GUILHERME J. WHALEN
CEM anos atrás todos os adventistas do sétimo dia que havia no mundo poderiam ter realizado uma reunião num auditório de tamanho médio. Os 4.000 adventistas em 1865 viviam nos Estados Unidos e no Canadá.
Desde então os adventistas têm estendido silenciosamente sua rede de igrejas, escolas, missões e casas publicadoras através de um mundo que eles crêem firmemente encontrar-se em seus derradeiros dias. Atualmente, essa igreja que surgiu na América do Norte trabalha em 189 países e relata 1.428.000 membros adultos.
Ao contrário da maioria das denominações cristãs, a Igreja Adventista do Sétimo Dia mal foi atingida pelo atual movimento ecumênico. As principais igrejas protestantes não têm mais contatos com os adventistas do que o catolicismo. Alguns teólogos incluem os adventistas juntamente com os mórmons, os adeptos da Ciência Cristã e as testemunhas de Jeová na categoria de “cultos” ou seitas, ao passo que alguns fundamentalistas influentes têm instado com seus companheiros protestantes para que façam uma nova análise do adventismo e alterem talvez aquele rígido julgamento.
A situação do catolicismo romano não é muito boa na pregação e na literatura adventista. Alguns autores adventistas efetuam um ataque antiquado contra a Igreja de Roma, cujos papas foram responsáveis pela mudança da observância do sábado para o domingo, levando assim a cristandade para a apostasia.
Tendo isto em mente, talvez duvidemos que os católicos possam aprender alguma coisa de seus vizinhos adventistas. É possível que uma denominação tão afastada da herança católica tenha algo a oferecer-nos? Penso que sim!
Do mesmo modo que os católicos, os adventistas do sétimo dia estão profundamente envolvidos na educação paroquial. Com efeito, os adventistas mantêm o maior sistema mundial de escolas particulares depois da Igreja Católica Romana. Seu sistema educacional abrange 5.074 escolas com 342.472 alunos, desde o jardim da infância até os cursos universitários.
As congregações adventistas procurarão abrir uma escola primária se houver uns 20 alunos que queiram matricular-se. Nos Estados Unidos somente a Igreja Católica e o Sínodo da Igreja Luterana de Missouri dirigem mais escolas paroquiais. Contudo, os adventistas matriculam uma porcentagem mais elevada de seus jovens nas escolas da igreja do que qualquer outra denominação. Presentemente os adventistas educam seis dentre cada dez de seus membros em idade escolar, em suas próprias instituições, desde o curso primário até o curso superior. Nós católicos não atingimos esta porcentagem no nível secundário ou superior.
Essa igreja relativamente pequena, que possui 346.000 membros adultos nos Estados Uni-dos, sustenta duas universidades, dez colégios e dois ginásios. Seu bastante conceituado centro médico na Universidade de Loma Linda, Califórnia, prepara médicos, dentistas e outras pessoas especializadas. A Igreja Adventista dirige mais colégios e universidades do que a Igreja Episcopal Protestante, que é dez vezes maior, ou do que as Igrejas Cristãs (Discípulos de Cristo) que são sete vezes maiores. Uma pesquisa recente indica que há três vezes mais adventistas formados em colégios do que se dá com a população norte-americana em geral.
O que nós católicos devemos ter em mente é que este amplo sistema educacional é financiado sem os serviços gratuitos de freiras, frades e sacerdotes. Os salários adventistas não enriqueceriam qualquer professor, mas são mais elevados do que aquilo que a maioria das escolas católicas pagam às freiras que lecionam. A necessidade de muitos mais professores leigos nas escolas paroquiais tem causado pânico a alguns católicos; pois afirmam que a comunidade católica não pode arcar com semelhante aumento nas despesas. O fato é que nossos amigos adventistas e luteranos durante décadas têm provido professores assalariados para suas escolas primárias.
Na verdade, o sistema educacional adventista não funciona à base de centavos. Os adventistas situam-se perto do ponto mais alto de todos os membros de igreja, no tocante às contribuições per capita para sua organização. A maioria deles pertencem à classe média e daí para baixo; eles raramente se encontram nas altas camadas de corporações ou na Wall Street. Mas em 1962 cada adventista contribuiu em média com 213,97 dólares para sua igreja, e mais 38,46 dólares para as missões. Convém lembrar que esses algarismos são por membro, não por família. Podemos multiplicá-los por três para obter a média da contribuição familiar: cerca de 750 dólares.
