W. John CANNON
Pastor da Associação
PARTE II
NATURALMENTE, na busca de um antídoto para o mêdo, o primeiro valor positivo a ser encarado é o valor da fé. Fromm levava seus pacientes a repelir o temor por meio da atividade intensa. Durante dois séculos os psicodinâmicos mantiveram-se em evidência. Freud prescrevia o livramento das tensões e repressões. Êsses alvos podiam ser atingidos mediante o reconhecimento da fonte da dificuldade. Quantos há que gastaram fortunas com psicanálises, e reincidem nos males da infância, de que sofrem, sem o mínimo sinal de cura! O meio bíblico é tão simples, e não obstante tão eficiente! Sua eficiência ficou comprovada inúmeras vêzes. O arrependimento, a crença e a entrega — e a promessa do poder divino é assegurada. Nunca falha quando as condições simples são executadas com sinceridade.
A Bíblia e Freud. — Talvez seja êste o ponto em que devemos refletir sôbre as diferenças básicas entre a concepção bíblica de referência e o conceito da maioria das autoridades psicológicas. Impossível é tratar com êles separadamente, de forma que escolheremos para ilustração a escola Freudiana. Ambas as escolas reconhecem a posição central que o mêdo ocupa na aliança contra o bem-estar do homem. Ambas concordam em que isto produz um desajustamento de más relações e a resultante insegurança. O registo bíblico deixa ampla margem para os temores que assaltam a humanidade, provenientes da instrução e ambiente errados da infância. Fáceis de encontrarem-se são os exemplos bíblicos. Os problemas do sexo, de Hofni e Finéias originaram-se, sem dúvida, em conflitos e tensões produzidos na infância, pelo que o Senhor não pôde livrar Elias de sua responsabilidade, ainda que fôsse a responsabilidade de negligência. Essa culpa é mencionada em Fundamentais of Christian Education, pág. 67:
“O espírito mal-equilibrado, o gênio colérico, a irritabilidade, a inveja ou o ciúme, dão testemunho da negligência paterna. Êsses maus traços de caráter produzem grande infelicidade aos que os possuem.”
Até aqui, muito bem, mas a partir de agora começamos a discordar. Nem todo o temor tem suas raízes nas apreensões ou mal-entendidos da infância. Freud querería fazer-nos crer que todos os temores, ansiedade e suas conseqüências começam de um choque de nascença ou de experiências infantis. Revela o Registo divino que Adão, que nunca tivera infância, teve mêdo porque pecara. Caim teve mêdo e temeu os resultados de seu ato terrível. Os temores podem provir de emoções desvirtuadas ou de caráter mal-formado. Com isto concordamos plenamente, mas igualmente evidente é que os temores podem também ser resultantes diretos de procedimento errôneo, deliberadamente seguido por pura atuação da vontade.
Diriam os Freudianos que a cura vem do livramento das repressões. Mantêm os adventistas, em conformidade com o testemunho das Escrituras, que a cura ocorre com o recebimento do perdão divino, e com a entrega da vontade, que abre o caminho para o recebimento do poder divino na forma do Espírito Santo. A cura vem pela recepção do poder divino para vencer as inclinações para o mal e é concedido poder de purificação, que traz consigo paz interna. Freud põe de parte a Deus em tudo. Trata êle do mecanismo. Freud aponta um caminho, e diz, então: “Realize esta filosofia; ela vos auxiliará.” O pastor adventista prega a absoluta incapacidade do homem, por si próprio, mas apresenta a Cristo como o Grande Auxiliador. “Vinde a Mim,” diz Êle, “e Eu vos darei descanso.”
Foco
A Compreensão do Problema. — Muito há que pode ser dito no tocante aos alvos e possibilidades do conselho pastoral, tal como é praticado pelos adventistas do sétimo dia. Qualquer resposta satisfatória ao nosso tópico tem de apresentar as relações entre o nosso conceito e os procedimentos e princípios de autoridades nesta matéria.
