia no fato de que as mensagens nem sempre eram aceitas. Somos, por vêzes, inclinados a pensar que sòmente no tempo presente pode haver dúvidas na mente de alguém, mas na verdade isto não é coisa nova. Sempre houve os e opunham, criticavam e descriam. Uma coisa era dar aos crentes vislumbres do reino dos bem-aventurados, e outra o receberem enérgicas palavras de reprovação e conselho contra a execução do que parecia ser os mais sólidos planos. Não era fácil para alguém natural-mente dotado de disposição meiga levantar-se con-tra homens fortes em sabedoria, experiência e in-fluência — dirigentes da obra — e encontrar descrença e oposição. Freqüentemente sentia-se desencorajada para apresentar mensagens de reprovação. Certa vez, foi animada pelo seguinte sonho:

Alguém me trouxe uma peça de estôfo branco e me incumbiu de cortar dêle vestidos para pessoas de todos os tamanhos, de tôdas as condições e de todos os feitios . . . Senti-me desanimar ante o acúmulo de trabalho que vi diante de mim; verifiquei que estivera empenhada em talhar vestidos durante mais de vinte anos e que o meu trabalho não fôra apreciado; também não podia ver que houvesse sido de grande benefício. …

A pessoa a quem falava respondeu-me: “Corta o vestido. É êste o teu dever. O prejuízo não é teu, senão meu. Deus não deseja ver feito, e não sabes qual dêles prosperará, se êste ou aquêle. …”3

Foi unicamente a convicção inabalável de que sua vida se achava escondida com Cristo em Deus e que lhe fôra dada fôrça para cumprir os propósitos divinos em sua vida que lhe avigorava a alma e a sustinha nos dias em que o fardo lhe parecia mais pesado do que poderia suportar.

Tenho fielmente escrito as advertências que Deus me tem dado. Elas têm sido impressas em livros, contudo não posso desistir de o fazer. Tenho de escrever estas coisas sem cessar. Não peço para estar aliviada. Enquanto Deus me poupar a vida, tenho que prosseguir produzindo estas mensagens importantes. 4

Quando em minha juventude aceitei a obra que me foi confiada por Deus, recebi com ela a promessa de que havia de ter a assistência especial do grande Ajudador. Ao mesmo tempo que me era confiada a incumbência solene de transmitir com fidelidade as mensagens do Senhor, sem diferenciar entre amigos e inimigos. . . . Não espero que todos hão de aceitar as correções, e emendar sua vida; mas nem por por isto devo deixar de desempenhar-me de meu dever. 5

Verdade Inalterável

Pouquíssimas pessoas há das quais se pode dizer com tanta exatidão que sua “vida se acha escondida com Cristo em Deus.” Em sua completa submissão à vontade de Deus, Ellen G. White se subtraía, permitindo que Cristo fôsse exaltado supremamente. Esta abnegação marcante constitui característico no seu estilo de escrever. Não se nota esfôrço de escrever com brilhantismo, ou para chamar atenção sôbre si mesma pela originalidade da fraseologia. Não há dichotes, piadas, ou sofismas. O pensamento provém de um coração franco, de uma mente clara — direto, simples, natural, sem valer-se de truques superficiais de escrever. O resultado é um fluir de linguagem coerentemente belo. Ela fala com confiança e autoridade; não há apologia, interpretação, hesitação. Se, por acaso, aparecesse uma pitada de sarcasmo, ou um laivo de frivolidade, prejudicaria, sem dúvida, a beleza e uniformidade da mensagem. Há, no entanto, uma beleza e uniformidade que se constituem nos meios mais eficazes de levar confiança ao leitor. Em nenhuns outros escritos, fora das Escrituras, se pode encontrar verdade “apreendida tão logo se prove” para usar sua própria expressão.

Que grande sabedoria se vê na escolha divina de uma mensageira! Escolhendo Ellen G. White para ser veículo de Sua mensagem, o Senhor possibilitou a plena focalização da luz que brilha no rosto de Cristo, Seu amor e misericórdia. Quase invariàvelmente esta luz é vista em tôdas as cartas pessoais que escreveu, em tôdas as palestras feitas, em todos os capítulos de seus livros. Freqüentemente a Sra. White começava uma carta na maneira costumeira, referindo-se brevemente ao problema que a pessoa lhe apresentava, acrescentava umas poucas palavras de conselho ou estímulo e a seguir, tão naturalmente como as flôres se volvem para a luz solar, preenchia a maior porção da carta com comentários sôbre o amor de Cristo, Sua vida de humildade, sofrimento e abnegação, e o poder transformador de Sua presença pessoal. Ao invés de procurar polemicar com a pessoa que lhe escrevera pedindo auxílio, ou analisar-lhe o problema, ela exaltava a Cristo em tôda Sua beleza, dizendo: “Olhai para Cristo. Se O amardes e vos submeterdes inteiramente a Êle, Êle resolverá vossos problemas e vos guiará nesta decisão. Não necessitareis de vir a mim para pedir conselho, mas podeis buscar sabedoria diretamente a Deus”.