Quantas famílias católicas de classe média, que gemem por causa do custo ascendente da educação paroquial, procuram cumprir sua obrigação para com a igreja, atirando um dólar ou dois no cesto da coleta, aos domingos? Naturalmente, a educação orientada pela religião custará dinheiro, mas a evidência indica que os católicos opulentos deste país não têm começado a sacrificar-se na proporção em que alguns de seus vizinhos protestantes se têm sacrificado em favor de suas igrejas, escolas e missões.
Espera-se que os adventistas contribuam com dez por cento de sua renda total, sem deduzir os impostos. Além desse dízimo básico, muitos adventistas dão outros 10 por cento para manter o programa missionário, educacional, médico, de assistência social e de publicações, pertencente a sua igreja.
Podemos esperar que uma igreja que aguarde o fim do mundo a qualquer momento concentre a atenção exclusivamente em assuntos religiosos. É o que sucede com as testemunhas de Jeová, que não possuem hospitais, asilos, orfanatos, colégios e clínicas. Seu único interesse parece ser advertir a humanidade da iminente batalha do Armagedom.
Não assim com os adventistas. Sua crença na Segunda Vinda não arrefeceu seu empenho em favor da educação, do cuidado médico ou do serviço em prol de outros. Nenhuma igreja pode apresentar mais impressionante relatório de serviço médico do que os adventistas do sé-timo dia, levando-se em conta o número total de seus adeptos.
No ano passado foram tratados mais de 3.850.000 pacientes nos 124 hospitais e 146 clínicas adventistas. Ao redor do globo, os adventistas empregam 488 médicos, na maioria formados em Loma Linda, e outros 15.642 obreiros empenhados na obra médica. No total de hospitais estão incluídos 37 dos Estados Unidos e do Canadá.
Desde os seus primeiros dias os adventistas têm promovido a reforma pró-saúde, a prevenção e a cura das enfermidades. Um membro leigo adventista, o Dr. J. H. Kellog, inventou os flocos de cereais e alterou o cardápio da primeira refeição do dia em milhões de lares americanos. Os adventistas estabeleceram o sanatório inicial de Battle Creek para tratamento de distúrbios nervosos, e introduziram as técnicas da hidroterapia e fisioterapia.
O respeito pelo corpo humano tem levado os adventistas a insistir na abstinência total de bebidas alcoólicas, fumo e narcóticos. Por motivos análogos de saúde, que podem ser contestados, a maioria dos adventistas adotaram o vegetarismo. Mesmo os adventistas que não são vegetarianos observam as proibições do Velho Testamento contra o comer carne de porco, presunto e moluscos.
Estudos comparativos indicam que estes preceitos de saúde tornam os adventistas menos suscetíveis às enfermidades cardíacas, ao câncer pulmonar e a outros assassinos. Nós católicos por vezes nos contentamos em defender o uso de bebidas alcoólicas e do fumo pelos cristãos, e em combater a proibição sem prover aos nossos jovens uma declaração sobre os valores positivos que a temperança e mesmo abstinência exercem sobre a saúde.
Quase todos os protestantes e católicos rejeitam a interpretação adventista de que o mandamento do sábado exige a observância do sétimo dia. Não obstante, podemos tirar proveito de examinar como os adventistas procuram santificar seu dia de guarda. Para o adventista devoto o sábado começa no pôr do Sol da sexta-feira, como também sucede com os judeus ortodoxos. As refeições são preparadas na sexta-feira, para que a confecção do alimento não tome o tempo da dona de casa, no sábado. A manhã desse dia é passada na igreja e na Es-cola Sabatina. O restante do dia é dedicado à leitura e ao estudo da Bíblia, e a simples recreações familiares, tais como passeios pela Natureza, orações e palestras sobre assuntos bíblicos, com amigos. O rádio e a televisão mantêm-se silenciosos até o fim do sábado, no pôr do Sol desse dia.