O conselho é provocado por uma generalizada e universal necessidade, que afeta a maioria da espécie humana. Essa necessidade atinge todos os níveis de tôdas as esferas da vida. A tentativa de atender a essa necessidade é igualmente ampla. Em seu mais amplo sentido os conselheiros abrangem os filósofos, psicólogos, psiquiatras, sacerdotes, ministros e todos quantos atuam em idêntica capacidade. Os remédios apresentados são quase tão variados, abrangendo tôda a escala, desde a total confiança própria até à inteira repulsa própria, que causa variação desde a predestinação das tendências herdadas e a quase igual incapacidade das condições ambientes, até a fé e a confiança em Deus.
O conselho pastoral reduz o campo para os que atuam nessa capacidade como ministros do evangelho. Neste sentido a maneira em que interpretam a Bíblia afeta a base do conselho e dos métodos empregados. Os adventistas do sétimo dia tratam de todos os assuntos à luz de uma segura e profunda convicção da inspiração da Bíblia — uma men-sagem dada por Deus. Aceitando, como fazem, a divindade e absoluta perfeição demonstradas em Cristo, adotam-nO como seu modêlo em tôdas as coisas. Crêem implicitamente na busca de conhecimento e reconhecem que é uma qualidade inexaurível. Cuidadosa mente examinam os resultados de cada meio de pesquisa, com o propósito de apreender tudo quanto é bom, de todos os quadrantes. A prova do que é bom será finalmente medida pela norma infalível — a Palavra de Deus.
Ao examinarmos os princípios que regem os conselhos, que encontramos? Fácil é rejeitar tôda a situação com dizer que temos na Bíblia tudo o de que necessitamos, mas os descobrimentos daqueles que atuaram nos processos da mente humana e em suas necessidades, reptam-nos seriamente por motivo de deixarmos de explorar as ricas fontes das Escrituras nesse setor. Lutamos para modificar o procedimento do homem, quando a simples declaração “Como imaginou na sua alma, assim é,” norteia o procedimento no sentido do contato espiritual mais profundo. A importância de guiar a criança e dos efeitos posteriores na vida, agora salientados pelas pesquisas recentes, está indicada em Provérbios: “Instrui ao menino no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará dêle.”
Isto é contrabalançado, porém, pela doutrina bíblica da localização e da prática da vontade. Importante na concepção moderna está a santidade da personalidade do indivíduo. Equivale isto ao redescobrimento da verdade bíblica “Escolhei hoje … ” Que a pessoa é a consideração mais importante, pode ser vislumbrada à luz do Calvário, onde Deus amou o mundo de tal maneira que deu o Seu Filho unigênito.
A arte de aconselhar busca afastar o temor e substituí-lo pela fé e a confiança. O objetivo do evangelho é firmar a fé. Sem fé é impossível agradar a Deus. Como resultado da entrega completa, Cristo promete paz: “Deixo-vos a paz, a Minha paz vos dou; não vo-la dou como o mundo a dá.”
Os princípios da repressão e da regressão, se bem que não com êsses títulos, estão claramente apresentados nas Escrituras. Exemplo notável é o zêlo incansável do apóstolo Paulo na perseguição da igreja, na persuasão de estar fazendo a obra de Deus. A inquirição: “Quem és, Senhor?” é tão significativa, quanto a resposta. “Eu sou Jesus, a quem tu persegues.”
Onde a filosofia adventista do sétimo dia diverge da orientação seguida, somos mais do que justificados em nossa atitude. Em verdade, é por seguirmos a Bíblia que assim procedemos. O afastamento não consiste tanto no reconhecimento da causa das dificuldades como no remédio buscado para as mesmas. Os não cristãos, e quase sempre os conselheiros supostamente cristãos, julgam que o remédio seja um simples processo humano. O remédio que sugerem é encontrado dentro do indivíduo ou em alguma coisa que êle mesmo faz. A Bíblia concorda com que, honrando a personalidade do indivíduo, o primeiro passo deve ser dado por quem busca paz. “Filho Meu, dá-Me o teu coração,” é a ordem. Mas, havendo feito isto, tem a pessoa que voltar-se para o poder externo para resolver os problemas. Mesmo o caráter forte como o de Paulo reconheceu ser impotente. Embora tentando viver vida melhor, protestou: “Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero êsse faço.” Sua solução estava em Cristo, Cristo vivendo nêle.