Ressentimentos pessoais, contendas entre irmãos, e obstáculos aparentemente intransponíveis se dissolveríam se os irmãos pudessem partilhar dêste espírito de amor e obediência incondicionais!

Em outras ocasiões, a mensagem ou conselho particular que a Sra. White dava assumia a forma de citações diretas das Escrituras — página sôbre página de verdade, diretamente da Bíblia. No estudo destas seleções transparece inspiração especial. Nôvo significado e novas aplicações às situações emergem ao aparecerem as palavras conhecidas em cada contexto especial. Parece que tôda a Palavra de Deus se achava fabulosamente disponível para que ela a empregasse. Certamente seu espírito era dirigido àquelas referências apropriadas.

As glórias do mundo eterno eram realidades para Ellen G. White; a companhia de Cristo lhe era permanente presença; os santos anjos estavam a seu lado em todos os momentos.

Uma Grande Obra a Ser Feita

Tenho tôda a fé em Deus. . . . Êle opera à minha direita e à minha esquerda. Enquanto escrevo assuntos importantes, Êle está a meu lado, ajudando-me. Êle dispõe o trabalho à minha frente, e quando fico embaraçada em busca de uma palavra apropriada com que ex-pressar meu pensamento, Êle a traz de modo claro e distinto à minha mente. Percebo que tôdas as vêzes que peço, e mesmo enquanto estou a falar, Êle responde: “Eis-Me aqui.”6

O tremendo senso de minha responsabilidade de tal forma se apodera de mim que me sinto sobrecarregada como um carro lotado de molhos. Não desejo sentir menos intensamente minha obrigação para com o Poder Mais Elevado. Aquela Presença sempre está comigo, emprestando suprema autoridade e controlando o serviço que presto ou deixo de prestar.7

Tôda sua vida foi devotada em partilhar esta segurança e conforto com os outros. Sabia que outros podiam ter esta experiência se estivessem dispostos a se submeterem a uma correta relação com Deus.

Não importa que lhe tenha sido penoso compreender a indiferença do povo que professava receber a Cristo, e a preocupação dêles por coisas transitórias como o vestuário, o mobilamento de seus lares, recreações e vaidades da vida. “Há uma grande obra a ser feita,” ela os advertia incessantemente.

Quando vejo meus irmãos passeando e trabalhando como homens em sonho, sinto com que precisar fazer alguma coisa para avivá-los. Possa o Senhor ajudar-me a cumprir todo o meu dever; pois não há demora. Estamos pertos do último grande conflito.8

Estou receosa de nosso povo — receosa de que o amor pelo mundo lhes está subtraindo a piedade.9

Oh, que eu possa impressionar a igreja com o fato de que Cristo reclama o serviço dela! Meus irmãos e irmãs, tendes-vos tomado servos de Cristo? Então se devotardes o máximo de vosso tempo para servir-vos a vós mesmos, que resposta dareis ao Mestre quando Êle exigir contas de vossa mordomia?10

E hoje que estamos cinqüenta anos mais perto do último grande conflito, quanto mais cientes devemos estar das responsabilidades da tarefa que há diante de nós! Examinemo-nos a nós mesmos à luz do Espírito Santo para vermos que parte o eu desempenha em nossa vida, e reconheçamos as possibilidades do serviço ilimitado se nos colocarmos na correta relação com Deus. Não sejamos como homens passeando em sonho, mas avivemo-nos para a urgência dos tempos em que vivemos.

Referências

  • 1. Ellen G. White, manuscrito 1, 1910.
  • 2. Ellen G. White, carta 146, 1902; carta 78, 1903; carta 239, 1903.
  • 3. Testimonies, Vol. 5, págs. 657 e 658.
  • 4. Manuscrito 21, 1910.
  • 5. Testimonies, Vol. 5, pág. 677.
  • 6. Carta 127, 1902.
  • 7. Life Sketches, pág. 432.
  • 8. Carta 201, 1902.
  • 9. Carta 201, 1902.
  • 10. Testimonies, Vol. 4, pág. 619.