Podemos contrastar esta observância do sábado com a que caracteriza a conduta de milhões de cristãos? Em muitíssimos lares o domingo pode ser um dia livre de trabalho re-guiar, mas é realmente apenas outro dia da se-mana. Se fizermos um passeio pela vizinhança veremos cristãos pintando a casa, lavando o carro, colocando anteparos de janelas ou toldos e realizando outros projetos. Sabemos que os armazéns e centros comerciais não teriam tanto lucro no domingo se milhões de cristãos não escolhessem esse dia da semana para comprar móveis, automóveis, utensílios, artigos de mercearia e roupas. Aparentamos ter ficado horrorizados de que os soviéticos suprimissem deliberadamente a significação religiosa do domingo, a fim de debilitar a influência da religião na vida do povo russo. Não temos feito quase a mesma coisa nos Estados Unidos, desobedecendo muitas vezes às leis destinadas a preservar os valores de um dia de descanso?
Nossos amigos adventistas lembram-nos que o sábado não foi dado apenas para um grupo de pessoas incultas, séculos atrás, mas a todas as gerações humanas. Deus convida todos os homens a reservar um dia dentre sete para Seu serviço, bem como para recreação do corpo e do espírito humano. O autor da natureza humana sabia que um dia assim era essencial para o bem-estar espiritual, emocional e físico do homem. Nós não somente desobedecemos a Seu mandamento mas brincamos com o desastre pessoal quando ignoramos o significado do sábado. Como católicos, muitas vezes temos aspirado a uma observância mínima do Dia do Senhor; assistimos à missa e evitamos o trabalho servil, falando em termos gerais. Talvez os adventistas nos façam lembrar de que a proveitosa e santa observância desse dia exige mais do que esse mínimo restrito.
Outro setor de grande prioridade para nossos amigos adventistas é o das missões. Esta igreja enviou seu primeiro missionário para o estrangeiro em 1874. Ele implantou a fé na Suíça, e agora quatro dentre cada cinco adventistas vivem fora dos Estados Unidos. Os adventistas encaram com seriedade seu dever de pregar o evangelho a todos os homens e de ajudar os que foram chamados para ser missionários de tempo integral.
Apenas poucos países, entre os quais o Afganistão e a Cidade do Vaticano, não têm um contingente de missionários adventistas. Até a pequena ilha Pitcairn, povoada pelos marinheiros da Sedição do Navio Bounty, tem sido visitada por esses infatigáveis missionários, e hoje todos os descendentes dos insurretos são fiéis adventistas do sétimo dia.
Com os fundos provenientes dos dízimos regulares de seus membros, a Igreja Adventista emprega 57.000 homens e mulheres como missionários, professores, impressores e funcionários médicos. Isto significa que um dentre cada 31 adventistas é um empregado de tempo integral, assalariado pela igreja. O presidente da igreja recebe mais ou menos 100 dólares por semana e todos os demais obreiros da igreja, mesmo os médicos e os diretores de colégios, recebem um pouco menos.
Os adventistas, no entanto, não limitam sua evangelização aos países estrangeiros. Eles oferecem gratuitamente cursos bíblicos por correspondência, em que já se inscreveram mais de 3.500.000 alunos. Alguns adventistas seguem o exemplo das testemunhas de Jeová e dos mórmons, indo de casa em casa para interessar as famílias em suas doutrinas.
Todos os meios de comunicação têm sido empregados para apresentar a mensagem adventista. Esta igreja mantém 43 casas publicadoras que imprimem livros, revistas e folhetos em 228 línguas. O programa da Voz da Profecia é transmitido em inglês e espanhol por 922 estações de rádio, enquanto o programa Fé Para Hoje é apresentado em 222 estações de TV.
Os adventistas em geral têm famílias pequenas, com dois ou três filhos, de modo que relativamente há pouco aumento do número de membros devido ao coeficiente de natalidade (ao contrário dos mórmons). Entretanto, essa igreja possui agora seis vezes mais membros do que o número incluído no recenseamento federal de 1906. Seus métodos evangelisticos atraem conversos, e seu sistema educacional fortalece a lealdade dos adventistas a sua igreja e reduz ao mínimo a perda de membros.
Conquanto os mórmons administrem um enorme programa de assistência social, eles restringem sua assistência aos companheiros da mesma fé. Os adventistas estendem seu auxílio às pessoas de qualquer crença religiosa, ou sem crença alguma. Estão quase sempre a postos quando surge alguma calamidade — furacão, terremoto, enchente ou explosão. A igreja possui unidades móveis de emergência que podem ser enviadas para o local atingido. Dentro de sua comunidade, os adventistas freqüentemente patrocinam cursos gratuitos de primeiros socorros. De dois grandes depósitos situados em pontos opostos do litoral norte-americano, os navios da Igreja Adventista conduzem materiais para auxiliar regiões devastadas de além-mar.