Os chamados aliviadores de tensões, abridores de barreiras de contenção, não raro levam a outro pecado que é a transgressão da lei de Deus. E como a Bíblia declara e a experiência prova ser verdade, o salário do pecado tem de ser pago. Quantas vêzes o aconselhado se envolve em culpa maior, e o último estado é pior que o primeiro.
Muito está por ser dito quanto ao procedimento moderno de não investigar o passado mais do que é necessário para solver os problemas do presente. A filosofia de Paulo era: “Esquecendo-me das coisas que atrás ficam e avançando para as que estão diante de mim, prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.”
Um ponto existe nesta consideração em que muitos sistemas de aconselhar estão basicamente opostos à filosofia dos adventistas do sétimo dia, que segue fielmente a orientação bíblica. O problema básico, no conceito racionalista, é a deflação do ego. Conseqüentemente, a restauração do ego é apresentada como um remédio para quase todos os males. A concepção mantida por todos quantos aceitam a inspiração da Bíblia é que não raro o orgulho e a inflação indevida do conceito íntimo do eu são dificuldade real. Para que ninguém tente desfazer êste argumento pela idéia de que uma inferioridade inconsciente poderia ser o resultado, eu apresentaria o exemplo de Lúcifer na rebelião do Céu.
Cristo e a Mulher Junto ao Poço
Talvez a maneira mais satisfatória de sumariar esta apresentação da base escriturística para a nossa filosofia neste sentido, é recorrer a um exemplo apropriado em que Cristo, como Conselheiro, orientou uma entrevista. Essa ocasião foi quando Êle falou à mulher junto ao poço. Êle reconheceu o problema dela, não exposto. Abriu o caminho para abordar o que a estava perturbando. Ajudou-a a ver o seu pecado. Indicou-lhe o remédio divino. Ela se retirou em paz.
A Preocupação. — Deve o pastor adventista do sétimo dia, sobretudo, reconhecer que tem uma excelente oportunidade de atacar essa doença espiritual antes que adquira o tamanho de um problema. A doutrina bíblica é de mudança de vida a partir do momento da conversão. O processo dêsse novo nascimento é o amor de Deus tomando posse do coração. “Vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim.” Se isto é mais do que uma declaração teórica, então ao introduzir-se o amor divino, o temor abjeto é expulso e, em seu lugar, entra a fé, a esperança, a confiança e a paz perfeita. Nenhum pregador pode compreender nem interpretar devidamente a mensagem bíblica sem verificar que tôda a sua pregação apresenta esta experiência positiva, reforçada pelo pensamento correto. “Quanto ao mais, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai.” Assim reza a advertência do apóstolo Paulo.
Todo o ensino de Jesus tem base nas ilustrações da confiança simples em Deus — a criança, o passarinho, a flor, etc. Bem faremos em seguir o exemplo do Mestre e usar as coisas simples que são portadoras de virtude curativa.
Uns versos que achei em alguma parte e para que não tenho lugar suficientemente digno, rezam:
“Disse o Sabiá à Andorinha:
‘Eu gostaria de saber
Por que os ansiosos sêres humanos Correm tanto e tanto se preocupam?’
“Respondeu-lhe a Andorinha: ‘Amigo, penso que deve ser Por não terem um Pai celestial Como o que cuida de você e de mim’.”
Tôda vez que uso êstes versinhos, é-me possível descobrir alguém dentre a congregação que sofre com verdadeiros problemas. Esperam essas pessoas em fila para conseguirem de mim uma cópia para si. Sua mensagem positiva de fé e confiança possui grande valor terapêutico. O trabalho do conselheiro tanto é prevenir tensões e seus desenvolvimentos, como curar os aflitos de sua congregação que não aprenderam a lição da fé e confiança.
