na primeira página da vida de Cristo encontra-mos uma afirmação surpreendente que bem merece especial reflexão. Narrando o nascimento de Jesus, conta-nos o evangelista que Maria “envolveu-O em panos, e deitou-O numa manjedoura, porque não havia lugar para Êle na estalagem”. S. Lucas 2:7.
Esta é a primeira frase descrevendo a descaridosa atitude dos homens para com o Redentor. Os pintores cristãos, envergonhados com o berço rústico e miserável em que repousou o Filho de Deus, com o mágico pincel transformaram a rude estrebaria de Belém em um pórtico airoso e belo, mas não conseguiram apagar a realidade trágica desta sentença: “Não havia lugar para Jesus”.
Perto de dois mil anos se passaram, e vemos agora um mundo cheio de sistemas religiosos, de cruzes e de cultos. Todavia, como na cidade de Davi, não há lugar para Jesus. Por isso a civilização contemporânea apresenta-se agonizante, sem Deus e sem esperanças.
Como pregadores nós nos entristecemos diante desta acabrunhadora situação. Entretanto, parece-nos oportuno interrogar: Há em nossas atividades lugar para Jesus?
Billy Graham, o festejado evangelista, descreve a seguinte experiência ocorrida em seu ministério: “Há poucos anos atrás eu estava em Dallas, Texas, e tive o privilégio de pregar a uma multidão de mais de 30.000 pessoas. Preguei e dirigi um apêlo sem nenhum resultado. Deixei a plataforma um pouco perplexo, interrogando-me sôbre as razões do insucesso. Um fiel irmão pôs o seu braço sôbre os meus ombros e disse: ‘Billy, poderia eu dizer-lhe alguma palavra?’ Dei-lhe o assentimento e êle continuou: ‘Amigo, você não pregou a Cruz esta noite. Sua mensagem foi boa, mas nela não houve um lugar para Jesus’.
“Fui para o meu quarta e, em lágrimas, disse: ‘Ó Deus, ajuda-me a jamais pregar um sermão sem apresentar a Cristo’.” — Christianity Today, agôsto de 1959.
Com efeito, na cruz de Cristo está o segrêdo do poder na obra do Evangelismo. Cristo deve ser a absorvente paixão do pregador. NÊle o apóstolo das nações condensou todo o seu programa de evan-gelismo, quando em sua pastoral aos fiéis de Corinto, afirmou: “… irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o testemunho de Deus, não fui com sublimidade de palavras ou de sabedoria. Porque nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e Êste crucificado.” 1 Cor. 2:2.
Huberto Rhoden, em síntese lapidar destaca esta verdade, dizendo:
“Paulo é um livro que só fala de Cristo. É uma chama que só arde por Cristo. Ê um gênio que só pensa em Cristo. Ê unia vontade que só quer a Cristo. Ê um herói que só luta por Cristo.
Ê uma alma que só vive de Cristo, por Cristo e para Cristo.”
Em suas vibrantes mensagens e eruditos ensinamentos havia sempre um lugar inconfundível para Cristo, um proeminente e destacado lugar. Daí o segrêdo do seu êxito como evangelista.
Alguns pregadores modernistas apresentam às suas congregações um Cristo poético, sociólogo eminente, moralista, filósofo que consagrou a sua vida a defender os oprimidos. Um Cristo descrucificado, já se vê. Um Cristo sem a coroa de espinhos e sem o manto das humilhações. Um Cristo desfigurado e mutilado para não repugnar a mentalidade racionalista dêste século.
Oportunas são para nós as palavras da mensageira de Deus: “Cristo crucificado, Cristo ressurgido, Cristo assunto aos Céus, Cristo vindo outra vez, deve abrandar, alegrar e encher o espírito do ministro, de tal forma, que apresente estas verdades ao povo com amor e profundo zêlo. O ministro desaparecerá então, e Jesus será revelado.
“Exaltai a Jesus, vós que ensinais o povo, exaltai-O nos sermões, em cânticos, em oração. Que tôdas as vossas fôrças convirjam para dirigir ao ‘Cordeiro de Deus’ almas confusas, transviadas, perdidas. Exaltai-O, ao ressuscitado Salvador, e dizei a todos quantos ouvem: Ide Àquele que ‘vos amou, e Se entregou a Si mesmo por nós’. Seja a ciência da salvação o tema central de todo o sermão, de todo o hino.
“Seja manifestado em tôda súplica. Não acrescenteis às vossas pregações coisa alguma que seja um suplemento a Cristo, à sabedoria e poder de Deus. Mantende perante o povo a Palavra da vida, apresentando Jesus, a esperança do arrependimento e a fortaleza de todo crente. Revelai o caminho da paz à alma turbada e acabrunhada, e manifestai a graça e suficiência do Salvador.” — Evangelismo, pág. 185.
Um douto pregador que, com freqüência, em seus sermões, expunha princípios de Sociologia e preceitos de Ética, encontrou, certa vez, sôbre o púlpito, uma fôlha de papel, com as seguintes palavras, escritas por um piedoso diácono: “Senhor, queríamos ver ‘a Jesus”. Nesta sentença êle reconheceu uma silenciosa censura aos seus eruditos sermões, nos quais não havia lugar para Cristo. Sob o impacto daquelas palavras, contrito, caiu de joelhos, suplicando de Deus a sabedoria necessária para alimentar convenientemente o rebanho. O Senhor ouviu a prece do arrependido ministro e o abençoou grandemente. Êle retornou ao púlpito revestido de um novo poder, tendo como preocupação dominante a proclamação das riquezas insondáveis de Cristo. Suas mensagens se tornaram tão poderosas que o fiel diácono, interpretando o sentimento de tôda a congregação, deliberou pôr sôbre o púlpito um outro pedaço de papel com a seguinte frase: ‘‘Os discípulos se alegraram vendo o Senhor”. S. João 20:20.
Haja, pois, em nosso labor um lugar conspícuo para Jesus, e as almas sob a influência de nosso ministério hão de se alegrar diante da beleza harmoniosa de Cristo e de Seus luminosos ensinos.
— Enoch de Oliveira