Cada congregação adventista organiza uma sociedade Dorcas ou de assistência social, cujos membros se empenham em atividades um tan-to semelhantes às que são empreendidas pela Sociedade São Vicente de Paula e pelo Exército da Salvação. Os membros da Sociedade de Dorcas reúnem-se regularmente para consertar roupas, angariar alimentos e fazer curativos.
Os adventistas não concordam em matar mesmo na guerra, mas não procuram classificar-se entre os que recusam cumprir certas obrigações por motivos religiosos ou morais (conscientious objectors). Em vez disso, a igreja adestra seus jovens, à sua própria custa, para servir no departamento médico do exército, como não-com-batentes. Um desses soldados adventistas conquistou a Medalha de Honra do Congresso devido ao heroísmo que manifestou em Okinawa, durante a Segunda Guerra Mundial.
Podemos ver que a decisão de tornar-se adventista não é feita levianamente. Espera-se que os conversos dêem o dízimo de sua renda, freqüentem os cultos de sábado cada semana, abstenham-se de todo o trabalho desnecessário nesse dia, abandonem o álcool e o fumo, eduquem seus filhos nas escolas adventistas, evitem a dança, o jogo de cartas e o cinema, deixem de usar cosméticos e jóias e cortem toda ligação com qualquer sociedade secreta. Contudo, os adventistas parecem ser um povo resoluto e feliz, que obtém profundo prazer de sua religião.
A história da Igreja Adventista remonta à excitação sobre o Segundo Advento, produzida pela pregação de Guilherme Miller no início do Século XIX. Miller, um veterano da Guerra de 1812, examinou a Bíblia, principalmente os livros de Daniel e Apocalipse, e proclamou que o fim do mundo ocorreria em 1843. Mais tarde ele fixou a data para 22 de outubro de 1844. Quando esse dia passou sem haver nada de anormal, a maioria de seus adeptos dispersaram-se.
Um grupo de adventistas em Washington, Nova Hampshire, continuou a crer na predição de Miller. Finalmente este grupo aceitou a interpretação de que o evento a dar-se em 22 de outubro de 1944 não era o fim do mundo visível, mas a purificação do santuário celestial por Jesus Cristo. Nunca mais os adventistas marcariam uma data específica para o Segundo Advento, mas permaneceram convictos de que a História se aproximava rapidamente do fim e que Cristo apareceria dentro em breve.
A esta doutrina fundamental do adventismo, a pequena congregação da Nova Inglaterra acrescentou a crença de que os cristãos deviam observar o sábado do Velho Testamento, e não o domingo que fôra instituído por um papa antigo. O papel que o papa desempenhou na observância desse dia conferiu ao movimento uma orientação anti-católica. Muitos adventistas parecem considerar o papa como o anti-cristo.
O movimento cresceu e os adventistas conseguiram estabelecer uma sede nacional em Battle Creek, Michigão. Em 1903, esta sede foi transferida para Takoma Park, um arrabalde de Washington, D. C.
Durante 70 anos destacou-se no movimento adventista do sétimo dia a Srª Ellen G. White, que eles consideram como profetisa. Ela escreveu 53 livros e mais do que 4.500 artigos, muitos dos quais baseados em visões. O papel da Sr* White como profetisa tem perturbado os fundamentalistas protestantes, que de outro modo concordariam com muitas opiniões adventistas, tais como sua interpretação literal da Bíblia e sua vigorosa resistência à teoria da evolução.
Muitos aspectos do adventismo desagradam aos católicos e protestantes, mas notamos que em determinados setores — educação primária, manutenção da igreja, observância do sábado, esforço missionário, reforma pró-saúde, atividades de assistência social — podemos descobrir algumas coisas no adventismo que de forma adaptada podem enriquecer nossa vida como católicos.
Ao ingressarmos mais plenamente na era ecumênica e abandonarmos as defesas da Contra-Reforma, podemos encontrar ampla preciosidade de exemplos na vida e costumes de nossos irmãos separados. Devemos ter a inteligência de distinguir entre as inaceitáveis asserções teológicas e os métodos e costumes que podem ser colocados a serviço da igreja.