O Conselho Adventista do Sétimo Dia. — Achamos que a forma de aconselhar que se coadune com a filosofia adventista do sétimo dia, precisaria seguir um procedimento mais direto do que em geral é considerado eficiente pela maioria dos psicólogos. Anda o mundo em busca de maior certeza, de uma voz com a mensagem: “A voz do que clama no deserto: Endireitai o caminho do Senhor.” Isto não significaria que abandonemos métodos menos diretos, mas seguindo uma norma escolhida, escolhamos uma aproximação mais orientadora do que em geral é adotada. É a espécie de conselho que com bondade e paciência busca a oportunidade, e não simplesmente espera que ela chegue.
Sumário: Em conclusão temos os seguintes pontos:
- 1. Jesus usou um método de buscar a oportunidade. Êle foi a Samaria (S. João 4:4).
- 2. Tornou as pessoas conscientes da excessiva pecaminosidade do pecado, para abrir o caminho para a conversão: “Porque tiveste cinco maridos” (v. 18). Não obstante, com grande tacto preparou o caminho.
- 3. Mostrou que o caminho da obediência é o caminho da felicidade. (S. Mar. 10:17-19).
- 4. Repudiou o preconceito nacional e fêz os desprezados se sentirem satisfeitos. “Os judeus não se comunicam com os samaritanos.” “A hora vem, em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai.” “Deus é Espírito, e importa que os que O adoram O adorem em espírito e em verdade,” (S. João 4:9, 21 e 24.)
- 5. Êle privava com os publicanos e pecadores. Era um homem entre os homens.
- 6. Amava as pessoas. Isto, por sua vez, lhes conquistava o amor.
- 7. Sua própria segurança e paz íntimas O ajudaram a ganhar outros. “Nunca, homem algum falou assim como êste Homem.” “Ensinava como tendo autoridade; e não como os escribas.” (S. João 7:46; S. Mat. 7:29.)
Partilhar
Como ficou declarado, o conselho pastoral não é uma experiência unilateral. Não é apenas dar. A fim de dar precisa alguém receber, e a própria experiência de aconselhar provê uma entrada, bem como uma saída. Um dos mais belos exemplos do divino partilhar com a humanidade em “conselho” é encontrado em Gênesis 18:17. Tinha o Senhor que destruir as cidades da planície, mas quis que Abraão comprendesse. Não quis o Senhor fazê-lo sem o conhecimento de Abraão; falou-lhe da destruição iminente. Abraão foi tocado do divino amor intercessório e pleiteou como o Senhor em favor de cinqüenta, quarenta, trinta, vinte, dez. Abraão por fim reconheceu que o Senhor estava destruindo as cidades por não haver outra alternativa. Diz, então, o registo: “E foi-Se o Senhor, quando acabou de falar a Abraão; e Abraão tornou ao seu lugar.”
Há, nessa experiência, uma lição importante. Essa espécie de partilha não é nascida do espírito de importância nem de presunção, mas é o produto de uma sincera humildade e de profunda experiência cristã. Desta experiência, diz Ellen G. White:
“Não havia qualquer confiança em si próprio, nem jactância pela sua justiça [de Abraão]. Não pretendia graça pelo motivo de sua obediência, ou dos sacrifícios que fizera ao cumprir a vontade de Deus. Sendo êle próprio pecador, rogava em prol do pecador.” — Patriarcas e Profetas, pág. 149.
A humildade de Abraão, seu interêsse intenso, sua disposição, como suplicante, para receber, sua intercessão para partilhar, elevou-o na amizade de Deus. Foram justamente êsses carcterísticos que lhe tornaram o conselho e a amizade valiosos para quem o conhecia. Êsses característicos são básicos entre os requisitos dos que querem ser pastôres e conselheiros.